Urbanização sem planejamento e participação popular é negar o direito à cidade. Planejar a ocupação espacial e a sua urbanidade exige ciência e a observância dos devidos elementos que interligam a cidade. As intervenções urbanas afetam as relações humanas e suas transversalidades como o meio ambiente, economia, segurança e as práticas sociais, ou seja, é impossível separar o inseparável, dito de outra forma, a ação humana de alteração do espaço urbano modifica as formas de acessibilidade e interação com o espaço, isso pode ser positivo, mas também pode provocar danos irreparáveis, como por exemplo o aumento de acidentes no trânsito ou ainda implicações no escoamento das águas.
Planejar a cidade não pode ser um tiro no escuro, não pode desprezar a ciência e eleger uma vontade ideogicamente construída, a exemplo das práticas populistas e equivocadas de apontar o censo comum como parâmetro para definir políticas que exigem uma tomada de decisão política alinhada à ciência, a racionalidade e a redução dos impactos ambientais.
Concomitantemente o planejamento deve alinhar ciência com participação popular, o que muda completamente uma roteirização urbanística orientada pelo senso comum. É preciso escutar e deliberar em conjunto com os movimentos sociais e a população, para compreender de forma mais apurada, as demandas locais e não aniquilar a memória dos lugares e as práticas saudáveis da população. Esconder e negar o protagonismo dos movimentos sociais e comunitários nos rumos e discussões sobre a cidade é uma forma evidente de negligenciar o direito à cidade, de excluir a participação popular e de criar uma urbanização de gabinete e eleitoral.
A cidade que tem a sua espacialidade esquartejada aprofunda os problemas estruturais e age no calor do imediatismo e do improviso, perdendo a sua dimensão macro e suas interligações.
O imediatismo e o improviso tem sido historicamente uma prática da urbanização que tem como viés de alcance ser moeda de troca eleitoral. O desenfreado processo de asfaltamento das áreas excluídas do direito à cidade é uma prova incontestável que se constrói uma cidade para eleições representada pelo irrestrito descompromisso com os impactos ambientais e a engenharia urbanística.
Esse é o retrato da maquiagem urbana que gera a cidade veloz, barulhenta, insegura e adoecedora e que ideologicamente é vendida como desenvolvida e moderna para esconder as fraturas sociais, fruto do processo de produção e acumulação do capital que ergue espacialidades esquartejadas.
Faz-se necessário debater o direito à cidade para compreender que a aparência esconde uma essência severamente perversa, complexa e alinhada aos interesses da classe economicamente dominante. Essa discussão está intimamente ligada à democratização da sociedade, se compreendemos a cidade como um sustentáculo das interações humanas. Enquanto isso, precisamos aglutinar forças para construir uma outra cidade, em que a defesa da vida esteja no primeiro plano.
Por Alexandre Lucas. Pedagogo, integrante do Coletivo Camaradas e presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais do Crato/CE
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri