Em agosto do ano passado, a Superintendência de Obras Públicas (SOP) informava que, devido à pandemia da Covid-19, que obrigou a readequação das equipes de trabalho para o cumprimento das medidas sanitárias, a entrega da quarta etapa do Anel Viário do Cariri foi adiada de 2020 para o início de 2021.
Agora, sem previsão, uma das obras mais importantes para a mobilidade do Cariri apresenta um cenário de ritmo lento, com máquinas paradas, devido a um impasse em desapropriações de terrenos, retirada de postes da rede elétrica e até de um poço profundo que abastece um bairro de Juazeiro do Norte.
O trecho 4 vai do entroncamento da CE-292, rodovia entre Crato e Juazeiro do Norte, ao da CE-060, que liga Juazeiro do Norte e Barbalha. Ao todo, são 6,84 quilômetros de via, num investimento total de R$ 40,5 milhões, com recursos do Governo do Ceará e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Hoje, segundo a SOP, o avanço físico da obra é de 80%.
Problemas
Apesar de parecer próxima à conclusão, a situação é completamente diferente. No bairro Frei Damião, há aproximadamente 32 terrenos ainda por serem indenizados, em sua maioria, fazem parte de loteamentos. Ali e no vizinho bairro Jardim Gonzaga, ainda há 10 postes da Enel para serem removidos, que segundo informações apuradas pelo Sistema Verdes Mares, ainda aguarda o pagamento pelo Estado.
A Enel informou que recebeu, no início deste mês, a solicitação de orçamento por parte do Governo do Estado para a remoção dos postes. A distribuidora esclarece que a proposta está em fase de elaboração e dentro do prazo regulamentar estabelecido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Após aprovação e pagamento do projeto, deverá ser feita a remoção.
O impasse também chega a um poço que abastece o próprio Jardim Gonzaga. Ele teria que ser removido. A Companhia de Água e Esgoto do Ceará (Cagece) informou que a obra não interferirá no abastecimento, sendo necessária apenas que haja uma adequação na parte elétrica.
Do lado de fora do escritório erguido pela construtora responsável, notam-se, pelo menos, 20 máquinas paradas, somando equipamentos de terraplenagem e produção de asfalto. Ao longo de seus quase sete quilômetros de extensão, homens se concentram apenas na construção de calçadas e do canteiro central. Muito pouco, perto do que ainda resta.
Impasse
Por outro lado, um dos serviços mais complexos, a construção de outro viaduto sobre a CE-060 foi concluído, mas ainda não foi liberado. A estrutura fará a ligação deste trecho com as três primeiras etapas já finalizadas, que juntas somam 8,56 km de via pavimentada. O impasse se dá porque um dos proprietários, que ainda não foi indenizado, enfrenta problemas para conseguir a escritura do imóvel.
“Viaduto só falta a rampa de descida para liberar o trecho”, confessou um dos trabalhadores da construtora.
Filho de um dos proprietários que serão desapropriados pela obra, Júnior Peixoto confessa que, no caso dele, há dez anos seu pai possui o contrato de compra e venda de um terreno, mas que foi obrigado a ir na Justiça para conseguir a escritura. “Tem toda burocracia”, conta. O imóvel é um dos que impedem o avanço da rampa de descida do viaduto. “Muita gente afetada ainda não teve condição de regularizar, pois tudo tem que estar direitinho, tem que pagar o IPTU e muitos não conseguem”, desabafa Peixoto.
Transtornos
No caso da empresária Dalvirene Ribeiro, a desapropriação causou uma série de problemas para ela e sua família. Fugindo da rotina movimentada do Centro da cidade, escolheu o bairro São José, que ainda era sítio, para morar há 19 anos. Com a chegada do Anel Viário, viu sua vida se transformar. Árvores como macaubeiras, cajueiros e pitombeiras deram lugar a um dos viadutos e ao asfalto da terceira etapa.
Pouco tempo depois, se viu, de forma surpreendente, afetada novamente pela obra. Desta vez, pelo Trecho 4. “Eu já tinha gastado cerca de R$ 22 mil com o muro, fazendo um deque e bica. Não sabia que iam passar novamente. Aí, quando me avisaram, foi um choque. Tinha feito toda estrutura”, desabafa.
Em nota, a SOP informou que quase todo o trecho está pavimentado. “O intervalo pendente é devido à existência de interferências da Enel e Cagece, que estão sendo removidas, e a algumas desapropriações, que estão sendo negociadas e pagas”, reforçou. Disse ainda, que, atualmente, cerca de 85 funcionários trabalham na conclusão de terraplenagem, drenagem, revestimento asfáltico, calçadas, alças do viaduto, entre outros elementos do projeto.
A previsão é que este trecho do Contorno de Juazeiro seja entregue em meados deste ano. Sobre a celeridade da resolução das desapropriações, garantiu que tanto a Superintendência quanto a Procuradoria Geral do Estado (PGE) têm trabalhado com afinco para resolução dos processos. Mais de 100 famílias receberam o valor.
Importância
Em pouco mais de 100 anos, Juazeiro do Norte se tornou uma das principais cidades do interior do Nordeste. Neste curto intervalo de “vida”, a terra do Padre Cícero teve um crescimento desenfreado. É a segunda maior frota de veículos do Ceará, com 130.665 unidades registradas. O número é acima de Caucaia, por exemplo, que tem 102.412, mesmo tendo uma população muito superior, 361.400 habitantes contra 276.264 habitantes, segundo a última estimativa do IBGE.
A média de veículos por morador na terra de Padre Cícero chega a superar Fortaleza. São 2,11 veículos por habitante, enquanto a capital cearense tem uma média de 2,28. Soma-se tudo isso à chamada “população flutuante”, que são os visitantes que ocasionalmente estão na cidade por causa do comércio ou durante as romarias, quando dobra o número de pessoas na cidade.
É neste contexto que surge o projeto do Anel Viário do Cariri. “É muito efetiva na questão do fluxo de transporte. Na medida em que as cidades vão crescendo, criam-se novas necessidades. Com ela, o transporte de carga não precisa passar pelo núcleo urbano.
No caso de Juazeiro, já estão intensificados nas avenidas Padre Cícero (CE-292) e Leão Sampaio (CE-060)”, detalha a professora da Universidade Federal do Cariri (UFCA), Lucimar Santiago, doutora em Engenharia de Transportes, ressalta que estas obras sempre trarão impactos, mas a decisão de fazê-las ou não é pesadas pelo custo-benefício.
Por Antonio Rodrigues
Fonte: Diário do Nordeste