A distribuição adequada de energia elétrica é um serviço básico prestado ao consumidor. Porém, nos últimos anos, o serviço vem sendo alvo de constantes reclamações. Fruto das denúncias, a Enel Distribuição do Ceará (Enel) foi multada em pouco mais de R$ 94 milhões nos últimos sete anos (2013 a 2019). A Agência Reguladora do Estado do Ceará (Arce) é a responsável pela regulação, controle e fiscalização do serviço no território cearense.
O órgão é conveniado à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), autarquia federal vinculada ao Ministério de Minas e Energia, que julga e aplica as multas. No dia 15 de janeiro deste ano, o presidente do Conselho Diretor da Arce, Hélio Winston Leitão, se reuniu, em Brasília, com o diretor-presidente do órgão federal para cobrar uma “melhora rápida e efetiva no atendimento da concessionária (Enel) no Estado”.
Os principais problemas encontrados se referem aos serviços de atendimento da Enel, porém, questões pontuais também são destacadas. “Nós observamos muitas denúncias de demora no atendimento nas lojas físicas, mas, em 2019 também tivemos a questão das contas duplicadas. Ou seja, são serviços básicos que precisam melhorar”, ressalta o presidente do Conselho Diretor do órgão. “Já me reuni, também, com o presidente da Enel Ceará e coloquei de uma forma muito clara que a Arce não vai mais tolerar esse desrespeito à população”.
Problema recorrente
Em 2019, a Enel foi a empresa acompanhada pela Arce com maior número de reclamações de usuários, segundo o último Relatório de Solicitações de Ouvidoria do órgão. Em maio do ano passado, a companhia foi submetida a avaliações de analistas da Agência Reguladora, que solicitaram a elaboração de um plano de ações a ser executado em 2020. O acompanhamento dos resultados para avaliar se as medidas que estão sendo cumpridas será realizado até setembro deste ano. “A Aneel está trabalhando com uma nova metodologia (regulação responsiva), onde a empresa apresenta ações efetivas de melhoria do serviço. Já estamos aplicando essa nova metodologia aqui no Estado”, explica Winston Leitão. “Mesmo assim, eu fui até a Aneel e levei um relatório, mostramos que, nos últimos anos, está havendo uma piora dos dois principais indicadores da qualidade de energia no Estado”. Os dois fatores levantados por ele são o DEC (Duração Equivalente de Interrupção por Unidade Consumidora) e FEC (Frequência Equivalente de Interrupção por Unidade Consumidora). O primeiro indica o número de horas, em média, que um consumidor fica sem energia elétrica durante determinado período (geralmente mensal). Já o segundo, corresponde à média de vezes em que houve interrupção na residência, comércio, indústria, etc. “São indicadores que precisam estar numa certa média. Aqui estão caindo”, pontua Winston Leitão.
Prejuízos
A interrupção dos serviços de energia tem efeitos práticos na vida de Benito Soares, proprietário da Pousada do Luar, na comunidade de Lagoinha, em Paraipaba. “É um problema recorrente e quando chega o período de alta temporada, feriados, temos muitas quedas de energia devido ao aumento da demanda”, lamenta. Segundo ele, é comum que aparelhos eletrodomésticos, como “televisores, liquidificadores, aparelhos de internet”, por exemplo, sejam danificados por conta da interrupção no serviço.
“Há oito anos, tenho essa pousada e sempre acontece isso. Nós não temos uma semana com constância de energia”, explica o empresário. No Réveillon deste ano, ele lembra que chegou a perder clientes pela falta do serviço. “Nós ficamos da noite do dia 30 até as 19 horas do dia 31 sem energia. Perdi R$ 1.200 só de um hóspede que foi embora, além do valor da irmã dele que ia se hospedar”, reclama, ressaltando que o problema é recorrente. “Essa semana já teve uma nova interrupção”. O problema vai além do prejuízo financeiro imediato. Para o proprietário, é “preciso avaliar o prejuízo moral”. “Imagine se você vem, certo que vai passar o Réveillon aqui e quando chega não tem internet, não consegue dormir porque não tem ar-condicionado. As reclamações respingaram na praia de Lagoinha, na minha pousada, mesmo a culpa não sendo nossa”.
A reportagem tentou contato com a Enel Distribuidora, que disse não ter recebido “informações necessárias para apurar a reclamação do cliente”. A empresa esclarece, ainda, que “não tem registros de ocorrências na localidade”.
Atendimento
Em 2019, mais de 10 mil usuários fizeram algum tipo de reclamação contra os serviços prestados pela Enel, segundo Relatório de Solicitações de Ouvidoria da Arce. As principais são com relação à variação de consumo; falta de energia; apresentação e entrega de fatura; cobrança indevida e erros de leitura. Em outubro, foi registrado o maior número de reclamações (1.481).
As medidas imediatas exigidas pela Arce são: aumento no quadro de atendentes dos postos; contratação de 25 estagiários em todo o Estado; aumento do horário de atendimento de 4h para 8h diárias (para algumas lojas); e abertura das lojas aos sábados, para atendimento exclusivo no segmento de recadastramento rural. Para este ano, estão previstas cinco fiscalizações, além do acompanhamento das ações em aberto. As datas serão definidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica.
Autuações
Somente no ano passado, a Enel foi multada em R$ 6,4 milhões. O número é superior aos valores estipulados em 2018 (R$ 260 mil) e 2017 (R$ 5 milhões). Em relação ao valor aplicado em multas de 2013 a 2019, a Enel informou, em nota, que “cerca de 90% já foram encerradas e o restante está em andamento”. Sobre o Plano de Resultados, exigido pela Arce, a companhia disse estar “trabalhando em ações para a melhoria dos processos e dos indicadores e será apresentado o relatório final após o fechamento do plano”.
Fonte: Diário do Nordeste