Tomar a vacina contra a Covid-19 pode estar entre as maiores alegrias dos últimos tempos, e é por isso que os imunizados não perdem a chance de contar a novidade para todo mundo, postando fotos e vídeos. É só abrir a rede social para encontrar a carteirinha de vacinação de algum conhecido.
Pode até parecer inofensivo, mas colocar isso nas redes sociais abre portas para várias possibilidades de crimes, diz o advogado José Renato Laranjeira, diretor do Lapin (Laboratório de Políticas Públicas e Internet) e membro da Coalizão Direitos na Rede.
Dependendo do estado, o documento de vacinação pode conter: número do CPF, do RG e do cadastro no SUS e a data de nascimento. Às vezes, são feitas anotações também sobre a pessoa que aplicou a vacina.
“Esses dados são os que nós usamos para autenticar, ou seja, para dizer que nós somos nós mesmos. Uma vez que você compartilha isso, você facilita que agentes mal-intencionados usem essas informações para fraudes”, alerta Laranjeira.
Por isso, quando chegar a sua vez (ou a de alguém próximo) de receber as doses, controle os impulsos e não saia postando por aí o que deveria ser privado — ou seja, os seus dados.
Dados de saúde são considerados sensíveis
Além do risco de acabar vítima de algum golpe, ao divulgar dados de saúde, o dono das informações pode amargar outros prejuízos que vão desde pagar mais caro para ter um plano de saúde encarecido até problemas na avaliação de crédito.
Não é à toa que as informações relacionadas à nossa saúde são consideradas dados sensíveis pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e, por isso, exigem uma proteção ainda maior.
Laranjeira explica que a partir dos nossos dados de saúde, a pessoa (ou empresa) que os coletou consegue criar perfis nossos. Essas informações podem ainda ser cruzadas com as de outras bases de dados e revelar, por exemplo, se o recém-imunizado tem algum problema cardíaco. “Aí você pode encarecer um plano de saúde para ela”, diz o advogado.
Essa combinação de bancos de dados pode fazer com que uma empresa decida te oferecer (ou não) crédito. Para avaliar se uma pessoa é uma “boa” pagadora, Serasa e SPC se baseiam em uma série de informações coletadas de diversos bancos de dados. Se essas informações estiverem públicas, fica até mais fácil.
Risco de ter que indenizar a enfermeira
Nos casos em que a carteirinha tem informações também de quem aplicou a vacina, como número do registro no Conselho Regional de Enfermagem e assinatura, a publicação de uma foto pode afetar mais pessoas, levando a possíveis punições previstas no Código Penal Brasileiro.
A advogada Paula Lima Zanona, gerente jurídica de privacidade e proteção de dados, explica que “a pessoa pode estar cometendo ato ilícito se permitir que criminosos utilizem não só os dados dela como também os do enfermeiro que aplicou a vacina”.
“Será que o profissional [que aplicou a vacina] tem ciência da exposição dele? Depois ele pode pedir algum tipo de indenização”, ela afirma.
Zanona chama a atenção para o perigo de ter o documento clonado e para a oportunidade que se dá a cibercriminosos de guardar essas informações por muito tempo, sabendo que são verdadeiras, já que o próprio dono as compartilhou na internet.
Roubo de identidade
A Avast, empresa de programas antivírus, divulgou que “o nome completo e a data de nascimento são potencialmente suficientes para que alguém tente iniciar uma tentativa de roubo de identidade contra a vítima, especialmente se puder combinar esses dados com outras informações pessoais que podem estar publicamente disponíveis em registros públicos ou nas mídias sociais”.
Se os dados na carteira de vacinação não forem suficientes, o invasor ainda pode coletar mais se ligar para o centro médico e pedir a sua ficha, “fingindo ser uma pessoa confiável que liga para ‘verificar algo'”, diz Christopher Budd, gerente-sênior de Comunicações de Ameaças Globais da companhia.
Problemas em obter seu “passaporte da vacina”
Alguns países já estão adotando “passaportes” para comprovação da vacina. Na maioria das vezes, se trata apenas de um código digital exibido na tela do celular, que permite que os vacinados possam fazer viagens internacionais —e também idas a restaurantes, shows e eventos esportivos, por exemplo. Uma fotografia de seu comprovante de vacinação nas redes sociais pode possibilitar uma falsificação deste, e consequentemente, dificultar a retirada de seu passaporte.
Comemore com segurança
Especialistas recomendam cinco maneiras de comemorar a vacina sem expor dados pessoais:
• Foto da própria vacinação: tire uma foto do profissional de saúde inserindo a agulha (com a permissão do profissional) e compartilhe;
• Selfie do seu curativo: espere até chegar em casa, com privacidade, e tire uma selfie do seu curativo;
• Foto na área externa: no lugar em que você for vacinado, peça para alguém tirar a sua foto do lado de fora. Assim, você divulga o local de vacinação e, ao mesmo tempo, comemora;
• Oculte todas as informações pessoais: cubra com o dedo todas as informações pessoais. Não adianta editar a imagem no Paint ou no Photoshop, pois edições ainda podem ser eliminadas por hackers;
• Use palavras em vez de imagens: expresse seus sentimentos com um texto (sem informar detalhes demais).
Fonte: Tilt/UOL