Formadas por áreas sensíveis e de interesse ambiental, as Zonas Especiais Ambientais (ZEAs), em Crato, foram implantadas, em 2009, para preservação ecológica, proteção de recursos hídricos e para impedir o surgimento de novas áreas de risco. Porém, estes espaços têm sofrido alterações ao longo dos anos, que podem impactar no desenvolvimento da cidade. Ontem (21), a Câmara Municipal aprovou, por 11 votos a 5, um projeto de lei que desafeta cinco hectares da ZEA 5, que fica no corredor do rio Batateira, transformando em zona residencial. A decisão gerou polêmica. O Crato possui sete ZEAs, que compreendem os vales dos rios e encostas, dentro da área urbana. Nelas, não são permitidas edificações, mas, no local, de maioria privada, podem ser realizadas atividades agrícolas, esportivas, de lazer, que não afetem as características naturais.
Alterações
Nestes 11 anos de criação, a partir do Plano Diretor de 2005, as ZEAs têm sofrido alterações, como a criação do Parque Estadual do Sítio Fundão, hoje Unidade de Conservação (UC), ou o terreno em parte do Parque de Exposição Pedro Felício Cavalcante, modificado para zona de uso misto. Mesmo assim, as que se mantêm impedem que os locais sejam ocupados, evitando casas em áreas de risco de alagamento, deslizamentos e erosão. Além disso, protegem a biodiversidade do local.
Autor do projeto aprovado ontem, o vereador Pedro Alagoano (PSD) defende que já há uma ocupação desordenada naquela área e que a construção de qualquer edificação ainda passaria pela aprovação do Município. “Para ter uma construção, precisa de uma análise, respeitando os limites que margeiam o rio. Não tem projeto que demonstre que será loteado, que vai causar prejuízo, até porque tem várias cidades que crescem no meio de um grande rio. Isso não vai impedir crescimento de nenhum município”, justifica.
Seu colega de Casa, o vereador Amadeu de Freitas (PT), contrário ao projeto, enumera implicações. A primeira é que a elaboração ou alteração da legislação urbana deveria ter estudos técnicos, que apresentem os impactos ambientais. “Há 11 anos houve um estudo que reconheceu como zona ambiental. O que mudou para se tornar zona residencial? Não há justificativa técnica”, enfatiza.
Do ponto de vista ambiental, o parlamentar acredita que poderá causar um impacto, mesmo não sendo uma área de manutenção da mata nativa. “É uma região de pântano, alagadiço. Mas contribui para a manutenção do brejo e para a recarga do aquífero. O município precisa ter áreas que infiltrem água. Não é só a floresta, a Chapada do Araripe, que recarregam nosso lençol”, pontua.
Irregular
A bióloga Raquel Soares enxerga outros problemas no projeto, como o apontamento de que se trata da ZEA 6, quando na verdade a área apresentada nas coordenadas se trata da ZEA 5. Além disso, não se trata apenas de 5 hectares, como traz o texto, mas de nove. “A própria PL está errada. Há necessidade de estudo de impacto ambiental, audiências públicas. Ser posto em vocação foi um equívoco”, afirma.
O projeto ainda será analisado pelo prefeito Zé Ailton Brasil (PT). Porém, o secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Territorial de Crato, Brito Júnior, ficou surpreso com a aprovação e reconheceu que isso pode gerar riscos à população. “Existem trechos que comportam algum tipo de edificação, mas tem fundos de vale. Não dá para mapear lote por lote, metro por metro. Por enquanto, vou me reservar até a análise do Gabinete do prefeito para produzir uma documentação técnica e viabilizar um estudo de impacto de vizinhança, que não foi visto no projeto”, observou.
Já o promotor de Justiça Thiago Marques Vieira conta que o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) só tomou conhecimento que o projeto seria votado no último fim de semana. Mesmo em recesso, redigiu mensagem sugerindo a não aprovação. O mesmo será feito ao prefeito. “Se sancionar, devemos entrar com algum procedimento”, antecipa.
No entendimento do MPCE, a aprovação não respeita o trâmite específico das ZEAs, que necessita de um estudo técnico e a viabilidade dessa mudança seria precedida de audiências públicas. “Isso não aconteceu”, reforça Thiago. No mérito da questão, o promotor entende que o local pode apresentar os mesmos problemas de outras áreas que já foram desafetadas, próximas aos rios Granjeiro e Saco/Lobo, por exemplo. “Toda vez que dá uma chuva mais forte, a água invade as casas. Além disso, o curso do rio, ao longo do tempo, vai sendo deteriorado, afetando o ecossistema que integra a bacia do Rio Salgado”, completa.
Por Antonio Rodrigues
Fonte: Diário do Nordeste