Um dos principais canais de YouTube do cercadinho do Alvorada e com acesso privilegiado no Palácio do Alvorada na gestão Jair Bolsonaro (PL), o Foco do Brasil não publicou um conteúdo sequer desde a derrota eleitoral.
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Com quase 3 milhões de inscritos, o canal demitiu o apresentador Cleiton Basso, que tinha um programa diário para falar do governo Bolsonaro, foi colocado à venda e deve ter um rumo editorial diferente, caso consiga manter sua base de inscritos.
Criado no primeiro ano do mandato de Bolsonaro, o Foco do Brasil é um dos alvos do inquérito que investiga atos antidemocráticos, instaurado em 2020 pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). Na eleição de 2022, também teve a receita suspensa pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Diante da crise, o técnico de informática Anderson Ramos, o único proprietário, colocou o Foco do Brasil à venda e encerrou o contrato com Basso, a cara da marca nos últimos quatro anos.
De 2019 a 2020, o canal lucrou US$ 330 mil (R$ 1,7 milhão na cotação atual de câmbio) com monetização do YouTube, segundo relatório da Polícia Federal divulgado à época pelo jornal O Estado de S. Paulo. Os conteúdos mais visualizados do canal eram os registrados em áreas internas da residência oficial, espaço que a imprensa não tinha acesso.
Em setembro, a Folha revelou que um homem foi pago pelo Foco do Brasil para fazer uma pergunta previamente combinada com Bolsonaro no cercadinho. Ele foi contratado para figurar como apoiador do presidente e questionar se ele havia assistido à entrevista do então ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta ao Fantástico. Bolsonaro respondeu: “Eu não assisto à Globo”.
À Folha, Cleiton Basso diz que não pode responder pelo Foco do Brasil, mas que a direção decidiu parar de publicar conteúdos após a decisão do TSE, para evitar novos problemas. Em outubro, a corte eleitoral acatou uma ação de coligação de Lula e determinou a suspensão da verba do canal até 31 daquele mês.
A ação afirmava que mídias como Brasil Paralelo, Folha Política e Foco do Brasil teriam papel relevante em uma cadeia de comunicação que ajudava a divulgar narrativas falsas sobre a conexão de Lula ao crime organizado, por exemplo.
Basso diz ressentir-se de ter seu nome associado a atos antidemocráticos. “Não sou o proprietário do Foco do Brasil e nunca fui a atos antidemocráticos”, afirma, referindo-se aos protestos contra o Congresso e o Supremo em 2020.
Na ocasião, o apresentador prestou depoimento como testemunha. “Era um inquérito sigiloso e logo depois meus dados e da minha família circularam na internet. Torço para que toda a gana do Alexandre de Moraes contra o bolsonarismo se reverta em combate à corrupção no Brasil”, afirma.
Basso gravava o jornal do Paraná e enviava a gravação para uma equipe de São Paulo, que fazia a edição e a montagem –incluindo a imagem de um estúdio de jornalismo falso que sempre aparecia atrás dele. A equipe também contava com um cinegrafista em Brasília, que fazia as imagens do cercadinho.
A reportagem apurou que um profissional de São Paulo, que trabalha no setor de mídia, está prestes a completar a compra do Foco do Brasil. Ele não revelou valores e prefere não divulgar mais informações até que a transação seja concluída —ela depende de o canal estar sem penalizações.
Por WhatsApp, limitou-se a dizer que sua empresa adquiriu o canal após a fase do cercadinho e com interesse em reformular o projeto, que poderá ter diferente linha editorial.
A reportagem não conseguiu entrar em contato com Anderson Ramos.
O Foco do Brasil se tornou uma das principais fontes de informação para público bolsonarista. Publicava de um a dois vídeos por dia, com destaques positivos para o chefe do Executivo e seu entorno.
Em sua descrição no YouTube, o canal diz que cresceu naturalmente, “não recebe e nunca recebeu nenhum recurso financeiro de políticos, empresários ou quem quer que seja”. O mesmo foi dito pelo proprietário à PF.
A ascensão de Bolsonaro à Presidência coincidiu com uma onda de youtubers de extrema direita que usaram o bolsonarismo também como meio de sustento. Além da monetização, eles ganharam dinheiro com venda de produtos, como bandeiras e camisetas, e cobrança de assinaturas mensais de apoiadores.
Com o declínio da popularidade de Bolsonaro, que ainda não deu sinais do papel político que deve assumir após a derrota, a audiência desses perfis também amarga queda de audiência.
Dados da Novelo Data, que monitora canais de direita, mostram que o interesse por figuras como Kim Paim, influenciador de destaque neste nicho, e por programas como Os Pingos nos Is, da Jovem Pan, caíram nos dois últimos meses. O primeiro passou de uma média mensal de visualizações de quase 1 milhão em outubro para 621 mil em novembro. O segundo foi de uma média mensal de quase 2 milhões para 1,2 milhão no mesmo período.
O levantamento aponta apenas para uma tendência, que precisará ser analisada nos próximos meses, já que o fim do ano costuma ser morno para youtubers.
Fonte: Folhapress