Apesar de os decretos estaduais determinarem que apenas serviços essenciais, como bancos, farmácias e supermercados, podem funcionar durante o período de isolamento social para evitar a propagação do novo coronavírus, e com o uso obrigatório de máscaras pelos trabalhadores destes estabelecimentos, no interior do Estado há lojas de outros setores que insistem em permanecer abertas.
Outra questão são as entregas em domicílio. Se em alguns municípios existe um maior rigor na fiscalização dos chamados deliverys, em outros não existe qualquer acompanhamento.
Irregularidade
O município de Caririaçu, no Sul do Estado, tem aproximadamente 27 mil habitantes. Nossa equipe de reportagem flagrou diversas lojas funcionando na última quarta-feira (22). Algumas, para disfarçar, deixam os portões semiabertos, outras, totalmente escancarados. Tabacaria, lanchonetes, rouparia.
Os funcionários estavam lá dentro, sem qualquer proteção, e mantinham a rotina de um dia qualquer de trabalho. A secretária de Saúde do Município, Maysa Kelly Leite, garante que todos os dias a equipe da pasta tem visitado o comércio, pedindo que as pessoas obedeçam ao decreto.
“Nosso papel é orientar”, enfatiza, reforçando que os estabelecimentos que possuem permissão para funcionar têm sido visitados pela Vigilância Sanitária. “A gente dá as orientações e acha que seguem. Mas oficialmente não chegou nenhuma reclamação”, pondera Maysa Kelly.O promotor Rafael Couto, da Comarca de Caririaçu, aponta que até agora não recebeu nenhuma denúncia sobre lojas funcionando. “De certa forma soubemos, através de boatos. Mas isso não é só um problema de Caririaçu”, acredita. Em paralelo a isso, reforça que o Ministério Público do Estado do Ceará tem conversado com a Polícia Militar para visitar as ruas e verificar se concretamente isso está acontecendo. “Faremos uma investigação para saber se as empresas estão abertas. A sociedade está passando por um momento difícil, tanto na saúde quanto na economia. É uma balança difícil de regular”, admite.
A situação de Caririaçu é semelhante à de Iguatu, na região Centro-Sul do Estado, onde os lojistas permanecem com as portas semiabertas, permitindo a entrada de clientes. “É uma tentativa de burlar a lei e estamos fiscalizando e fechando as lojas”, disse o secretário de Meio Ambiente do Município, Marcos Ageu Medeiros. “As pessoas têm de compreender a importância do isolamento social nesse momento crítico que estamos vivenciando”, pede.
Pressão
Há uma pressão no interior para a reabertura das lojas de varejo e de prestação de serviços. O presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Iguatu, José Mota Luciano, disse que, após reunião com diretores da entidade, do Sindicato dos Lojistas (Sindilojas) e do Sindicato da Construção Civil (Sinduscon), solicitou ao prefeito, Ednaldo Lavor, a volta do funcionamento de alguns setores.
“Entendemos que as óticas, a retomada da construção civil, oficinas de conserto de eletroeletrônicos, a venda de móveis e de eletrodomésticos deveriam ser reabertas, mediante todos os cuidados de higiene pessoal”, defendeu José Mota Luciano. “A crise financeira vem se agravando e há legalidade para que o município possa mudar o decreto”, completou o presidente da CDL.
Neste fim de semana, Iguatu intensificou a fiscalização contra abertura do comércio e presença de vendedores ambulantes nas ruas do Centro da cidade. “Já são 37 dias, com o comércio fechado”, observou o presidente do Sindilojas, Tadeu Rolim. “O nosso objetivo é encontrar uma saída para os comerciantes, que cobram uma alternativa para voltar a vender os seus produtos”, reforça.
Mediante o pedido dos empresários, a promotora de Justiça da comarca de Iguatu, Helga Barreto, expediu recomendação ao prefeito Ednaldo Lavor para que se mantenha o cumprimento dos decretos estadual e municipal.
“Sabemos as dificuldades dos empresários, mas o município não pode descumprir as determinações legais, o decreto do Governo do Estado”, pontuou. “Os prefeitos podem ampliar as medidas em defesa da saúde pública, mas não reduzir”, destacou a promotora.
Para enfrentar a crise, a empresária Elizete Rabelo negociou com suas funcionárias. “Entrei em acordo, concedi férias, pois não posso pagá-las sem vender nada”, justificou. O vendedor ambulante, Júnior Félix, tentou armar uma banca no Centro de Iguatu, mas foi proibido pela fiscalização. “A minha situação financeira está ruim porque dependo das vendas. Tenho contas para pagar, e por isso tenho de correr atrás”.
O presidente da Associação dos Municípios do Ceará (Aprece), Nilson Diniz, destacou que não há como reabrir as lojas de varejo e prestação de serviços agora. “Estamos em um momento crítico, de curva crescente de novos casos e de óbitos”, frisou.
Delivery
Enquanto alguns municípios sofrem para manter fechados os estabelecimentos irregulares, no Crato, a Vigilância Sanitária atua para que os serviços de delivery adotem medidas sanitárias para evitar a contaminação pelo coronavírus. Nesta semana, restaurantes e farmácias estão sendo visitados. Além disso, clientes e empresários recebem material informativo com orientações de higiene e boas práticas para serem adotadas tanto no pagamento quanto no recebimento de mercadorias. “É feito um termo de responsabilidade onde os estabelecimentos que trabalham com delivery assinam”, explica a gerente da Célula da Vigilância Sanitária e Ambiental do Crato, Ana Lígia Aquino.
Entre as recomendações estão a limpeza das caixas térmicas, higienização dos punhos de motos ou volantes dos carros, assim como das maquinetas de cartão, uso de máscara e camisas de mangas compridas pelos entregadores, disponibilização de álcool 70%, distância mínima de 1,5m dos clientes, entre outros. “A gente estava focando nas aglomerações, agora vamos focar nos serviços que podem funcionar. Para acompanhar os deliverys, teremos equipe à noite”, explica.
Ana Lígia confessa que, mesmo com trabalho de educação, a maior parte da população ainda não compreendeu a gravidade do problema. No Crato, as denúncias mais comuns ainda são sobre comércios abertos irregularmente e aglomeração de pessoas em ruas e praças.
“Nas áreas públicas, orientamos a população, falamos sobre os riscos. Nos estabelecimentos, a gente também tem orientado sobre o distanciamento e proteção. Em serviços de alimentação, reforçamos as práticas rigorosas de higiene e enfatizamos que o funcionamento só acontece na entrega. Não pode haver consumo dentro daquele ambiente”, completa.
As denuncias de irregularidades podem ser feitas à Secretaria de Saúde do Crato pelo telefone (88) 3586-8000. Outra opção é o 153, serviço 24h que direciona as demandas de acordo com cada tipo de denúncia.
Por Antonio Rodrigues/Honório Barbosa
Fonte: Diário do Nordeste