O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tocou em temas espinhosos durante a sabatina do Jornal Nacional, da Rede Globo, na noite desta quinta-feira (25). Lula falou sobre casos de corrupção durante os governos petistas, defendeu sua gestão econômica e voltou a criticar a Operação Lava Jato.
Curta e siga nossas redes sociais:
Sugira uma reportagem. Mande uma mensagem para o nosso WhatsApp.
Entre no canal do Revista Cariri no Telegram e veja as principais notícias do dia.
Transmitida ao vivo, esta é a terceira entrevista de presidenciáveis no jornal neste ano e a primeira de Lula na emissora desde que saiu da prisão, em 2018. Em respostas aos apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos, o candidato elogiou ainda a aliança com o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB), candidato a vice na sua chapa, e mandou indiretas ao presidente Jair Bolsonaro (PL), seu principal adversário ao Planalto.
Lula estava descontraído. Sem mostrar qualquer descontentamento com a emissora, que costuma criticar, respondeu a maioria das perguntas com a variação entre humor e seriedade, muito usada em seus discursos, com falas recheadas por referências populares, como futebol. O petista se preparou para tocar em assuntos mais delicados e tina como objetivo evitar confrontos.
Corrupção na Petrobras: O ex-presidente falou abertamente sobre os casos de corrupção na Petrobras durante as gestões petistas. Confrontado por Bonner, Lula admitiu que houve crimes —já que houve confissão—, mas se defendeu ao afirmar que só houve delação porque o governo estimulou investigação.
“Você não pode dizer que não houve corrupção se as pessoas confessaram. O que é mais grave é que as pessoas confessaram, e por conta das pessoas confessarem, ficaram ricos por conta de confessar. Ou seja, foi uma espécie de uma delação premiada. Você não só ganhava a liberdade por falar o que queria o Ministério Público, como você ganhava metade do que você roubou. O roubo foi oficializado pelo Ministério Público, o que eu acho uma insanidade e uma aberração para esse país.”
A resposta de Lula, em uma espécie de morde e assopra, contempla críticas à forma como a Operação Lava Jato investigou o caso. “O correto era você fazer a investigação que tinha que fazer da forma mais correta possível, como fizeram no meu tempo que eu era presidente, e depois se a pessoa for inocente você absolve. Se a pessoa for culpada, você condena”, completou.
Defendeu sua gestão: Apesar de admitir os esquemas na Petrobras, Lula defendeu mecanismos criados em seu governo, como o Portal da Transparência, além de cutucar Bolsonaro ao falar que, na gestão petista, a Polícia Federal era independente e a lista tríplice na escolha da PGR (Procuradoria Geral da República) era respeitada.
“Criamos o Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] para cuidar de movimentações financeiras atípicas e colocamos o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] para combater os cartéis. Ou seja, foram todas medidas no meu governo, além do que o Ministério Público era independente, além do que a Polícia Federal recebeu no meu governo mais liberdade do que em qualquer outro momento da história.”
Lula tem falado sobre o assunto sem muita pressão. A avaliação, dentro do PT, é que assuntos que envolvem o tema “corrupção” já não são o centro da pauta, como foram no passado —em especial em 2018 —mas, quando forem evocados, devem ser respondidos na base jurídica.
Defesa e erro de Dilma: Lula elogiou a ex-presidente Dilma Rousseff, mas disse que, na sua avaliação, ela cometeu “um equívoco” em relação à precificação da gasolina. “Eu acho que cometeram equívoco na hora que fizeram R$ 540 bilhões de desoneração”, apontou.
“A Dilma fez um primeiro mandato presidencial extraordinário, porque crise se agravou, a crise internacional, mesmo assim ela se endividou para poder manter as políticas sociais e poder manter o emprego em 4.5% que foi o menor desemprego que nós tivemos na história desse país, era como se fosse o padrão Noruega, padrão holandesa.”
Críticas à Lava Jato: Como tem feito em entrevistas desde que saiu da prisão em Curitiba, no fim de 2019, Lula teceu duras críticas ao ex-juiz Sergio Moro (União Brasil) e à Lava Jato. Desde que ele foi considerado parcial e os processos, anulados, o petista tem subido o tom contra a operação e tratado do tema com mais naturalidade.
Lula, que já havia se preparado para falar do assunto, disse que, no julgamento, Moro levou uma “mentira que foi longe demais” e que sabia que seu julgamento “era parcial”. A conclusão do Comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) no mesmo sentido de parcialidade de Moro, em abril deste ano, tem sido usada como mais um reforço no discurso lulista.
