O governo de Donald Trump anuncia novas barreiras aos produtos siderúrgicos do Brasil, em mais um episódio que revela os limites da relação supostamente privilegiada que o Planalto acredita manter com a Casa Branca. A decisão é tomada às vésperas da eleição presidencial nos EUA, num setor crítico para o apoio de Republicanos.
Já o governo brasileiro evitou criticar a decisão, numa reação interpretada até mesmo dentro do Itamaraty como um sinal do apoio de Bolsonaro na reeleição do aliado em Washington.
Na sexta-feira, o presidente americano reduziu as cotas para as importações de certos produtos siderúrgicos do Brasil, reabrindo um patamar estabelecido em 2018 entre os dois países.
Para justificar sua decisão, Trump alegou que uma contração no mercado americano de aço. “As importações da maioria dos países diminuíram este ano de forma proporcional a esta contração, enquanto as importações do Brasil diminuíram apenas ligeiramente”, escreveu Trump, em sua nova decisão.
De acordo com ele, seu secretário de comércio o informou de “mudanças significativas no mercado siderúrgico dos Estados Unidos desde o momento que decidi excluir, a longo prazo, o Brasil da tarifa proclamada na Proclamação 9705, conforme emenda”. Ele se referia a uma decisão anterior de não subir tarifas aduaneiras contra os produtos brasileiros.
“O mercado siderúrgico dos Estados Unidos contraiu-se em 2020. Depois de aumentar em 2018 e 2019, os embarques de aço pelos produtores nacionais até junho deste ano são aproximadamente 15% inferiores aos embarques do mesmo período em 2019, com embarques em abril e maio deste ano mais de 30% inferiores aos embarques dos mesmos meses em 2019”, disse Trump.
“O Secretário me informou ainda que a taxa de utilização da capacidade ajustada dos produtores domésticos até 15 de agosto de 2020 está abaixo de 70% e que a taxa atual está próxima ou abaixo de 60% desde a segunda semana de abril”, explicou. “O Brasil é também a segunda maior fonte de importação de aço para os Estados Unidos e a maior fonte de importação de produtos de aço semi-acabados. Além disso, as importações da maioria dos países diminuíram este ano de forma proporcional a esta contração, enquanto as importações do Brasil diminuíram apenas ligeiramente”, destacou.
Havia uma ameaça de que os produtos brasileiros tivessem uma sobretaxa de 25%, o que conseguiu ser evitado depois de um período de negociações. Ainda assim, a redução da cota é um sinal negativo para as exportações brasileiras.
“Os Estados Unidos e o Brasil realizarão novas consultas em dezembro de 2020 para discutir o estado do comércio de aço entre os dois países à luz das condições de mercado então prevalecentes”, indicou.
Desde que assumiu, o presidente Jair Bolsonaro passou a manter Washington como a prioridade em sua política externa. O governo brasileiro deu acesso ao trigo americano, abandonou o status de país em desenvolvimento, cedeu em questões estratégicas e modificou votos históricos do país na ONU para se alinhar com o voto americano.
A expectativa era de que, com isso, haveria uma retribuição do governo americano em diversas áreas, inclusive no setor comercial.
Brasil não critica decisão e nem ameaça levar caso à OMC
O Itamaraty, numa nota divulgada na noite deste sábado, manteve a esperança de que um acordo será encontrado com a Casa Branca e evitou tecer qualquer tipo de crítica à decisão que gera perdas de receitas aos exportadores. O governo brasileiro, às vésperas da eleição de seu aliado em Washington, ainda sinalizou que espera uma recuperação do setor siderúrgico americano.
“O governo dos EUA anunciou a redução da quota para as exportações de aço semi-acabado do Brasil”, afirma o governo. “A medida mantém a isenção de tarifas sobre o comércio bilateral do produto intra-quota, a exemplo do que ocorreu em 2019 como resultado de contato entre os presidentes Jair Bolsonaro e Donald Trump”, apontou.
“O governo brasileiro mantém a firme expectativa de que a recuperação do setor siderúrgico dos EUA, o diálogo franco e construtivo na matéria, a ser retomado em dezembro próximo, e a excepcional qualidade das relações bilaterais permitirão o pleno restabelecimento e mesmo a elevação dos níveis de comércio de aço semi-acabado”, disse o Itamaraty.
“Essa perspectiva coaduna-se com os atuais esforços conjuntos de integração ainda maior das economias dos dois países”, completou.
Por Jamil Chade
Fonte: UOL