Investigar e compreender as possíveis relações entre habitação e a pandemia da Covid-19 no Brasil. Esse é objetivo da pesquisa de doutorado da geógrafa cearense Sharon Dias que, em janeiro deste ano, foi premiada pela International Development Research Center (IDRC). Com a premiação, a pesquisa entrou na fase de coleta de dados e tem o apoio de diversas instituições cearenses, dentre elas a Universidade Estadual do Ceará (Uece), por meio do Programa de Pós-Graduação em Geografia.
Moradora de Maracanaú, cidade da região metropolitana de Fortaleza, e egressa da rede pública estadual de ensino, Sharon cursou graduação e mestrado na Uece. Em 2018, a pesquisadora iniciou o projeto de doutorado na Universidade Federal Fluminense (UFF), no Rio de Janeiro, em cotutela com a University of Victoria, no Canadá – país onde reside atualmente.
A pesquisa
Ao levar para o doutorado no exterior questionamentos que também falam sobre sua própria trajetória, Sharon abriu possibilidades para olhar a realidade de milhões de brasileiros e, a partir disso, contribuir para a elaboração de políticas públicas eficazes. “A principal questão do projeto antes da pandemia era: quais são os desafios ou como está o cotidiano dessas famílias vivendo ou não em situação de precariedade habitacional ou vivendo em grande conjuntos de habitação de interesse social; quais lições nós podemos aprender a partir dos cotidianos dessas famílias para desenvolver novas políticas públicas e projetos que atendam suas necessidades; quais possíveis sugestões podemos deixar como legado para o desenvolvimento de novas políticas urbanas e habitacionais”, lembra.
Até 2020, o projeto de pesquisa em desenvolvimento não incluía questões sobre os impactos de uma pandemia. “Habitação se coloca como vital para proteção contra o momento pandêmico. Então, o foco do projeto foi reformulado para tentar compreender o cotidiano, desafios e problemas vivenciados por famílias em situação de inadequação habitacional e em grandes conjuntos habitacionais no contexto da pandemia da Covid-19”.
A pesquisadora explica que o foco territorial da pesquisa também precisou ser alterado. “O recorte era Fortaleza e região metropolitana. Especificamente Fortaleza, Capital, e Maracanaú, que é onde eu cresci, num conjunto habitacional também. Então, o foco territorial do projeto antes da pandemia seriam essas duas cidades. Com a chegada da pandemia e, também, com o aporte de mais recursos e, até mesmo, mudando para fazer grande parte da pesquisa online, nós conseguimos ampliar o território para olhar, especificamente, para o Estado do Ceará, focando em Fortaleza e toda região metropolitana, mas, também, dialogando e adicionando dados de todo o Nordeste”, detalha.
Assim, a pesquisa, intitulada “Insegurança à moradia e direitos à moradia de minorias em tempos de financeirização e Covid-19: Lições de comunidades pobres do Nordeste do Brasil”, pretende auxiliar no avanço do conhecimento na área de estudos urbanos, política habitacional, desenvolvimento habitacional, governança inclusiva e saúde pública.
Fortalecimento e parceria
Sharon diz que conquistar a premiação internacional foi fundamental para fortalecer a pesquisa, pois o recurso financeiro permitiu que a coleta de dados qualitativos e quantitativos pudesse ser feita de forma mais colaborativa, participativa e segura, com equipe, softwares, site e serviço de hospedagem. “Eu passei de ser uma pesquisadora com uma bolsa individual que faria o trabalho de campo de forma individual, e teria condições humanas de pesquisa de chegar num determinado público menor, para que eu tivesse acesso a mais tecnologias e uma equipe de assistentes de pesquisa, para que a gente possa chegar naquelas pessoas que têm menos acesso à tecnologia”.
Sobre o apoio das instituições, ela afirma que tem sido muito importante para a atual fase. “Eu brinco que meu laboratório é a rua, mas a população não é objeto que eu possa simplesmente chegar e coletar seu dado. Então, essa parceria institucional nos fortalece no sentido de promover a pesquisa, de nós termos um grupo de pesquisadores e professores que me apoiam. A gente troca muita informação conjuntamente, apoiando outros estudantes também. Essa é a primeira parceria com a Uece”.
Com o recurso do prêmio, também foi possível fechar parceria com o projeto Ser Ponte Fortaleza, possibilitando bolsas de pesquisa para seis agentes comunitários colaborarem na coleta de dados. Os agentes, nomeados por Sharon como pesquisadores comunitários, levam o questionário online para as pessoas que vivem em comunidades de difícil acesso no contexto pandêmico. “Com o Projeto Ser Ponte Fortaleza, que nasceu da iniciativa baseada na solidariedade de levar renda e alimentação para mulheres chefes de família, que ficam muito invisíveis na periferia urbana de Fortaleza, conseguimos patrocinar materiais de proteção individual para os agentes territoriais do projeto, como máscara e álcool em gel”, ressalta.
Sharon destaca o valor do saber e vivência que os pesquisadores comunitários possuem. “São pessoas com extremo saber sobre suas comunidades, sobre a realidade social, urbana e populacional, mas estão fora da universidade. O que não significa que eles não possam vir a ser bolsistas e parceiros dos pesquisadores”, reconhece.
Participe
O questionário da pesquisa Habitação & Covid-19 No Brasil pode ser acessado no site habitacaocovidbrasil.com.
Para participar é necessário ter idade de pelo menos 19 anos e residir no Brasil.