Após trezentos dias de governo, infectados de furdunços aditivados nos chiqueiros do poder, tudo indica que o delegado Waldir não precisará implodir o seu vagabundo de estimação, áudios e vídeos e canetadas e as farofadas tóxicas em família, estão desconstruindo o que resta da farsa bolsonarista, ao mesmo tempo em que estão causando uma penitência implacável naqueles que ainda defendem o indefensável: não há política nova, não há pessoas de bem, não há valores cristãos, não há amor à pátria, não há gratidão, muito menos fidelidade a qualquer princípio razoável de lisura. O que se tem para o hoje são hienas do mesmo saco.
Ver e ouvir o presidente afirmar em solenidade pública que o seu governo é o mais democrático de todos da história do Brasil é você ter certeza absoluta que embarcou na mais recente saga de patifarias épicas da política contemporânea brasileira. Com o estilo e a grife Buscapé, encarquilhado por doses generosas de grosserias, fossilizado no maucaratismo, bem como pautado nos fundamentos peçonhentos do fascismo, Bolsonaro, o chefe da famiglia, tem feito ataques sistemáticos à democracia e ao estado de direito, com a mesma desenvoltura de quem tortura e depois disfarça maquiando o cadáver. Tentar esconder a apologia à Ditadura Militar brasileira, as homenagens constantes aos ditadores assassinos de golpes militares da América do Sul e a macabra necrofilia ao coronel Ustra, é a mesma coisa que tentar camuflar um elefante dentro de uma máquina de lavar.
Antes e após trezentos dias de cinzas é impossível não entender que essa postura escrota de empatia fascista é o alicerce ético e moral de grande parte do povo brasileiro. Faz parte do sonho de ser acobertado em pilhagens, em crimes, em roubalheiras, em tramas espetaculares de vilipêndio da coisa pública, pelo poder Judiciário: em sua cumplicidade bandoleira de parte significativa dos operadores da lei; pelo poder legislativo: em sua capacidade nefasta de repassar de pai para filhos e agregados a oportunidade suprema de se tornar milionário de forma fraudulenta e impune; e, claro, pelo poder bélico das forças armadas, prontas para atirar em qualquer um que ameace o sossego da família tradicional brasileira, cristã, racista e preconceituosa.
Mas é claro que esse sonho é uma peça bufa, mantido por brasileiros achatados entre aqueles que pensam em ter muito e aqueles que não têm muito o que pensar, é uma mistura de imbecilizados esclarecidos com catadores de lixo eletrônico nas redes sociais. Alguns são pobres de espírito e terceirizados pela felicidade alheia. Outros são espermatozoides abruptos estimulados pela meritocracia coach, onanista perdulária, que verão seus sonhos esparramados no chão sujo dos porões ideológicos do neoliberalismo, como uma gosma translúcida. Já outros são velhas encarnações de capitães do mato, de capatazes de latifundiários, de dedos duros dos eternos golpes militares brasileiros, e que hoje integram uma desintegrada classe média, que defendem as privatizações e o enxugamento do Estado, mas, de forma patética, estudam para concursos públicos ou tomam ritalina com café psicodélico para aguentar de forma patriótica a fila impiedosa para entrar numa universidade pública no curso de medicina, e depois desfrutar do capital social de ser empregado do PSF e nem pisar lá.
Há quem afirme que a onda genérica de analfabetismo funcional e a ignorância que assola a extrema direita no mundo e no Brasil são peças inseparáveis da nomofobia, com suas tecnologias da informação e suas infovias. Há quem afirme que o imbecilismo bolsolavista tem raízes profundas no inconsciente coletivo da sociedade conservadora, com a intimidade plácida de um carrapato e seu boi no pasto. Há quem duvide que a síndrome do Chaves, de pedir desculpas por ter feito querendo, faz parte da decadência moral da terra brasilis. Mas não há como duvidar que a maior pobreza coletiva é intelectual, que incapacita, deforma e se transforma em um peixe inteligente, capaz de usar as redes sociais.
Por Marcos Leonel – Escritor e cidadão do mundo
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri