Muita gente não sabe, mas a gordura é importantíssima para o bom funcionamento do organismo. Fonte de energia, este lipídeo, atua no controle da temperatura corporal, na absorção de várias vitaminas, na produção dos hormônios femininos e masculinos e na composição das membranas celulares.
O perigo se dá quando ela é consumida em excesso. As entidades de saúde recomendam, para um indivíduo saudável, que a ingestão fique entre 20 e 35% do total de calorias diárias, sendo 10% no máximo proveniente da saturada e o restante da insaturada –a trans não deve fazer parte da dieta.
A seguir, confira alguns dos principais problemas provocados pelo excesso de gordura na alimentação.
1. Doenças cardiovasculares
Na lista das doenças que podem ser causadas pelo excesso de gordura, especialmente a trans, as principais são infarto agudo do miocárdio e AVC (acidente vascular cerebral). Elas, inclusive, são as que mais matam no mundo. Só no Brasil, em 2017, segundo a SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia), foram mais de 383 mil óbitos.
O que acontece é que a grande quantidade de gordura no organismo eleva o LDL (colesterol ruim) no sangue –devido à supressão das atividades de seu receptor no fígado –, culminando na aterosclerose, uma inflamação com formação de placas de gordura (ateromas) nas paredes das artérias.
Conforme essas placas aumentam de tamanho, pode haver a diminuição do fluxo de sangue nos vasos ou então o bloqueio total da sua passagem. Caso isso ocorra em uma artéria do coração ou do pescoço, o órgão tende a ficar sem oxigênio, resultando na morte do músculo cardíaco (infarto). Quando um ateroma se solta e impede ou reduz o fluxo sanguíneo em uma artéria do cérebro ou, mais uma vez, do pescoço, privando as células de receber oxigênio e nutrientes, aí acontece o AVC isquêmico. Se a formação for de coágulos de sangue, o AVC é chamado de hemorrágico.
2. Doenças renais
Os rins também sofrem com o consumo excessivo de gordura, e pela mesma razão que o coração e o cérebro: ateromas podem ser formar na parede das artérias renais causando seu estreitamento ou enrijecimento e, assim, reduzir ou impedir a chegada de sangue ao órgão, tendo como resultado atrofia (diminuição de tamanho e mau funcionamento) e hipertensão arterial.
Vale salientar que o bloqueio do fluxo sanguíneo para o rim ainda pode ocorrer em decorrência de um coágulo (êmbolo) originário de placas de gordura geradas em outras partes do corpo, como nas artérias coronárias ou carótidas.
3. Doenças no aparelho gastrointestinal
A ingestão de alimentos gorduroso atrapalha o fechamento do esfíncter inferior (válvula do esôfago), favorecendo os quadros de doença do refluxo. Isso acontece porque o acúmulo de gordura no abdômen aumenta a pressão no estômago e exige um esforço maior do esfíncter.
Além disso, nas dietas ricas em gordura a digestão fica mais lenta –demora mais para ser eliminada do estômago — e a pessoa tem sempre a sensação de que está “cheia”, empanturrada, empachada. A razão é que este lipídeo, geralmente não solúvel em água, leva mais tempo para ser quebrado e absorvido pelo organismo.
4. Doenças no fígado
Conhecida popularmente como gordura no fígado, a esteatose hepática não alcoólica é mais uma patologia que pode ser provocada pela dieta rica no lipídeo em questão. Ela acontece quando há um acúmulo de gordura no interior das células do órgão, denominadas hepatócitos.
Como o fígado tem a função de desintoxicar o organismo e produzir colesterol, é normal que contenha gordura. O perigo se dá quando a sua presença chega a 5%. Na lista de complicações da doença estão esteatoepatite (inflamação), cirrose hepática e câncer.
5. Obesidade
Dados do Ministério da Saúde mostram que um em cada cinco brasileiros (18,9% da população) é obeso e mais da metade (54%) está com excesso de peso. Doença crônica, a obesidade é caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal e uma de suas causas é justamente a ingestão elevada de alimentos gordurosos –as demais são fatores ambientais, comportamentais, metabólicos e genéticos.
Grosso modo, o ganho de peso acontece quando a quantidade de calorias consumida é maior do que a quantidade gasta. Nesta situação, todo o excedente será depositado no tecido adiposo, sob a forma de gordura. A questão é que os alimentos ricos em gordura são mais calóricos. Enquanto cada 1 grama de carboidrato e proteína têm 4 calorias, 1 grama de gordura tem 9.
6. Doença arterial periférica
Outro problema relacionado gordura é a doença arterial periférica dos membros inferiores, que ocorre quando ateromas se acumulam nas paredes das artérias que levam sangue para as pernas, causando o estreitamento da sua passagem ou a completa obstrução.
Por conta da falta de circulação, o paciente eventualmente sentirá dor muscular de perna, coxa ou quadril e passará a ter dificuldade para caminhar. Em quadros mais graves, a dor se torna contínua e começam a surgir feridas, podendo até ser necessária a amputação do membro.
7. Câncer
O exagero de gordura contribui ainda para a formação e a progressão de diversos tipos de câncer, dentre eles o câncer de mama, ovário, endométrio, estômago, esôfago, pâncreas, vesícula biliar, fígado, intestino, rins, tireóide, meningioma, mieloma múltiplo, cólon e reto.
A explicação para isso é que a grande quantidade do lipídeo no organismo provoca uma desregulação interna, caracterizada por alterações hormonais e um estado inflamatório crônico, que estimula a proliferação celular e inibe a morte programada das células (apoptose).
Dependendo do local afetado, há também outras causas relacionadas. Por exemplo, no intestino, uma dieta inapropriada, rica em gordura, gera uma alteração na sua microbiota (flora intestinal), favorecendo o desenvolvimento de bactérias associadas à patologia.
Além disso, um estudo realizado pelo Trinity College Dublin, na Irlanda, e publicado no ano passado na revista Nature Immunology, mostrou que as moléculas de gordura impedem as células do sistema imunológico de atuarem corretamente para matar os tumores.
8. Inflamação no cérebro
Por fim, comer muita gordura pode gerar uma inflamação no hipotálamo, região do cérebro que desempenha papel fundamental no comportamento alimentar – essa situação faz com que o controle da fome e da saciedade seja totalmente alterado, impedindo que a pessoa fique satisfeita.
Uma pesquisa recente da Universidade da Califórnia, em São Francisco, e da Universidade do Centro Médico Washington, em Washington, ambas nos Estados Unidos, constatou ainda que dietas ricas em gordura aumentam o número de células do sistema imunológico encontradas no cérebro (micróglias), desencadeando compulsão alimentar e, por consequência, ganho de peso.
Fontes consultadas: Airton Mota Moreira, médico do CRIEP (Carnevale Radiologia Intervencionista Ensino e Pesquisa); Fabio Luiz Maximiano; gastroenterologista e prestador de serviços no Hospital América de Mauá; Fabio Porto, neurologista do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo; Maria Del Pilar Estevez Diz, coordenadora de oncologia clínica do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo); Marisa Resende Coutinho, nutricionista da Rede de Hospitais São Camilo; Rodrigo Moreira, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM); e Roberto Kalil Filho, presidente do Conselho Diretor do Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da FMUSP).
Fonte: Viva Bem/UOL