A quadra chuvosa deste ano foi generosa para o Ceará. Em números absolutos, foi a terceira melhor das últimas duas décadas. Entre fevereiro e maio, choveu 823,7 milímetros, o que equivale a quase 3% a mais em relação à média histórica para o Estado, que é de 800.6 mm. Muita água caiu do céu neste intervalo.
Mas, apesar dos números expressivos, algumas cidades cearenses já padecem quando o assunto é abastecimento hídrico. Já no mês seguinte ao fim do período de chuvas (junho), 21 municípios decretaram situação de emergência.
Este quadro é reflexo das chuvas irregulares e de anos seguidos de estiagem, fatores que impossibilitaram a garantia de aporte hídrico satisfatório aos principais reservatórios cearenses.
Sem água nos açudes, comunidades inteiras se veem obrigadas a recorrer a poços profundos e carros-pipas. A primeira opção demanda investimento público e ainda não está totalmente disseminada no interior cearense. A saída encontrada é distribuir água através de caminhões.
O capitão Aluízio Freitas, da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil (Cedec), explica que “apesar de o Estado ter registrado bons volumes pluviométricos, as chuvas foram localizadas e, em algumas regiões, os índices não foram suficientes, sobretudo nas áreas rurais, onde há maior deficiência de abastecimento”.
Crônico
Das cidades que entraram em situação de emergência, provocada pela seca em junho de 2019, dez delas também registraram desabastecimento extremo em igual período do ano passado, conforme levantamento do Núcleo de Dados do Sistema Verdes Mares.
Em Quixeramobim, no Sertão Central, mesmo com os volumes pluviométricos deste ano (920.7 mm) sendo superiores aos que foram verificados em 2018 (779.4 mm), foi preciso decretar estado de emergência, fato que não ocorreu em junho dos últimos três anos. Conforme a Defesa Civil do município, “45 localidades sofrem com a falta de água”. Quase sete mil pessoas estão sendo abastecidas por um único carro-pipa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
“Em junho do ano passado, era só felicidade por aqui. As cisternas ainda estavam com água e ninguém ficava na aflição pela chegada do carro-pipa. Este ano está diferente, estamos comprando água”, comenta o agricultor Francisco de Assis Freitas, 68, da comunidade de Passagem, situada no distrito de Ipueiras, onde moram mais de 70 pessoas.
O coordenador da Defesa Civil de Quixeramobim, Paulo Gustavo Almeida explica que “as chuvas banharam praticamente todo o município, mas nem em todo canto choveu bem. As cisternas das famílias já estão secas e não há nenhum manancial próximo para suprir a carência deles”. Lembra ainda que o município aguarda a liberação de outros carros-pipas por meio do Exército brasileiro. A estimativa é que sejam cedidos pelo menos 20, número superior ao que fora utilizado em igual período do ano passado, quando a cidade contou com apoio de 15 carros-pipa para suprir a demanda hídrica de comunidades rurais.
Crescimento
O número de cidades em situação de emergência tende a crescer substancialmente já a partir do próximo mês. O coordenador da Defesa Civil de Iguatu, José de Arimateia, observa que muitas cidades devem entrar com o pedido de inclusão na lista ainda neste mês. Repetirá o que ocorreu em 2018.
“O antigo decreto se encerrou no mês passado. Então, estamos preparando toda a documentação para, ainda neste mês, realizar novo pedido de situação de emergência”, detalha o coordenador.
Segundo Arimateia, o cenário de Iguatu não é exclusivo. Outras cidades, que não conseguiram armazenar água no período chuvoso, devem entrar com novo pedido nas próximas semanas.
Alternativa
Aluízio analisa que esse padrão de chuvas irregulares “é uma característica própria do semiárido” e que as áreas rurais se tornam as mais vulneráveis. “Quando para de chover, elas rapidamente precisam de auxílio emergencial”, diz.
Para amenizar os graves problemas causados pela seca, Freitas ressalta a importância de dar continuidade ao abastecimento emergencial de água potável por meio da Operação Carro-Pipa, tanto em âmbito federal, quando executada pelo Exército Brasileiro nas áreas rurais afetadas, quanto em esfera estadual, através de ações da Cedec nessas mesmas regiões prejudicadas.
A medida, entretanto, é paliativa e não pode ser adotada como regra, como vem ocorrendo. Freitas reconhece que, embora a instalação de adutoras em áreas rurais fosse a solução adequada, a construção deste equipamento sairia muito caro para atender a um diminuto número de pessoas.
Ele aponta, como possibilidade, a construção de poços profundos e a instalação de caixas- d’água, para o armazenamento mais efetivo das águas.
Por André Costa
Fonte: Diário do Nordeste