Águia de Ouro é a grande campeã do Carnaval 2020 de São Paulo com 269,9 pontos, após levar para a avenida um enredo politizado sobre “o poder do saber” e uma homenagem ao educador Paulo Freire. Esta é a primeira vez que a agremiação fundada em 1976 no bairro da Pompeia, na zona oeste, é a grande campeã do Grupo Especial do Carnaval paulista.
Mestre Juca, da Águia, se emocionou com a vitória. “Eu não sei nem o que falar. Não sei o que estou sentindo. Estou muito feliz. A comunidade da Pompeia está há 44 anos atrás desse título. Águia de Ouro sempre foi grande. Um mês de festa na Pompeia”, celebrou. Ele ainda afirmou que daria um beijo na boca de todos os ritmistas e lembrou os desafios enfrentados pela escola. “Viemos de um Grupo de Acesso e em 2019 ficamos em sexto lugar no Grupo Especial.”
A vitória teve gosto de virada: durante boa parte da apuração, até o penúltimo quesito, Alegoria, a Acadêmicos do Tatuapé liderava. Além disso, os componentes encararam o troféu como um reconhecimento de seu esforço: a dois dias do desfile, as fantasias dos 250 integrantes da Bateria não estavam prontas e a comunidade se uniu em uma força-tarefa para executar as peças a tempo de entrar na avenida.
Assim que saiu o resultado, uma tempestade tomou conta do Anhembi. Isso não impediu que integrantes da Águia de Ouro levantassem o troféu. Enquanto alguns saíram desfilando com o troféu, outros não seguiram por conta da chuva. Houve até queda de energia no local.
A Águia de Ouro volta ao Anhembi no sábado (29) para o Desfile das Campeãs, ao lado de Mancha Verde, Mocidade Alegre, Acadêmicos do Tatuapé e Unidos de Vila Maria.
Apuração teve clima tenso
Durante a apuração, no Sambódromo do Anhembi, o clima era de incerteza e tensão. A agremiação mais animada era a Rosas de Ouro e Barroca Zona Sul, cujos integrantes vibravam a cada nota. As outras agremiações estiveram mais contidas, mesmo recebendo as notas máximas.
A Mocidade Alegre apelou para todos os Orixás. A presidente da agremiação, Solange Cruz, levou várias guias no pescoço e nas mãos. Concentrada, ela não comemorou nenhuma nota, apenas respirou fundo e se manteve em suas orações.
Quatorze agremiações concorreram pelo título de Campeã do Carnaval 2020 e foram avaliadas por 36 jurados em nove quesitos. Um deles, entretanto, teve as notas descartadas por “comportamento inadequado”, segundo informou a Liga das Escolas de Samba de São Paulo. O jurado não teve o nome divulgado, mas faz parte da equipe do quesito Alegoria, que teve descarte de nota.
A X-9 Paulistana entrou na apuração já com cinco décimos a menos. Um dos carros da escola era acoplado, isto é, duas bases foram unidas para formar apenas uma alegoria. Durante o desfile, o encaixe das bases se soltou, configurando a presença de dois carros na avenida e estourando o número máximo de alegorias permitido. A escola perdeu três décimos pela quebra do regulamento e dois décimos por carros a mais.
Por sorteio, a ordem de leitura dos quesitos foi a seguinte: Fantasia, Comissão de frente, Samba-enredo, Harmonia, Evolução, Mestre-Sala e Porta-Bandeira, Enredo, Alegoria e Bateria. Os critérios de desempate seguiram a ordem inversa, começando pelas notas de Bateria.
O desfile da campeã
Com o enredo “O Poder do Saber – Se saber é poder… Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”, a Águia de Ouro contou a história da sabedoria, da Idade da Pedra até o futuro, e acenou a causas importantes. Dentre as 26 alas, havia uma nomeada “Saber Respeitar a Diversidade”, com componentes cadeirantes, e outra chamada “Partilhar as Riquezas Monetárias”, com os integrantes em fantasias douradas e adornadas com cifrões.
A Águia ainda homenageou o educador Paulo Freire ao lembrar uma de suas mais célebres citações (“não se pode falar de educação sem amor”), acompanhada de um “viva Paulo Freire”. No desfile que levou ao título inédito, a Águia contou com 2,5 mil componentes distribuídos em 26 alas, 250 ritmistas e 70 baianas.
A agremiação ousou com um carro alegórico que relembrou a devastação causada pela bomba atômica jogada na cidade de Hiroshima durante a Segunda Guerra Mundial, em uma referência ao fato de que o saber também pode ser usado para a destruição.
O carro trazia uma representação da fumaça da bomba à frente, feita com palha de aço. Era atrás, no entanto, que ficava seu grande destaque: uma estrutura que simulava um prédio em chamas, com fogo projetado em telas. Nela, havia cerca de 120 componentes, que atuavam.
Confira abaixo o samba da campeã, com “O poder do saber: Se saber é poder, quem sabe faz a hora, não espera acontecer”:
Águia em suas asas vou voar
E no caminho da sabedoria
Páginas da história desvendar!
Sou eu? No elo perdido um desbravador!
O tempo é o meu senhor
Em busca da evolução?
Criar e superar limites da imaginação
A mente dominar
Jamais deixar de Acreditar!
Brincar de Deus? Recriar a vida
Desafiar, Surpreender!
Na explosão a dor, uma lição ficou
Sou aprendiz do criador!
Em cada traço que rabisco no papel
Vou desenhando o meu destino
No horizonte vejo um novo alvorecer
Ao mestre meu respeito e carinho
É nova era, o futuro começou
É tempo de paz, resgatar o valor!
Águia? Razão do meu viver
Berço que Deus abençoou
Nada se compara a esse amor
Meu Coração é Comunidade
Faz o sonho acontecer!
Pompeia guerreira, chegou sua hora
Seu manto reluz o poder do saber
É preciso saber viver
Fonte: UOL