Com a melhora da atividade econômica no segundo semestre, a inflação, que vinha girando em torno de 0,3% ao mês, saltou para 0,8% em outubro, dando sinais de que caminha para uma trajetória de alta. Em outubro do ano passado, por exemplo, a inflação foi de 0,1%.
Esse avanço fez com que o Banco Central elevasse as projeções para inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para 2020 e 2021. Além da perda do poder de compra, a pressão inflacionária poderá provocar alta dos juros e queda da rentabilidade de aplicações financeiras, que podem apresentar taxa real negativa.
“Estamos vendo uma pressão na inflação principalmente pelos preços dos alimentos e de combustíveis, que acabam contaminando alguns setores da atividade econômica”, diz o economista Ricardo Coimbra, presidente do Conselho Regional de Economia do Ceará (Corecon-CE).
“É provável que tenhamos um crescimento nas próximas semanas, mas sem comprometer a meta de inflação para 2020”. O economista avalia que o fim dos auxílios do governo deverão atenuar a demanda e, consequentemente, a escalada de preços. Para os próximos meses, Coimbra prevê que a safra de soja e de arroz no primeiro trimestre de 2021 deva atenuar a alta de preços dos alimentos, assim como a queda da taxa de câmbio, que reflete na redução dos preços dos combustíveis e importações.
“As taxas de câmbio vêm em uma decrescente nas últimas semanas, isso pode ajudar nesse controle inflacionário. E, caso as perspectivas para inflação se mantenham nos próximos anos, podemos ter uma alta da Selic (taxa básica de juros), de 0,25 ou 0,5 pontos percentuais, o que também ajudaria a conter a pressão inflacionária”.
Consumo
Na última quinta-feira (19), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revisou a projeção para a inflação de 2020, de 2,3% para 3,5%. “A ampliação do consumo combinada com os efeitos remanescentes da desvalorização do câmbio e com a alta recente dos preços internacionais de commodities elevou a inflação prevista para 2020”, disse o instituto em sua Carta de Conjuntura.
De acordo com o Ipea, a alta projetada para os preços dos alimentos em 2020 passou de 11% para 16,2%, o que deve fazer com que esse grupo seja responsável por 60% da variação do IPCA no ano. As projeções também apontam para uma aceleração da inflação para os bens de consumo, de 1% para 2,5%.
Já os serviços tiveram alta nas projeções, de 0,7% para 1,5%, com exceção dos serviços de educação, estáveis em 1,2%. “Apesar da aceleração inflacionária do segundo semestre de 2020, a taxa projetada ainda se encontra abaixo da meta estipulada para 2020 (4,0%)”, finaliza o Ipea.
Ceará
No atual cenário econômico, em que os impactos do novo coronavírus ainda afetam negativamente a renda e o emprego, as vendas no comércio varejista ampliado no Ceará apresentam uma queda de 8,5% no ano. E essa baixa demanda, sobretudo em produtos como móveis, roupas, calçados, dentre outros, que apresentam deflação no ano, vem atenuando a trajetória de alta do índice geral de inflação, diz Allisson Martins, economista e coordenador do curso de Ciências Econômicas da Universidade de Fortaleza.
“Por outro lado, a pressão inflacionária de alta é fortemente relacionada com os alimentos, de maneira que a alimentação no domicílio vem sendo a força motriz inflacionária, registrando subida de 14,31% nos preços em 2020, em decorrência de produtos como o óleo de soja e o arroz, que já subiram mais de 60% no ano”, aponta Martins. Ele avalia que, no curto prazo, os alimentos devem continuar pressionando a inflação, em grande medida devido a oferta não acompanhar a demanda interna.
Fortaleza
Para a Capital, a expectativa é que, após o avanço dos preços nas últimas semanas, a pressão inflacionária se estabilize, podendo, no entanto, ser impactada por uma eventual deterioração fiscal do País.
“Mesmo com a alta dos últimos meses nos preços dos alimentos, existe a perspectiva de a inflação desse grupo não se acelerar tanto em dezembro de 2020 como foi em 2019, levando a uma inflação ainda comportada no fim deste ano”, prevê Daniel Suliano, analista do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece).
“Por outro lado, algumas frustrações diante de reformas estruturais e piora do quadro fiscal nacional podem elevar os prêmios de risco dos ativos levando uma contaminação geral dos preços no Brasil e com rebatimento nas regiões onde o índice é calculado, entre as quais a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF)”, diz Suliano. “É bom ressaltar que o grupo de alimentos pressionou os preços na RMF acima da média do País tendo levado a uma aceleração inflacionária maior”.
Em outubro passado, o conjunto dos 12 produtos que compõem a cesta básica de Fortaleza registrou inflação de 5,10%, e no ano a variação chegou a 17,73%, de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Das 17 capitais analisadas pelo Dieese, Fortaleza apresentou a sexta maior alta da cesta no ano, atrás de São Paulo (17,64%), Goiânia (18,22%), Recife (19,11%), Salvador (26,07%) e Aracaju (25,65%).
E no acumulado de 12 meses, a Cesta em Fortaleza apresentou alta de 31,86%, a terceira maior do País, atrás de Aracaju (36,08%) e Goiânia (35,86%). Neste período, os produtos que compõem a Cesta Básica na RMF, o único item a sofrer redução no preço foi a banana (-4,18%). Dos itens que apresentaram elevação de preços, destacam-se o óleo (100,51%), o tomate (74,35%) e o arroz (74,54%).
Investimentos
Com os juros baixos e a inflação em alta, as aplicações financeiras mais populares, que têm rendimento atrelado à Selic, como a poupança, títulos do Tesouro Direto e fundos de renda fixa em geral, perdem atratividade, apresentando rentabilidade real negativa, uma vez que o rendimento dos juros, hoje em torno de 2% ao ano, não supera a inflação, projetada em 3,25%.
“A expectativa para a inflação hoje está muito acima da que era prevista no início do ano. E muitas dessas aplicações mais conservadoras vão ter rentabilidade negativa em 2020”, diz o economista Sérgio Melo, da SM Consultoria.
“Para os que têm possibilidade de investimentos de longo prazo, é possível pensar em novas alternativas de investimentos, com um pouco mais de risco, como as ações. Mas quem necessita de saque imediato ou no curto prazo, terá poucas oportunidades de sair desse quadro de rentabilidade negativa”, diz.
“Já o investimento em ações, há empresas com bom pagamento de dividendos, algumas pagam dividendos com rentabilidade próxima a 4%, além da possibilidade de ganho com a variação do preço da ação, que pode proporcionar ganho maior. Mas, neste caso, é preciso conhecimento de mercado ou de orientação profissional”, recomenda.
Por Bruno Cabral
Fonte: Diário do Nordeste