“Se alguém comete um erro, um delito, investiga-se, apura, julga, condenou, absolve está resolvido o problema. O que foi o equívoco da Lava Jato? É que a Lava Jato enveredou por um caminho político delicado. A Lava Jato ultrapassou o limite da investigação e entrou no limite da política. O objetivo era o Lula. O objetivo era tentar condenar o Lula.”
Indiretas a Bolsonaro: Lula cutucou ainda a indicação de Augusto Aras na PGR (Procuradoria-Geral da República) —por parte do presidente Jair Bolsonaro (PL).
“Eu poderia ter escolhido um procurador ‘engavetador’. Sabe aquele amigo que você escolhe que nenhum processo vai para frente? Eu poderia ter feito isso. Eu escolhi da lista tríplice”, disse o petista, que afirmou que, em um eventual novo governo, vai reforçar os mecanismos contra a corrupção.
Nós vamos continuar criando mecanismos para investigar qualquer delito que aconteça na máquina pública brasileira, porque eu já disse 500 vezes que a corrupção, eu poderia por exemplo fazer decreto de cem anos, sabe decreto de sigilo hora está na moda agora? Eu poderia, para não apurar nada, decreto cem anos de sigilo para o Pazuello, ou poderia não investigar, pega um tapete e coloca em cima de qualquer denúncia e nada vai ser apurado e não vai ter corrupção.”
Mensalão x Orçamento Secreto: Lula usou a estratégia de comparar diferentes aspectos de sua gestão à de Bolsonaro também quando o assunto seguiu voltado à corrupção. Ao ser confrontado pelo Mensalão, escândalo que envolvia pagamentos a deputados em 2005, Lula trouxe à tona o orçamento secreto, esquema de transferência de emendas durante a gestão atual.
“Você acha que o Mensalão, que tanto se falou, é mais grave do que o orçamento secreto?”, questionou Lula. Como parte da estratégia, ele tem criticado também o que chama de tratamento desproporcional aos casos.
Sobre o orçamento, ele chamou Bolsonaro de “bobo da corte” e afirmou que não é o presidente que tem controle sobre sua gestão, mas o Congresso.
“[Orçamento secreto] é usurpação do poder. Acabou o presidencialismo, o Bolsonaro não manda nada. O Bolsonaro é refém do Congresso Nacional. O Bolsonaro sequer cuida do orçamento, Renata, sequer cuida do orçamento. O orçamento quem cuida é o [presidente da Câmara, Arthur] Lira. Ele que libera verba. O ministro liga para ele, não liga para o Presidente da República.”
Ciúmes de Alckmin: Questionado por Bonner sobre a aceitação de Alckmin dentro do PT, Lula falou com entusiasmo da boa relação que tem estabelecido com o ex-tucano. “Eu estou até com ciúme do Alckmin. Você tem que ver que sujeito esperto”, brincou.
Filiado ao PSB no início deste ano para integrar a chapa com Lula, o ex-governador paulista deixou o PSDB depois de 33 anos. A princípio, a união com o antes adversário gerou ruído dentro do PT, mas a união hoje é consenso dentro do partido, ao contrário do que indicou Bonner, em sua pergunta.
“Nós não estamos vivendo no mesmo mundo”, disse Lula, quando o apresentador falou de suposta resistência ainda vigente ao vice.
“Ele fez o discurso no dia sete de maio, quando ele foi apresentado ao PT, que eu fiquei com inveja, ele foi aplaudido de pé. Pergunta para a esposa dele, para a dona Lu [Alckmin], que anda com a Janja [esposa de Lula], para ver como ela está gostando da coisa. O Alckmin já foi aceito pelo PT de corpo e alma.”
Proximidade com o agro: O ex-presidente tratou ainda da reaproximação que a campanha tem procurado com o agronegócio. Recentemente, a campanha tem feito incursões no Centro-Oeste, polo do setor, em especial por meio de Alckmin.
Na contramão de que o setor que dá amplo apoio a Bolsonaro, ele afirmou que o estímulo se dá apenas por parte de armamentistas e empresários que são a favor do desmatamento ilegal, que cresceu na gestão atual.
“O Bolsonaro está ganhando alguns fazendeiros porque está liberando arma, tem gente que acha que é bom ter arma em casa, que acha que ‘eu vou matar alguém’. Não. O que nós queremos é pacificar esse país, porque o pequeno produtor rural e o médio tem que conviver pacificamente com o grande negócio. O Brasil tem possibilidade de ter os dois.”
Segundo o ex-presidente, “empresários sérios que trabalham no agronegócio” não querem desmatar “querem preservar nossos rios, nossas águas e nossa fauna”.
Fonte: UOL