Pesquisa do Instituto Opnus, encomendada pelo Sistema Verdes Mares, mostra que 68% dos entrevistados cearenses afirmam que a crise ocasionada pela disseminação do novo coronavírus impacta de alguma forma a renda familiar. Desse universo, 24% disseram que o orçamento ficou totalmente prejudicado com a pandemia e outros 16% afirmaram que a doença compromete metade dos rendimentos.
O economista Ricardo Eleutério diz que os números da pesquisa revelam o lado mais dramático do problema, que são os trabalhadores com menos renda. “Nós temos uma situação em que o coronavírus e o isolamento social zeram a renda de cerca de um quarto dos entrevistados. Isso é extremamente dramático. Todavia, o isolamento social vai achatar mais rapidamente a curva dos contaminados. Portanto, quando houver o achatamento (da linha de casos confirmados), nós voltamos (à atividade), saímos gradativamente do isolamento e a economia se recupera com todas as dificuldades”.
Eleutério também afirma que a pesquisa reforça que é preciso criar uma renda mínima de proteção social. “Nós vivemos em um País com muita desigualdade e muitos pobres. O Brasil não é um país pobre, mas com muitos pobres. A renda mínima vai ser fundamental para amparar e criar uma proteção para aqueles que perdem toda a renda ou grande parte dela quando a economia paralisa”, avalia.
Piora no quadro
Para o vice-presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-CE), Ênio Arêa Leão, o quadro de comprometimento da renda deve piorar caso a epidemia não seja controlada. “Eu entendo que mais gente ainda vai ser afetada. Provavelmente, muita gente que disse que não é impacta é assalariada e não foi demitida, mas é natural que, com o tempo, se a crise continuar, essas pessoas sintam os impactos negativos. A tendência é que mais pessoas sejam afetadas”, avalia.
Ele pondera que alguns setores específicos não sentem mais fortemente a crise, como supermercados. “As farmácias só viram a venda de produtos de beleza cair. As empresas de tecnologia também têm visto resposta positiva. Obviamente, dependendo do tamanho da crise, até os funcionários públicos podem ser atingidos”.
Arêa Leão ressalta que, apesar do tamanho da crise, quem mais sofre são as pessoas mais vulneráveis. “Elas são com certeza as mais afetadas. É um momento ruim de dizer isso, mas independentemente de sua renda, as pessoas precisam se planejar e ter uma reserva de renda. A gente precisa se planejar melhor para isso”, pondera.
Futuro
Para o professor do curso de Finanças da Universidade Federal do Ceará, Pablo Castelar, é difícil dizer neste momento como ficará o cenário econômico no futuro. “É uma situação sem precedentes. O número de pessoas com a renda comprometida pode aumentar, mas isso é esperado, porque há um grande número de autônomos e pessoas que dependem do funcionamento do comércio. Isso também depende de quanto tempo a pandemia vai durar”.
Segundo ele, o comprometimento maior da renda pode estar associado à informalidade. “Aqui no Ceará tem muitas pessoas que estão nesta situação, porque elas não têm nenhum direito trabalhista. Mas também mesmo para aqueles que estão no mercado formal há impacto, porque o volume da renda depende das vendas no comércio, de atendimentos, como os garçons nos restaurantes. Mas certamente impacta os mais vulneráveis”, aponta.
Castelar reforça a recomendação das autoridades para o isolamento social para reduzir o ritmo de contágio. “No âmbito econômico, o que resta mesmo é a ajuda governamental direta primeiramente para as pessoas que estão com a renda comprometida. Isso vai depender de medidas do Governo, como crédito para empresas e crédito facilitado enquanto as coisas estiverem difíceis”, avalia o professor.
Pesquisa
Por faixa etária, 82% dos entrevistados de 35 a 44 anos de idade afirmam que o coronavírus impactou na renda familiar. A pandemia tem atingido 77% dos cearenses entre 25 e 34 anos, 70% dos trabalhadores entre 45 e 59 anos, 65% das pessoas de 18 a 24 anos e 43% quem tem 60 anos ou mais.
O impacto também foi registrado para 75% dos entrevistados com ensino médio, 65% com ensino fundamental e 57% com ensino superior. Além disso, o coronavírus afetou mais as pessoas que ganham de um a dois salários mínimos (71%).
Para 81% dos trabalhadores autônomos, a pandemia afetou a renda familiar. Entre os desempregados que estão a busca de recolocação, 80% também disseram sentir os impactos, além de 75% dos desempregados que não estão procurando trabalho.
Segundo a pesquisa, 73% das pessoas deixaram de ir ao trabalho por conta da epidemia e outros 20% não deixaram de trabalhar. Além disso, dos que deixaram de ir presencialmente ao local de trabalho, 82% têm entre 18 e 24 anos, 74% entre 25 e 34 anos, 71% entre 35 e 44 anos, 61% entre 45 e 59 anos e 72% acima de 60 anos.
A pesquisa foi realizada por telefone entre 24 e 26 de março de 2020. Foram entrevistadas 800 pessoas dentre a população cearense com mais de 18 anos e que possui telefone celular, em todas as macrorregiões, seguindo cotas por sexo e idade. Posteriormente, foi feita ponderação dos resultados segundo a escolaridade. A pesquisa possui intervalo de confiança de 95% e margem de erro de 3,5%.
Fonte: Diário do Nordeste