Áudios obtidos pela coluna de Rodrigo Rangel, no site Metrópoles, mostram o ex-presidente da Caixa Pedro Guimarães ameaçando funcionários de demissão, além de uma rotina de xingamentos, em relatos de assédio moral. Indicado ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em 2019, Guimarães pediu demissão ontem, após denúncias de assédio sexual de funcionárias contra ele serem divulgadas pela imprensa.
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“Caguei para a opinião de vocês porque eu que mando. Não estou perguntando. Isso aqui não é uma democracia, é a minha decisão.”
Ex-presidente da Caixa, Pedro Guimarães, durante uma reunião
Em outro áudio, Guimarães insinua que pode demitir funcionários que tomarem decisões sem consultá-lo.
“Vocês são malucos. Vocês só têm a perder. Não tem que ligar para ninguém. Se eu não dei ok, não dei ok e acabou. Por que vocês vão tomar o risco de perder a função por uma coisa que eu não autorizei?”, questiona Guimarães.
Guimarães oficializou ontem, em carta, o seu pedido de demissão do cargo. No texto, entregue a Bolsonaro e divulgado em suas redes sociais, o economista declarou que combateu o assédio dentro do banco, negou as acusações e disse ser colocado em uma “situação cruel, injusta, desigual e que será corrigida na hora certa com a força da verdade”.
Pimenta na comida
Funcionários ouvidos pelo Metrópoles também relatam que Guimarães colocava pimenta em seus pratos e os obrigava a comer. Segundo os relatos, a prática acontecia especialmente em viagens de trabalho e era entendida como mais uma das técnicas controversas de Guimarães para motivar as equipes.
“Quanto mais você chora e passa mal, mais ele ri. Ele é bem sádico. Em toda refeição de trabalho com ele, tinha pimenta no prato de alguém.”
Servidora da Caixa, sob condição de anonimato, ao Metrópoles
Outra polêmica envolvendo Guimarães aconteceu em 2021 após ele colocar funcionários para fazer flexões durante um evento de fim de ano. Ele foi notificado pelo Ministério Público do Trabalho.
Seis em cada 10 funcionários da Caixa relatam ter sofrido assédio moral no ambiente de trabalho, segundo uma pesquisa da Fenae (Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal), realizada entre novembro e dezembro de 2021.
A pesquisa foi feita com 3.034 trabalhadores do banco estatal, tanto aposentados quanto da ativa. Entre os funcionários da ativa, 56% disseram ter sofrido esse tipo de assédio. Além disso, 70% dos entrevistados já testemunharam assédio moral em ambiente da Caixa.
“Pau mole”
Um dos servidores da Caixa diz que Pedro Guimarães chamava todo mundo de “pau mole, júnior e faixa branca”. As expressões eram usadas para dizer que o funcionário estava desempenhando mal uma tarefa.
Ele também costumava dizer: “Até meu filho faria isso melhor do que você”.
O assédio moral também era acompanhado de expressões de cunho sexual. Uma das funcionárias relatou ao Metrópoles: “Tem uma coisa que ele sempre fala que é assim: ‘Vai vir o Long Dong, vai entrar pelo c* e sair pela boca’. Fui até pesquisar por qual motivo ele falava tanto desse Long Dong. É um ator pornô. É muito assustador.”
Ameaças de demissão
Segundo servidores ouvidos pelo Metrópoles, as ameaças de demissão eram cumpridas, o que explica a alta rotatividade nos cargos de chefia da Caixa.
“A gente tem 37 cargos de dirigentes e mais de 100 pessoas já passaram por esses cargos desde que ele (Guimarães) chegou”, afirma uma subordinada do gabinete.
Executivos da Caixa recebem salários a partir de R$ 30 mil, mas, quando são demitidos das funções de chefia, eles voltam a receber o salário original, até dez vezes menor. Por isso, muitos aceitavam o que Guimarães dizia.
“Você chega ao nível máximo e de repente despenca. Vira um técnico bancário”, afirmou uma funcionária de carreira, que relata ter sido vítima de assédio moral do então presidente do banco.
Neura com celulares
Segundo os depoimentos, era comum que Guimarães cismasse que estava sendo gravado durante as reuniões. Ele pegava os telefones dos funcionários para se certificar que os aplicativos estavam desligados.
“Ele implantou na Caixa um ambiente de medo e de submissão, com o clima sempre tenso”, diz uma funcionária.
A cultura do medo, acrescentou ela, era um instrumento que Guimarães entendia como necessário para uma gestão eficiente. “E ele fala que, se a sua equipe gosta de você, é porque você é um péssimo gestor. Funcionários, na visão dele, têm que odiar o chefe. Diz que você tem que arregaçar todo mundo.”
Caixa admite que recebeu relatos de assédio
A Caixa Econômica Federal admitiu, em nota divulgada na noite de ontem, que recebeu denúncias de assédio e abriu investigação interna em maio deste ano.
O posicionamento foi divulgado após a saída do economista Pedro Guimarães, acusado de assédio sexual. A nota da Caixa não cita o nome do ex-presidente da instituição e diz que o processo corre em sigilo.
Para o lugar de Guimarães, o governo anunciou ainda nesta quarta Daniella Marques Consentino, considerada uma das protagonistas da gestão de Paulo Guedes no Ministério da Economia.
Fonte: UOL