Escutar o temido “motorzinho” no consultório do dentista pode assustar e dar um arrepio na espinha. No entanto, em alguns casos, as pessoas sentem um pavor tão grande desses profissionais que não conseguem finalizar um tratamento odontológico. Esse medo intenso e limitante recebeu o nome de odontofobia.
“O paciente reluta em ir ao consultório do dentista mesmo que para uma simples revisão. E desde o começo já diz ao cirurgião-dentista que sente medo. É um problema bastante comum, mas não sabemos quantas pessoas são atingidas pela odontofobia”, relata José Roberto Barone, presidente da Câmara Técnica de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do CROSP (Conselho Regional de Odontologia de São Paulo).
De acordo com Andréia Gomes, cirurgiã-dentista do HU-Univasf (Hospital Universitário da Universidade Federal do Vale do São Francisco), o diagnóstico da odontofobia é realizado logo na primeira consulta.
“É importante diferenciar o medo da fobia. O profissional precisa avaliar se o paciente é ansioso ou odontofóbico, pois os sintomas são mais perceptíveis e agressivos”, completa.
Quais são os sintomas?
Os sintomas de odontofobia variam bastante. Há casos de pessoas que chegam a desmaiar antes ou durante os procedimentos. Alguns têm medo do próprio dentista, da anestesia ou agulha, do cheiro do consultório, pavor de sentir dor e também acreditam que vão passar mal na cadeira do profissional —temem engasgar, vomitar ou não conseguir respirar.
Os sinais mais leves são as alterações na respiração e nos batimentos cardíacos. Há também aumento da transpiração, tremores, ansiedade extrema, palidez e tensão muscular. E, em casos mais graves, surgem ataques de pânico e choros. Por conta disso, os profissionais não podem continuar o tratamento odontológico.
“Muitos não conseguem abrir a boca para o cirurgião-dentista. Muitas vezes, em casos de fobias extremas, é necessária a intervenção com anestesia geral”, diz Barone.
Principais causas
As causas para a odontofobia ainda não estão muito claras. Mas acredita-se que o pavor do dentista, na maioria das vezes, ocorra devido a algum trauma de infância. A pessoa pode ter sofrido um atendimento inadequado em algum consultório odontológico ou presenciado alguma situação assustadora, causando marcas por toda a vida.
É o que aconteceu com Letícia Viana, 46, advogada aposentada, que mora em Salvador (BA). Quando ela era pequena, estava em um consultório odontológico e ouviu um adolescente gritar durante o atendimento. Para piorar a situação, o rapaz saiu correndo em sua direção pedindo socorro, ainda sujo de sangue.
“Foi a primeira vez que fui ao dentista e fiquei traumatizada. Tenho pavor de seringas. Cansei de chorar na cadeira dos profissionais e já abandonei tratamentos por puro pânico”.
Ela também já chegou a desmaiar e passou mal diversas vezes ao procurar um dentista. Por isso, ela precisou ser sedada para concluir alguns procedimentos dentários. “Não é fácil. Com a sedação consegui me acalmar e finalizar o tratamento”, explica.
Algumas pessoas também ficam traumatizadas com os comentários dos familiares, que destacam sentir muita dor durante o tratamento. Há casos ainda de indivíduos com algum transtorno psicológico como a síndrome do pânico, que também aumenta o risco de odontofobia.
Para Myenne Tsutsumi, psicóloga e professora da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), se a pessoa faz um procedimento que envolve uma dor intensa, essa sensação se associa aos vários elementos que existem no consultório do dentista.
“Essa dor pode ser associada com a cor do jaleco, as luvas, o barulho dos aparelhos, o cheiro, o consultório como um todo e com o próprio profissional. Com isso, em outros momentos, quando a pessoa entra em contato com algum desses elementos, ela vivencia as sensações desagradáveis novamente”.
O que pode ser feito
Por se tratar de uma fobia, a pessoa necessita de ajuda psicológica e realizar terapia comportamental para lidar com esse pavor. O uso de medicamentos também pode ser indicado para complementar a psicoterapia. Nesses casos, é necessário buscar ajuda de um psiquiatra.
