O cearense de Várzea Alegre, Sávio Pinheiro, trabalha como médico no interior do estado há quase 40 anos, onde tem vivenciado nos últimos meses a realidade da Covid-19. Durante o percurso na medicina, percebeu que precisava de uma maneira lúdica para conscientizar — e aproximar — a população sobre a importância da saúde em relação a várias doenças, inclusive algumas que causaram epidemias. Por isto, ele se aproximou do poema e do cordel.
A primeira forma de arte e literatura utilizado pelo médico foi o cordel, mas devido à pandemia — e fatores como o isolamento e distanciamento social — ele recorreu ao poema para continuar se comunicando com os pacientes.
Confira trecho do poema “Vacinação e Pandemia” de Sávio Pinheiro:
Tentando acabar com tão triste chacina
eu busco anticorpos, saúde e bonança,
e contra a Covid, com forte esperança
exponho o meu braço e tomo a vacina.
Com a força dos livros está a medicina
que a peste pandêmica se pôs a enganar.
O infame Corona terá de encontrar
com o néctar da vida, uma pura semente,
mexeu com o pobre e com o rico valente
do chão, do agreste, sertão, beira-mar.
Início de carreira como médico e cordelista
“O Ceará precisava de médico no interior, mas era aquele generalista. Tinha que operar, fazer parto, engessar um braço, fazer uma parte de ortopedia, dar uma de pediatra etc. Especialista aqui não sobrevivia porque tinha de fazer de tudo um pouco. Foi assim que eu iniciei minha vida profissional”, relembra Sávio, que tem 62 anos, sobre o início da carreira.
Quando o Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado, Sávio passou a trabalhar com medicina comunitária (“médico da família”, como era chamado). E com isto, percebeu a necessidade de se comunicar com a população de outras maneiras.
“Eu comecei a trabalhar a comunidade, a família, a fazer um trabalho com hipertensos, diabéticos, com gestantes, com pessoas com tuberculose, hanseníase, prevenção do câncer no colo, gestão familiar, etc. Então eu precisava manter um diálogo maior com essa turma toda, e busquei no cordel essa ponte”, comenta o médico.
Os resultados com a conscientização através da arte foram além do objetivo inicial, de acordo com Sávio. “O mais interessante é que tempos depois de eu utilizar o ‘cordel das ações de saúde’, eu percebi que a importância desse gênero literário não era só a informação, era uma forma que eu tinha de unir o gestor municipal com os pacientes”, destaca o cearense.
Sávio sempre gostou de escrever, quando estudante, materiais como paródias e alguns versos de poema, mas revela que não tinha uma ligação prévia com o cordel. Contudo, os resultados obtidos foram reforçando o uso da arte.
“Quando você constrói um cordel falando sobre um determinado tema, você vê que há uma empolgação, e a gente conseguiu juntar esses atores em uma mesa. Foi aí quando o cordel entrou na discussão, para conseguir desenvolver ações não só de saúde, mas também políticas”, complementa Sávio.
Atualmente, o médico é também membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel. Ele se divide em Juazeiro do Norte (onde reside), Várzea Alegre e Iguatu (onde trabalha em hospitais particulares), Cariús e Farias Brito (onde é médico na rede pública) — todos municípios na parte sul do Ceará.
Por Samuel Pinusa
Fonte: G1 CE