O ministro do STF Alexandre de Moraes acolheu pedido da Polícia Federal e determinou que as plataformas e provedores de internet bloqueiem o funcionamento do Telegram em todo o Brasil.
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A decisão, que veio a público nesta sexta-feira (18), estipula multa diária de R$ 100 mil caso as empresas deixem de adotar as providências necessárias para suspender a utilização do serviço de mensagens.
Foi fixada em R$ 500 mil a multa diária se os responsáveis pelo aplicativo não cumprirem ordens anteriores do próprio magistrado no inquérito da fake news, incluindo a retirada do ar de publicação do presidente Jair Bolsonaro (PL) com informações falsas sobre as urnas eletrônicas.
“O desrespeito à legislação brasileira e o reiterado descumprimento de inúmeras decisões judiciais pelo Telegram, empresa que opera no território brasileiro, sem indicar seu representante, inclusive emanadas do Supremo Tribunal Federal, é circunstância completamente incompatível com a ordem constitucional vigente, além de contrariar expressamente dispositivo legal”, afirmou Moraes.
Na decisão de 18 páginas, o ministro salienta reiteredas vezes a “omissão” do Telegram em fazer cessar a divulgação de notícias fraudulentas e a prática de infrações penais.
Ao determinar a “suspensão completa e integram do funcionamento do Telegram no Brasil”, o ministro manda intimar, pessoal e imediata, o presidente da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), Wilson Diniz Wellich, para a concretização da medida judicial. O tribunal deve ser avisado sobre as providências adotadas em 24 horas.
Moraes afirma que a suspensão deve perdurar até o efetivo cumprimento de suas decisões no curso das investigações, inclusive com o pagamento de multas diárias fixadas e com a indicação, em juízo, de representação oficial no Brasil (pessoa física ou jurídica). A sede do aplicativo fica atualmente em Dubai, no Emirados Árabes.
O ministro menciona o descumprimento de uma ordem, imposta ainda do ano passado, para retirada do ar de uma publicação de Bolsonaro relacionada ao caso do vazamento de apuração da Polícia Federal sobre ataque hacker a sistemas da Justiça Eleitoral em 2018.
Cita, ainda, determinação no âmbito do inquérito das fake news de bloqueio de um canal bolsonarista e fornecimento dos dados cadastrais ao STF, o que também não aconteceu.
No último dia 26, após ordem de Moraes, o Telegram bloqueou três canais ligados ao influenciador bolsonarista Allan dos Santos. Essa foi a primeira ordem judicial brasileira cumprida, em partes, pelo aplicativo.
Porém, segundo o ministro, a plataforma também teria que indicar o usuário de criação dos perfis, com dados como CPF e email, suspender os repasses de valores oriundos de monetização e publicidade, além de indicar os ganhos de cada um dos canais.
Essa determinação, aponta Moraes, não foi atendida. Fora o bloqueio, o Telegram não apresentou qualquer informação nos autos, diz o ministro.
Além de destacar a possibilidade de o aplicativo continuar a desrespeitar o Judiciário, a Polícia Federal argumentou no pedido de bloqueio ao Supremo que o serviço de mensagens tem sido utilizado em outras situações como meio seguro para prática de crimes graves.
A PF observou que a postura do grupo em não se submeter a diretrizes governamentais a partir de princípios que regem a sua política de privacidade tem resultado em sanções, já aplicadas por onze países.
A decisão de Moraes estava em um processo sigiloso, mas ele a tornou pública após o vazamento de trechos por um perfil do Twitter. O ministro determinou que a rede social informe todos os dados disponíveis a respeito do usuário que fez a publicação e que, depois, a Polícia Federal o interrogue.
O Telegram é visto como uma das principais preocupações para as eleições de 2022 devido à falta de controles na disseminação de fake news e se tornou também alvo de discussão no Congresso e no TSE para possíveis restrições em seu funcionamento no Brasil.
Amplamente usada pela militância bolsonarista, a ferramenta é hoje um dos desafios das autoridades brasileiras engajadas no combate à desinformação eleitoral. Até o momento, elas não tiveram sucesso em estabelecer um contato com os responsáveis pela plataforma.
