Eleita a palavra do ano de 2024 pelo Dicionário Oxford, a expressão “brain rot” – traduzida como “cérebro podre” ou “podridão cerebral” – reflete uma preocupação crescente com os efeitos do consumo excessivo de conteúdo superficial na saúde mental. O termo, escolhido por mais de 37 mil pessoas, foi associado à deterioração cognitiva causada pelo uso compulsivo de mídias digitais e conteúdos de baixa qualidade. Segundo a Oxford University Press, menções ao termo em inglês cresceram 230% entre 2023 e 2024, indicando um fenômeno social alarmante.
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A ciência por trás do “cérebro podre”
Embora tenha surgido como uma expressão coloquial, a ideia de “podridão cerebral” encontra respaldo na ciência. Pesquisas citadas pelo jornal britânico The Guardian revelam que o consumo excessivo de mídias sociais e conteúdos superficiais pode levar ao encolhimento da massa cinzenta, redução da capacidade de atenção e enfraquecimento da memória.
Esses impactos, segundo especialistas, são semelhantes aos observados em dependências químicas, como álcool e metanfetaminas. Uma meta-análise de 27 estudos de neuroimagem confirma a relação entre o uso excessivo de internet e alterações em áreas cerebrais ligadas ao controle de impulsos e à tomada de decisões.
Os primeiros sinais: do e-mail à rolagem infinita
A preocupação com a influência da tecnologia na saúde mental começou no início dos anos 2000, quando pesquisas da Universidade de Londres revelaram que o uso diário de e-mails e celulares causava uma queda de até 10 pontos no QI, efeito comparado ao uso de maconha.
Com a chegada das redes sociais e aplicativos desenhados para maximizar o tempo de uso, o cenário agravou-se. Segundo Michoel Moshel, pesquisador da Universidade Macquarie, essas plataformas exploram a “tendência natural do cérebro de buscar novidades”, especialmente informações alarmantes, um mecanismo evolutivo que antes ajudava na sobrevivência, mas agora alimenta o vício digital.
O impacto na juventude e no aprendizado
Os jovens são os mais vulneráveis ao fenômeno. Dados de 2021 da ONG americana Common Sense Media mostram que pré-adolescentes passam, em média, 5 horas e 33 minutos diários em frente às telas, enquanto adolescentes chegam a 8 horas e 39 minutos.
No ambiente escolar, o uso excessivo de tecnologia é apontado como uma distração significativa. Uma pesquisa australiana realizada em 2020 revelou que 84% dos educadores consideram as tecnologias digitais um desafio em sala de aula. Além disso, estudos demonstram que o “uso desordenado de tela” está associado a desempenho cognitivo inferior, especialmente em atenção sustentada e controle de impulsos.
Além de prejudicar a atenção e o aprendizado, o “cérebro podre” cria um ciclo prejudicial: pessoas com saúde mental debilitada tendem a consumir mais conteúdos de baixa qualidade, o que agrava seus sintomas. Estudos publicados na revista Nature indicam que o consumo excessivo de mídias digitais reduz a capacidade de reconhecer o problema, dificultando a busca por soluções.
Possíveis soluções para a era digital
Especialistas defendem uma abordagem que combine moderação e qualidade. Estabelecer limites de tempo para o uso de telas, priorizar conteúdos educativos e incorporar atividades físicas e sociais são passos essenciais. O psicólogo Carlos Losada ressalta que “desconectar-se conscientemente do digital” é crucial para neutralizar os efeitos da exposição prolongada.
Além disso, é necessário fomentar políticas públicas para promover educação digital e maior transparência por parte das empresas de tecnologia.
Um alerta para o futuro
A “podridão cerebral” pode ser mais do que uma metáfora, representando um processo real de deterioração cognitiva causado pelos hábitos digitais. Em um mundo cada vez mais conectado, lembrar da importância do equilíbrio entre o virtual e o real talvez seja o maior desafio de nossa era. Afinal, nossos cérebros foram projetados para explorar e interagir com o mundo físico – e não apenas para navegar por uma tela.
Por Aline Dantas