Em audiência no Senado, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse nesta sexta-feira (9) que o boi é o “bombeiro do Pantanal” e que, se houvesse mais gado no bioma, as queimadas e o “desastre” na região poderiam ter sido menores.
Para a ministra, o fato de o boi comer capim seco e inflamável previne o alastramento do fogo.
“Aconteceu o desastre porque nós tínhamos muita matéria orgânica seca que, talvez, se nós tivéssemos um pouco mais de gado no Pantanal, isso teria sido um desastre até menor do que nós tivemos este ano”, afirmou Tereza Cristina à comissão que acompanha ações contra as queimadas no Pantanal.
“O boi é o bombeiro do Pantanal, porque é ele que come aquela massa do capim, seja ele o capim nativo ou o capim plantado, que foi feita a troca. É ele que come essa massa para não deixar como este ano nós tivemos. Com a seca, a água do subsolo também baixou os níveis. Essa massa virou um material altamente combustível”, completou Tereza Cristina.
O raciocínio do “boi-bombeiro” não é novo dentro do governo e já tinha sido usado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e pelo presidente Jair Bolsonaro.
Especialistas dizem que a lógica de o gado evitar as queimadas por comer matéria inflamável é um mito.
De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, as fortes queimadas na região consumiram 14% da área do Pantanal somente em setembro deste ano.
A área atingida no ano chega a quase 33 mil km², que equivale à soma do território do Distrito Federal e de Alagoas. No mesmo período do ano passado, a devastação causada pelo fogo chegava a 12.948 km². A devastação observada apenas nos primeiros nove meses deste ano já superam todo o ano de 2019, que teve 20.835 km² atingidos.
Reações
Em nota, a organização não-governamental Greenpeace, que atua em defesa do meio ambiente, disse que o argumento da ministra foi “equivocado”. O Greenpeace afirmou também que o governo promoveu um desmonte na gestão ambiental, o que levou às queimadas descontroladas no Pantanal.
“Diante de um cenário já previsto de seca severa, com focos de calor muito superiores à média desde março de 2019, não foram tomadas medidas efetivas de combate e prevenção aos incêndios, necessárias desde o primeiro semestre. Se não tivesse ocorrido um desmonte da gestão ambiental no Brasil, a situação não teria chegado a este nível de gravidade”, afirmou a entidade na nota.
Para o biólogo João Paulo Capobianco, ex-secretário nacional de Biodiversidade e Florestas e Secretário Executivo do Ministério do Meio Ambiente, classificou a frase da ministra como “infeliz”.
“É uma pena que tenha sido a ministra Tereza Cristina porque ela é uma pessoa bastante esclarecida, tem tido umas posturas muito sérias e inclusive nos ajudado na pauta ambiental, mais que o antiministro do Meio Ambiente”, afirmou.
O deputado Alessandro Molon (RJ), líder do PSB na Câmara, afirmou que a declaração da ministra “não faz o menor sentido”.
“As queimadas no Pantanal se devem a uma série de fatores. Em primeiro lugar, a uma seca extraordinária causada pelo desmatamento tanto do Pantanal quanto da Amazônia e também à mudança global do clima. Por último, ao desmonte dos órgãos de proteção ambiental promovido pelo governo Bolsonaro”, afirmou.
Conselho da Amazônia
A comissão aprovou um requerimento para sugerir ao presidente Jair Bolsonaro a inclusão do Pantanal no Conselho Nacional da Amazônia Legal pelos próximos cinco anos.
O objetivo é garantir uma estrutura para o enfrentamento a futuras queimadas no bioma, com mais recursos financeiros e estrutura logística, incluindo aparato de combate a incêndios, como helicópteros e apoio da Força Nacional e da Defesa Civil.
Criado em fevereiro, o conselho é comandado pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão, e tem como escopo a preservação da floresta.
Segundo a senadora Simone Tebet (MDB-MS), autora do requerimento, a Amazônia Legal se integra ao bioma Pantanal pelo estado de Mato Grosso.
Ela sugeriu ainda que os parlamentares entreguem pessoalmente a indicação ao presidente Bolsonaro na próxima semana de esforço concentrado do Congresso, que ocorrerá entre os dias 19 e 23 de outubro.
Fonte: G1