A CPI do 8 de janeiro quer que a PGR (Procuradoria-Geral da República) investigue a origem e o paradeiro de possíveis pedras preciosas que foram entregues ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no final de outubro do ano passado em Teófilo Otoni (MG).
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Uma troca de emails entre funcionários da ajudância de ordens da Presidência aponta que o ex-mandatário teria recebido, durante sua passagem pela cidade, um envelope e uma caixa com pedras preciosas para a então primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Nos documentos em poder da CPI, o ex-assessor Cleiton Henrique Holzschuk relata que, a pedido do tenente-coronel Mauro Cid, um dos principais auxiliares de Bolsonaro, “as pedras não devem ser cadastradas e devem ser entregues em mão para ele [Cid]”.
“Foi guardado no cofre grande, 01 (um) envelope contendo pedras preciosas para o PR [presidente] e 01 (uma) caixa de pedras preciosas para a PD [primeira-dama], recebidas em Teófilo Otoni em 26/10/22”, relata Holzschuk.
Ele afirmou ainda que o “Sgt Furriel” –referindo-se ao sargento Marcos Vinícius Pereira Furriel— estaria “ciente do assunto” e que poderia tirar dúvidas.
Cid é alvo de investigações no STF (Supremo Tribunal Federal) e em outras instâncias, incluindo no caso das joias enviadas ao ex-mandatário por autoridades da Arábia Saudita. O militar está preso desde o início de maio por determinação do ministro Alexandre de Moraes.
No documento enviado à PGR, parlamentares questionam se o ex-presidente cometeu o crime de peculato, e afirmam que as pedras preciosas não constam na relação de 1.055 itens recebidos oficialmente por ele nos quatro anos de mandato.
“Sabe-se que, no dia do recebimento, a 4 dias do segundo turno das Eleições Presidenciais de 2023, Bolsonaro estava fazendo campanha em Teófilo Otoni”, diz o texto do pedido de investigação.
“Ou seja, as pedras preciosas não foram recebidas em cerimônia protocolar. Logo, questiona-se: quem presenteou Jair Bolsonaro? Qual o motivo da recusa em cadastrar o presente?”
O advogado Josino Correia Junior, morador de Teófilo Otoni, afirmou à Folha que foi ele quem deu o presente a Bolsonaro durante a passagem do então candidato à reeleição pela cidade do sudeste de Minas —conhecida como capital das pedras preciosas.
Correia disse que quis presentear o ex-presidente com um souvenir da cidade. “São pedras semipreciosas. Comprei na véspera da vinda dele à cidade. Custaram R$ 400”, afirmou.
Ele gravou um vídeo com um relato sobre o caso em uma área da cidade que concentra estabelecimentos do ramo no qual afirma que as pedras são “provenientes de exploração legal”.
De acordo com o advogado, o conjunto entregue a Bolsonaro é composto de topázios azuis, citrinos (pedra de cor amarela) e prasiolitas (verde), acondicionadas em um estojo. São quatro pedras de cada.
Ele disse que o filho caçula também presenteou Bolsonaro com alguns cristais e ametistas de um acervo pessoal. E afirmou que os dois volumes seriam destinados ao próprio ex-presidente, cujo nome teria sido gravado no estojo.
Correia enviou à Folha a foto do momento da entrega dos presentes. A imagem está cortada. O filho dele também aparece no recorte com um envelope em mãos.
A foto publicada pelo advogado em seu perfil nas redes sociais mostra ainda o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), e o general Walter Braga Netto, então candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro.
A deputada federal Jandira Feghali (PC do B-RJ), que levantou o tema na CPI, afirma que o email diz “pedras preciosas”, e não “semipreciosas”, e que não há garantias nem de que sejam as mesmas pedras, nem de que o advogado esteja falando a verdade.
“O que ele diz que tinha na caixa ninguém viu. Alguém viu? Alguém abriu essa caixa para saber se ele está falando a verdade? Terceiro: é só essa caixa? Tem mais caixa? Ou seja, essa fala, para mim, não tem nenhum significado”, diz.
“É o email de passagem de serviço dos ajudantes de ordem e um orientando o outro: não cadastre. Em 11 de novembro essa mensagem some. Ou seja, as pedras devem ter saído do cofre. Qual o destino? Não sei.”
Procurado por meio de seu ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten, que é advogado e atua em sua defesa, Bolsonaro não se manifestou.
Após a publicação do texto, o ex-presidente usou as redes sociais para atacar a deputada e dizer que as pedras eram semipreciosas.
“Há poucos dias fui caluniado por uma deputada do PC do B, na CPMI, como tendo recebido diamantes para financiar atos antidemocráticos. Só no Brasil uma comunista, muito bem nutrida, que nunca passou fome na vida, fala em defender a democracia”, afirmou Bolsonaro, citando em seguida o texto da Folha.
“Depois de muitos ataques pela grande mídia contra a minha pessoa, a verdade apareceu. A própria Folha de SP identificou o advogado, morador de Teófilo Otoni/MG, como o doador das pedras, que não eram diamantes.”
Especialistas consultados pela reportagem afirmam que é difícil estimar o valor do estojo, diante das variáveis que envolvem o mercado de pedras preciosas e semipreciosas —como tamanho, intensidade da cor, lapidação e pureza.
Lojistas de Teófilo Otoni dizem que o quilate do topázio azul varia, em média, de US$ 7 (cerca de R$ 35 na cotação atual) a US$ 15 (o equivalente a aproximadamente R$ 73), dependendo do tom de azul da pedra.
O quilate do citrino, segundo comerciantes, é negociado na cidade por valores entre R$ 20 e R$ 30. Já o quilate da prasiolita varia de R$ 10 a R$ 30. Uma pedra do tamanho de uma moeda de R$ 0,10, por exemplo, custaria em torno de R$ 200.
Fonte: Folhapress