O Telegram conta com representante no Brasil há sete anos para atuar em assunto de seu interesse junto ao órgão do governo federal encarregado do registro de marcas no país, ao mesmo tempo em que ignora chamados da Justiça brasileira e notificações ligadas às eleições.
Os poderes de representação foram conferidos pelo empresário russo Palev Durov, um dos fundadores e CEO da empresa, ao escritório Araripe & Associados, com sede no Rio de Janeiro.
Enquanto isso, a plataforma tem escapado de ordens e pedidos de autoridades brasileiras, inclusive do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e do STF, que fazem tentativas de contato sobre demandas envolvendo publicações na rede social.
À frente nas pesquisas de intenções de voto para as eleições, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criou um canal na rede em junho de 2021 e tem pouco mais de 47 mil seguidores.
Nas redes sociais, Bolsonaro tem convocado apoiadores a se inscreverem em seu canal no serviço de comunicação, onde divulga ações do governo diariamente. Recentemente, ele chamou de covardia o cerco à plataforma e disse que o governo está “tratando” do assunto.
A Folha perguntou ao Palácio do Planalto o que estaria em discussão no Executivo e que poderia estar relacionado ao funcionamento do aplicativo. Não houve resposta.
Com pouca moderação e uma estrutura propícia à viralização, a plataforma é uma das preocupações do TSE para as eleições de 2022. A ferramenta conta com grupos de 200 mil integrantes e canais com número ilimitado, caso de Bolsonaro.
Ministros temem que a plataforma seja o principal canal para o presidente e seus aliados disseminarem declarações falsas sobre supostas fraudes nas eleições.
O Congresso discute um projeto de lei —conhecido como PL das Fake News— com o objetivo de fixar as balizas para o funcionamento de empresas de serviço de mensagens e redes sociais. A proposta tem pontos de muita polêmica, e Bolsonaro já antecipou que pretende vetar trechos.
Na Alemanha, com cerca de 8 milhões de usuários, o Telegram vinha igualmente se recusando a conversar com autoridades que atuam no enfrentamento a ações de grupos extremistas.
A plataforma mudou recentemente de postura com a sinalização de que medidas mais drásticas poderiam ser adotadas, incluindo o seu banimento do país. Bloqueou mais de 60 canais usados por radicais em atendimento a um pedido da polícia alemã.
Entenda o caso Telegram
O que é o Telegram?
É um aplicativo de mensagens com funcionamento parecido com o do WhatsApp. Além de ter alta capacidade de viralização, com grupos que podem comportar até 200 mil membros, o Telegram possui uma dinâmica que se assemelha muito mais a redes sociais. Apesar disso, não modera conteúdo —a não ser em casos como de terrorismo
Qual é a preocupação do TSE?
Como a empresa tem uma postura de nenhuma cooperação e não tem sede no Brasil, o tribunal tem dificuldade de fazer a legislação nacional ser efetiva. Grupos bolsonaristas têm migrado para plataformas que possuam regras menos restritivas, como o Telegram
Quais medidas no Brasil?
O bloqueio do Telegram gera preocupação em especialistas na área, dadas as possíveis consequências legais e técnicas da medida. Outro cenário seria aceitar o crescimento desenfreado de uma plataforma que não atende aos contatos do Judiciário brasileiro.
O que Bolsonaro diz sobre isso?
O Telegram é atualmente um dos canais de comunicação prediletos de Bolsonaro, usado para divulgar ações de sua administração. Conta hoje com mais de um milhão de seguidores. Em janeiro, o presidente chamou de covardia a investida do TSE contra o Telegram e indicou que estuda medidas sobre o tema
O que diz a lei atual?
O fato de uma empresa não ter sede no país não significa que ela não tenha que obedecer à legislação brasileira. No Congresso, o projeto de lei das fake news pretende tornar obrigatório que redes sociais e aplicativos de mensagens tenham representantes legais no país
Fonte: Folhapress