Única solução para sobrevida do paciente em muitos casos, a efetivação de transplantes de órgãos depende de dos principais pilares: informação e solidariedade. O Ceará lidera o cenário positivo. De 2009 até 2018, a quantidade de procedimentos efetivados no Estado saltou de 760 para 1.535, aumento superior a 100%, conforme dados da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa).
No período, o número cresceu gradativamente até 2016, quando houve um pico de 1.874 transplantes. De lá até 2018, houve queda, mas a quantidade se mantém mais que dobrada em relação a 2009. Para a coordenadora da Central de Transplantes do Ceará, Eliana Barbosa de Almeida, o aumento pode ser atribuído, dentre outros fatores, à solidariedade do cearense.
“Os transplantes ocorreram porque as famílias deram ‘sim’ para a doação. Além disso, o investimento do Governo do Estado na política de transplante, o desempenho de vários profissionais de saúde e a mobilização das associações de pacientes, com testemunhos de sobrevida, também contribuem para esse aumento”.
Espera
Uma “doação de vida, de amor, de tudo” é como a professora Verônica de Souza, 62, define o ato da cunhada, a pensionista Aurília Maria Vidal, 64, que doou a ela um dos rins. A solidariedade criou um laço permanente, e ambas se definem, agora, como “irmãs de rim”.
“Acompanhei todo o sofrimento da Vevé. Quando soube que só o transplante resolveria o problema, pensei que a fila de espera seria uma loteria, e me ofereci pra fazer os exames. Foi um sucesso”, relembra “Lila”, como carinhosamente é chamada por Verônica.
A necessidade de transplante veio devido a complicações após uma histerectomia, que rendeu anos de hemodiálise até a professora receber o novo órgão.
“A compatibilidade entre mim e ela foi maior do que se fosse consanguíneo: 50%. Em 2004, depois de oito meses de muitos exames, fizemos o transplante. Abaixo de Deus, a Lila salvou minha vida. Foi o anjo que Ele enviou à minha vida pra me salvar”, emociona-se Verônica.
Até 21 de agosto deste ano, segundo a Sesa, dos 1.004 pacientes que aguardam por um novo órgão no Ceará, 793 estavam à espera de um rim. Os demais se dividem entre fígado (162), coração (16), medula óssea (12), córnea (9), pâncreas/rim (8), pulmão (3) e pâncreas isolado (1). De acordo dados com o Ministério da Saúde (MS) de uma semana antes, dia 14, a fila é maior: 1.299 pacientes estavam à espera de transplante.
Doações
O Ceará recebe pacientes de vários pontos do Brasil em busca de realizar procedimentos. Conforme o MS, os estados que mais procuraram unidades cearenses para transplantes foram Pará (coração, fígado e rim), Amazonas, Rio Grande do Norte, Piauí, Maranhão (fígado e rim) e Sergipe (fígado).
Se considerada a proporção por milhão de habitantes, no primeiro semestre deste ano, o Ceará foi o 2º do Brasil que mais realizou transplantes de fígado, o 3º em pulmão e coração, o 4º em córnea, o 7º em rim pâncreas/rim e o 9º em medula óssea.
Entre 2014 e 2018, a quantidade de pessoas ou famílias cearenses que doaram órgãos oscilou: naquele ano, foram 220 doadores efetivos, número que caiu para 206 no ano passado. Já em 2019, até junho, o total era de 122 doações concretizadas. Em doação efetiva, o Ceará ocupa o 3º lugar do país, acima da média nacional.
De acordo com a coordenadora de transplantes da Sesa, a desinformação ainda é um entrave. “As famílias dizem ‘não’ devido ao desconhecimento das etapas do processo. No geral, é a falta de informação correta. É nisso que trabalhamos, na educação. Não só para as famílias e doadores, mas para os profissionais da saúde, porque são eles que identificam potenciais doadores e precisam comunicar de maneira adequada aos familiares sobre a morte. A partir disso, é preciso acolher a família e fazer a abordagem adequada”, reforça Eliana.
Campanha
Em 2018, dos 516 potenciais doadores, 116 tiveram a transferência do órgão recusada pelas famílias, e outros 194 não doaram por questões médicas: os 206 restantes se tornaram doadores efetivos, ou seja, os órgãos foram destinados a salvar vidas. Já neste ano, a tendência se repete: até março, conforme dados da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), foram notificados 139 potenciais doadores no Ceará, dos quais apenas 69 se converteram em doações efetivas.
Para Verônica, a atitude de Aurília foi decisiva, como a própria doadora conclui. “Se eu não tivesse doado, ela poderia não ter tido todas as felicidades que teve. Não ter visto a formatura e o casamento dos filhos e não estar esperando pra ser vovó”.
Por Theyse Viana
Fonte: G1 CE