Neste domingo (7), Caetano Veloso completa 80 anos sendo um dos principais nomes da música brasileira. De um berço musical sublime no recôncavo baiano, “Caê” desde cedo demonstrou afinidade com a arte e chega ao octogésimo aniversário ativo, compondo, cantando e interpretando canções de enorme sucesso no repertório brasileiro.
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O músico define a carreira como “coerente e surpreendente” e completa que o amor pela arte veio desde cedo: “Desde menino eu sabia que ia ser artista, mas não músico”.
Embora a modéstia de dizer não saber que seria músico, Caetano não só se entregou ao ofício como se tornou um dos maiores. Além das centenas de premiações, ele é considerado internacionalmente um dos melhores compositores do século XX ao lado de nomes como Bob Dylan, Bob Marley, John Lennon e Paul McCartney.
Ainda no hall de reconhecimentos, Caetano foi eleito pela revista Rolling Stone o 4º maior artista da música brasileira e o 8º maior cantor brasileiro de todos os tempos. O que garante ao músico toda essa importância? Para o jornalista, crítico e historiador de música popular brasileira, Rodrigo Faour, é a inquietação do artista de estar sempre não só atual, mas à frente do seu tempo.
“Caetano ajudou na modernização da linguagem das letras da nossa música (…) Ele funcionou a vida inteira como um farol aos artistas de sua geração e das gerações posteriores, espelhando ou até antecipando novas tendências. Também procurou combater a caretice generalizada e o maniqueísmo em relação aos assuntos polêmicos de todas as épocas”, considera.
Além do combate à “caretice” citado pelo especialista, Caetano também combateu com música, voz e dança o autoritarismo da ditadura militar, o que lhe rendeu a prisão.
Narciso em Férias
Caetano é um dos artistas de maior posicionamento político de todos os tempos. O músico coloca nas canções o que pensa em relação à sociedade em que vive. E isso sempre foi assim. Para Faour, essa é mais uma das qualidades do baiano.
“São poucos os que têm coragem de defender temas progressistas durante tantos anos e também a política do corpo, não apenas a político-partidária – e por isso foi tão incompreendido na época da ditadura até por grupos mais ligados à esquerda castiça”, afirma.
Com um posicionamento claro sobre o que pensa, o artista não agradou os generais que governavam o Brasil durante a ditadura militar. Em 1968, ao lado de Gilberto Gil, Caetano foi preso sob acusação de ter desrespeitado o hino nacional e a bandeira brasileira.
No total, o músico ficou 54 dias em cárcere e, em seguida, partiu com a família para o exílio, na Inglaterra. O episódio é contado detalhadamente pelo próprio Caetano na série “Narciso em Férias”, lançada em 2020 pela Globoplay.
É proibido proibir
A mesma inquietude que rendeu a Caetano problemas com o governo também deu vida a um movimento que mudou para sempre a arte no Brasil. O descontentamento com os padrões impostos em 1960, além da elitista e nacionalista cena cultural brasileira da época, fizeram com que Caetano se tornasse um dos líderes da Tropicália, movimento criado em 1967.
“A Tropicália foi o primeiro movimento a tentar quebrar convenções de brega e chique, de alta e baixa culturas em nossa música, considerando o fenômeno da nova cultura pop internacional pós-Beatles. As ferramentas usadas para tal foram letras com uma poética diferente, arrojada; a mistura de instrumentos ‘forasteiros’ como a guitarra elétrica com os nossos pandeiros e afins”, explica Rodrigo.
Ainda segundo o pesquisador, na Tropicália não era suficiente mudar só o som, por isso, roupas e cabelos extravagantes também foram adotados pelos adeptos ao movimento.
“Foi um estratagema para que a nossa música pudesse fazer frente à crescente globalização da cultura ocidental”, analisa Faour, que concluiu opinando que, sem o movimento da Tropicália, a MPB poderia findar, já que seria quase impossível disputar com o “poder do pop anglo-americano”.
80 sem cheiro de mofo
Caetano não foi cantor, compositor, músico, produtor, arranjador e escritor brasileiro. Ele é. No presente. Afinal, segue em plena atividade. Além de estar em turnê com “Meu Coco”, Caetano comemora 80 anos em um show ao lado dos três filhos, Zeca, Tom e Moreno e a irmã Maria Bethânia, em uma live transmitida gratuitamente na Globoplay neste domingo (7).
“Decidi resumir a festa dos meus 80 anos a uma apresentação com meus filhos e minha irmã. Será um show íntimo, mas com público – e para ser visto ao vivo por internautas e telespectadores. Estamos ensaiando em casa, mas vamos para um palco grande. Temos e não temos o direito de errar acordes, versos, notas”, conta Caetano em entrevista divulgada pela Globo.
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Mas muito mais que só a festa e o presente ao público que acompanhará o show, Caetano chega aos 80 anos agraciando os fãs com novidades. O que é um privilégio, segundo Faour. “Além de manter a voz e o corpo em ótima forma, o trabalho nunca ficou com cheiro de mofo. Ele está sempre se reciclando e buscando, dentro de seu estilo, trazer novidades ao debate público por meio de canções. Resiste cunhando uma obra com discurso poético apurado em canções das mais simples às mais sofisticadas ou relendo pérolas das mais variadas fases da nossa música, independentemente do estilo musical”, opina.
É inquestionável, portanto, a importância de Caetano na música brasileira. Aos 80, o cantor é dono de composições conhecidas por brasileiros de todas as classes, credos e crenças. Como legado para a cultura brasileira, segundo o historiador, o baiano mostra que a busca incessante pela renovação, sem negar o passado, bem como a coragem de se expressar, é uma receita longeva, frutífera e que jamais ficará velha.
Fonte: iG