“A pessoa também poderá ser exposta ao consultório do dentista sem que haja a necessidade de tratamento. Esse trabalho é realizado pelo terapeuta durante as sessões de psicoterapia e in loco, ou seja, no consultório odontológico”, explica Tsutsumi.
Para conseguir realizar o tratamento em quem tem odontofobia, os profissionais de odontologia, muitas vezes, optam pela sedação consciente. Assim, aplicam uma anestesia mais leve que diminui o nível de consciência do paciente, mas que não afeta a habilidade de respirar ou responder a estímulos.
Há diversas técnicas e protocolos que são realizados dentro do consultório que permitem que o tratamento aconteça com conforto e segurança. “Também são indicados medicamentos para lidar com a ansiedade. Em alguns casos, administra-se a sedação por inalação para diminuir a tensão e o medo. Tudo é feito dentro do consultório e a recuperação é bem rápida. O paciente fica acordado, mas mais calmo e relaxado”, explica Gomes.
Além disso, algumas práticas integrativas, aplicadas pelos cirurgiões-dentistas costumam ser eficazes. Para isso, o paciente precisa ser avaliado de forma individual e a técnica definida de acordo com a saúde da pessoa e suas limitações. Conheça algumas:
• Acupuntura
É uma técnica da Medicina Tradicional Chinesa usada para equilibrar o corpo (físico, emocional e espiritual) por meio de aplicação de agulhas finas em determinados pontos do organismo. A acupuntura é usada para controlar a ansiedade e acalmar pacientes com medo do tratamento odontológico. A especialidade foi reconhecida pelo CFO (Conselho Federal de Odontologia) e há diversos cirurgiões-dentistas acupunturistas que aplicam a técnica.
• Homeopatia
Reconhecida como medicina alternativa e complementar, a homeopatia envolve um tratamento natural e holístico. Por isso, usa medicamentos produzidos com substâncias de origem animal, mineral e vegetal. E pode ser útil no tratamento odontológico, de acordo com o CFO.
Para os especialistas, a homeopatia busca conhecer o paciente como um todo —sintomas e questões emocionais, o que contribui com o controle da ansiedade e medo do dentista. Assim, são indicados medicamentos homeopáticos para controlar os sintomas. Vale destacar, no entanto, que não existem evidências científicas sobre a eficácia da homeopatia para tratar qualquer condição de saúde.
• Hipnose
A técnica é reconhecida pela OMS (Organização Mundial de Saúde) como uma ferramenta eficaz para tratar doenças crônicas e emocionais. A hipnose diminui os sintomas de nervosismo e ansiedade de pacientes com odontofobia.
A pessoa consegue ficar mais tranquila e relaxada para realizar os procedimentos dentários. Como não necessita de local específico para ser realizada, sua aplicação pode ocorrer dentro do próprio consultório.
• Técnicas de respiração, relaxamento e meditação
Há cirurgiões-dentistas que recomendam técnicas de respiração, relaxamento e meditação para quem tem muito medo do tratamento. Isso acalma o paciente e alivia o estresse e a ansiedade. Manter a atenção plena e respirar profundamente contribui com o controle do pavor de dentistas.
Não é preciso ter medo!
Ir ao dentista regularmente previne cáries e a perda de dentes, mas realizar as visitas ao dentista vai além da questão estética. É muito importante manter a saúde bucal para evitar problemas graves como infecções e até mesmo doenças cardiovasculares. Por isso, a odontofobia precisa ser superada, uma vez que quem tem medo de dentista negligencia os cuidados bucais.
“Os profissionais estão aptos a diagnosticar e tratar as odontofobias desde criança. Nessa fase, já é importante explicar e mostrar que o tratamento dental não é dolorido ou traumático. É necessário, desde as primeiras visitas aos consultórios odontológicos, expor que é possível ter uma consulta agradável, sem dor”, ressalta Bareco.
Para os adultos que têm muito medo, é fundamental encontrar um profissional de confiança. Lembrando que durante a consulta, o especialista pode encaminhar para um psicólogo ao perceber a odontofobia.
Fonte: VivaBem/UOL