No mesmo dia em que o governador Camilo Santana (PT) falou em medidas mais duras e prorrogou, à noite, o decreto de isolamento social contra o coronavírus, o comércio cearense, um dos setores mais afetados pela crise, com perdas financeiras que já acumulam R$ 1,26 bilhão, cobrou do Governo do Estado, na manhã de ontem, uma estimativa de quando as atividades poderão ser retomadas.
Em videoconferência para divulgar o documento “Premissas Básicas para Retomada Gradual”, o presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Ceará (Fecomércio-CE), Maurício Filizola, sugeriu que, a partir do dia 15 de maio, a reabertura fosse flexibilizada, com mais segmentos podendo abrir as portas. Segundo ele, a “esperança” é de que o setor retome sua “plenitude” em junho, mas apenas se houver condições seguras para que isso ocorra.
Com 72% de seus estabelecimentos fechados por conta das restrições atualmente impostas no Ceará, o comércio solicita que o Estado siga as diretrizes do Governo Federal, que por meio do Decreto 10.329/20, já inseriu no rol de atividades essenciais muitos segmentos que ainda estão proibidos de funcionar no Ceará, como estabelecimentos de locação de automóveis e o comércio atacadista e varejista de suprimentos para informática. “Queremos uma abertura de forma gradual e responsável, em setores que tenham uma movimentação pequena e que possam proteger seus colaboradores e clientes”, diz Filizola.
No que depender do governador, porém, a retomada do comércio não deve acontecer tão cedo. No mesmo momento em que a videoconferência da Fecomércio-CE acontecia, ele afirmou, em suas redes sociais, que não hesitará em endurecer as ações para conter a disseminação do coronavírus.
À noite, o governador, juntamente ao prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT), e os titulares estadual e municipal da Saúde, Dr. Cabeto e Joana Maciel, anunciaram a prorrogação do isolamento social pela quarta vez. “Esse não é o momento de flexibilizar. É o momento de ampliar ainda mais as medidas. Não há menor possibilidade de qualquer flexibilização na Capital cearense”, frisou Camilo”.
Segundo Filizola, o governo estadual não tem “colocado claramente” quais são as estimativas para a retomada da atividade econômica. Mesmo que não seja dia 15, ele cobra uma posição. “A (Secretaria da) Saúde precisa definir um data, nem que isso seja alterado depois. É responsabilidade do Estado dar essas previsibilidade para que os setores aguardem o retorno e possam se organizar para a retomada”, afirmou. “Se eu tenho a previsão de que daqui a 15 dias poderei funcionar, posso preparar meu pessoal, renegociar dívidas e avisar à clientela”, complementa.
No documento divulgado ontem, a Fecomércio-CE revela que a movimentação de consumidores recuou 76% em relação ao fluxo usual e que, atualmente, o setor possui quase 170 mil colaboradores paralisados. O relatório reforça que uma retomada gradual consideraria “a adoção de protocolos setoriais econômicos, priorizando setores da economia mais vulneráveis e com menos risco de contaminação”. Ademais, a entidade sugere algumas premissas que poderiam contribuir para a medida, tais como avaliação das regiões da cidade/Estado por nível de risco; acompanhamento de ‘mapas de calor’ para flexibilizar considerando áreas onde haja um maior controle da situação; e a observação da capacidade dos serviços de saúde.
Mas, o infectologista Keny Colares, médico do Hospital São José, alerta que a sobrecarga no sistema de saúde do Estado está aumentando “de forma a levar ao limite”, e que uma possível flexibilização, neste momento, seria bastante preocupante. “A lógica seria ser ainda mais radical nas medidas de contenção. Sei que o governador deve estar pesando os prós e contras, mas afrouxar o isolamento seria como você entrar de carro numa curva e acelerar para ver o que acontece”. Ele acrescenta que, dentro de 15 dias, pode até ser que “o pior momento já tenha passado”, mas isso não é garantido. “Espero que daqui a duas semanas estejamos observando queda no número de casos, mas atualmente estamos chegando no pico. É uma loucura pensar em um afrouxamento neste momento”.
Fonte: O Povo