Quem é que nunca perdeu uma noite de sono preocupado com uma entrevista de trabalho, a saúde de um ente querido ou a perda do emprego? Enquanto para parte das pessoas essa resposta natural ao estresse é passageira e gerenciável, para quem tem ansiedade é diferente: lidar com esses pequenos desafios da vida pode gerar emoções intensas, incômodas e duradouras que acabam atrapalhando as atividades do dia a dia e os relacionamentos.
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Olhando de fora, o desconforto gerado pela aceleração dos pensamentos, a angústia e o medo vivenciados por um indivíduo com ansiedade podem ser interpretadas como comportamentos irracionais difíceis de serem compreendidos. Mesmo que algumas pessoas saibam identificar os possíveis sintomas físicos dessa condição, a verdade é que a maioria delas não tem ideia do sofrimento enfrentado por quem tem de conviver com o problema.
Aliás, ele está em primeiro lugar entre os distúrbios psiquiátricos e durante a pandemia mais de 4 em cada 10 brasileiros foram acometidos por ele, segundo dados publicados na revista médica The Lancet. Assim, é muito provável que alguém do seu círculo familiar, social ou profissional esteja passando por isso agora mesmo.
Além de se informar mais sobre os transtornos de ansiedade, é importante estar aberto para conhecer as melhores formas de oferecer apoio a esses indivíduos, sem o risco de cometer alguma gafe.
Para ter sucesso nessa iniciativa, os especialistas no assunto explicam o que NÃO pega bem dizer para uma pessoa com ansiedade, especialmente durante uma crise.
Ansiedade: o que não dizer para alguém em crise
1. “Fique calmo!”
Quem tem ansiedade sabe que precisa ficar calmo, mas para ele esta não é uma escolha consciente. Muitos fatores estão envolvidos na manifestação dos sintomas dos transtornos de ansiedade, e eles vão muito além da iniciativa de relaxar diante de um evento estressante. Aliás, quando a ansiedade é patológica, ela pode até se manifestar sem razão aparente.
O psiquiatra Fábio Gomes de Matos e Souza, professor de psiquiatria da UFC (Universidade Federal do Ceará) e integrante do corpo clínico do HU Walter Cantídio, que integra a Rede Ebserh, diz que o estilo de vida moderno produz uma série de situações que facilitam que a ansiedade se instale e, assim, sugerir que uma pessoa se acalme diante delas invalida as emoções de quem está sofrendo.
“O que você pode fazer é se mostrar disponível para conversar e ouvir —se a pessoa assim o quiser— e até em um outro momento. O importante é respeitá-la caso prefira estar quieta. Assegure-a de que você está aberto para apoiá-la em qualquer circunstância”, sugere ele.
Lembre-se: você não precisa dar soluções para o problema, nem controlar a emoção do outro. Para pessoas com ansiedade, contar com apoio de forma não invasiva é essencial.
2. “Você devia evitar tanto estresse”
Fugir de determinadas circunstâncias, pessoas e eventos não é a solução para a ansiedade. Esse comportamento limita ainda mais o mundo desses indivíduos que acabam buscando novas formas de adaptação. Transtornos de ansiedade não tratados podem se agravar, e ainda aumentam o risco para doenças sistêmicas, como as do coração, diabetes, bem como podem levar ao abuso de substâncias e à depressão.
Validar a ansiedade, isto é, aceitá-la e olhar para as situações desencadeantes, auxilia na elaboração de estratégias de enfrentamento mais adequadas. A ideia não é suprimir sentimentos nem situações, mas aprender a se sentir mais confortável diante deles. Ao longo do tempo, tais medidas ajudam a mudar o contexto e geram um maior controle sobre as crises.
3. “Você faz tempestade em um copo d’água”
Até o momento, as pesquisas sobre a ansiedade indicam que ela parece decorrer da interação de fatores biopsicossociais como genética, biologia e química cerebrais, estresse e ambiente. Os sintomas podem variar, a depender do tipo do transtorno, mas entre as características comuns a todos eles estão pensamentos acelerados e crenças que são difíceis de controlar e levam a desconfortos como inquietação e tensão que não cessam e tendem a piorar.
Dizer que a pessoa está exagerando diante de algo que parece, para você, pequeno, só amplia a ansiedade, porque potencializa a sensação de inadequação. Além disso, revela um julgamento do sofrimento do outro como sendo de menor valor. Ao tentarmos encaixar as pessoas aos nossos critérios do que é ou não um problema que pode gerar ansiedade, devemos lembrar que isso é uma questão totalmente individual e dependente da história de cada um.
4. “Supera!”
Vivemos em uma sociedade que nos proíbe de ter sensações negativas. No entanto, elas são importantes para os humanos e têm suas funções para a evolução humana. No caso da ansiedade, ela nos ajuda a sobreviver, preparando-nos para a luta ou para a fuga, a depender da situação, fala a psicóloga clínica Flávia Andressa Farnocchi Marucci, professora do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da FMRP-USP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo).
“O problema acontece quando o nível da ansiedade é excessivo e prejudica a vida da pessoa. Catequizá-la para que ela não sinta nada negativo e siga a vida é mais uma forma de invalidar o quadro”, acrescenta a especialista.
Entre todas as outras coisas que não deveriam ser ditas, talvez esta seja a mais insensível entre todas. Ninguém diz a uma pessoa com diabetes ou hipertensão que ela deve superar e seguir a vida. Para conviver com transtornos de ansiedade, tanto quanto com essas outras doenças, é preciso buscar ajuda especializada para uma avaliação e estabelecimento de uma estratégia terapêutica.
A boa notícia é que, entre os distúrbios psiquiátricos, a ansiedade é um dos quadros com melhor resposta ao tratamento que, por meio de mudanças no estilo de vida, uso de medicamentos e psicoterapia, além de técnicas de respiração e meditativas como o mindfulness, leva ao alívio e ao controle os sintomas, melhorando a qualidade de vida.
Fonte: VivaBem/UOL