Reunir diretores das escolas municipais e perguntar: nas nossas unidades, as alunas do ensino fundamental faltam aulas por estarem menstruadas e não terem como comprar absorventes? Ouvir de volta que: essa realidade é mais comum do que se imagina, sobretudo, em uma cidade pequena, cuja população é, em grande parte, pobre. Em maio de 2021 foi essa a constatação da Prefeitura de Jati, no Sul do Ceará.
Curta e siga nossas redes sociais:
Sugira uma reportagem. Mande uma mensagem para o nosso Whatsapp.
Naquele mesmo mês, uma lei foi aprovada no município de cerca de 8 mil habitantes para tentar reverter o quadro. Com isso, 250 mulheres e adolescentes em situação de pobreza e extrema pobreza recebem em postos de saúde e nas cinco escolas, ao menos, um pacote de absorvente por mês.
A ação tem teor semelhante à proposição vetada, este mês, pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), quando rejeitou artigos de uma lei federal com previsão de distribuição de absorventes para pessoas que menstruam e têm baixa renda.
A proposta em Jati começou a tramitar em maio, enviada pela Prefeitura e foi aprovada no mesmo mês pela Câmara Municipal, que, conforme garante a prefeita Mônica Rosany Pereira Mariano (PSD), “é majoritariamente composta por homens” – dos 9 vereadores, apenas uma é mulher.
A Lei Municipal 608/2021 institui um programa de distribuição gratuita de absorventes na cidade para a população vulnerável.
A entrega, relata a prefeita, teve início em julho e já foram disponibilizados 1.500 pacotes do item de higiene. A licitação, explica, foi para o fornecimento no prazo de um ano, com a possibilidade de demanda de até 1.000 pacotes por mês. “Depende da quantidade de mulheres que estejam cadastradas”, acrescenta Mônica.
Diagnóstico da situação
“Eu já sabia do assunto, já tinha lido, sabia da necessidade de uma forma geral no país. Em maio fiz uma reunião com todos os diretores do município e levantamos esse assunto. Pedi para me relatarem o que acontecia. Já imaginava que exista por ser um município muito pobre. Elas começaram a contar que meninas faltavam sempre perto da mesma data no mês. E que elas inclusive compravam absorventes e deixavam nas escolas porque aqueles que vinham pedir, já podiam pegar”, explica a prefeita.
Do diagnóstico, afirma ela, veio a necessidade de garantir o acesso adequado à escola. “A partir do momento que alguém deixa de ir para a escola por não ter um material básico, falta equidade”. Com a lei aprovada, as 5 escolas que têm Ensino Fundamental II passaram a receber os itens. Nos três 3 postos de saúde e nos sete anexos também há a distribuição.
Segundo a lei, são critérios para concessão gratuita de absorventes higiênicos:
• Estar devidamente cadastrado e atualizado no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, comprovado pelo Número de Identificação Social- NIS;
• Ter renda ‘‘per capita’’ de até R$ 89,00 (oitenta e nove) reais;
• Realizar o cadastro específico no Centro de Referência e Assistência Social (CRAS), sendo que o ‘’auxilio de distribuição gratuita de absorventes higiênicos’’ será concedido conforme os itens anteriores.
De acordo com a gestora, “é um material de higiene muito básico, e por isso, só pega, de fato, quem tem necessidade”. Um dos motivos dos absorventes não serem entregues em casa, diz a prefeita, e a tentantiva de “quebrar o tabu” quando o assunto é a menstruação.
Nas escolas, relata, havia esse receio das adolescentes se sentirem constrangidas por receberem, mas, no dia a dia da distribuição, a percepção da gestão municipal é que a geração das adolescentes está mais consciente sobre os próprios direitos e a saúde. “Menstruar não é doença. Na nossa geração era muito mais tabu do que o que é hoje”, completa.
Ela explica que durante a pandemia, os professores foram orientados a abordar o assunto da pobreza menstrual nas aulas remotas, dando visibilidade ao tema.
Despesas com a execução
Ao vetar uma norma federal que previa a distribuição de absorventes, um dos argumentos do presidente Jair Bolsonaro foi a falta de fonte de recursos “apropriada” para custear a aquisição dos itens de higiene. No caso da norma municipal em Jati, as despesas são por conta de dotações orçamentárias da Secretaria Municipal de Saúde.
A verba utilizada deve ser especificamente relativa aos Programas “Cuidando das Famílias’’ e “Programa de Ação Assistencial Especializada”. A norma municipal diz ainda que para esta finalidade pode haver complementação por recursos de dotações da mesma secretaria e/ou fundos municipais diversos.
Por Thatiany Nascimento
Fonte: Diário do Nordeste