O Ceará teve pelo menos 11 hospitais de campanha operando para atender a pacientes com Covid-19 durante a pandemia. Destes, apenas dois – da Unimed e do Hospital São José – foram desativados pela diminuição da demanda.
A unidade instalada no Estádio Presidente Vargas (PV), em Fortaleza, continua de pé, mas sem receber novas internações desde o dia 30 de julho, de acordo com a Secretaria Municipal da Saúde (SMS). Com a redução, estruturas da rede estadual também continuam operando com outros perfis assistenciais.
A Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) informa que investiu em sete hospitais de campanha: cinco na Grande Fortaleza e dois no interior. A Pasta afirma que, como “a pandemia ainda não acabou”, decidiu manter as estruturas montadas “por tempo indeterminado”. Contudo, lembra que, devido à diminuição dos casos e do número de internações por Covid-19 nas últimas semanas, alguns leitos passaram a ser direcionados para outros perfis assistenciais.
De forma geral, o Ceará já liberou o uso de 1.255 leitos exclusivos para a doença. O número representa 42% dos 2.951 abertos pelo Governo do Estado entre abril e junho. Atualmente, são utilizados 1.696, sendo 524 de UTI e 1.172 de enfermaria para o atendimento da doença pandêmica. Conforme a Sesa, as consultas ambulatoriais e as cirurgias eletivas estão sendo retomadas gradativamente e, por isso, houve redimensionamento dos leitos.
No Hospital de Campanha do PV, foram 1.239 atendimentos desde a inauguração, dos quais 1.025 resultaram em altas e 140 em óbitos. A SMS informou que ele “permanece com sua estrutura física montada para acolher pacientes de acordo com a demanda da população”. “Como ainda estamos em pandemia, continuamos observando o cenário epidemiológico que, felizmente, é de muita estabilidade com decréscimo sustentado de casos, óbitos e demanda assistencial”, reforça a titular da SMS, Joana Maciel.
Moradora da Barra do Ceará, a vendedora de cosméticos Maria Célia Rodrigues, 56, passou um mês internada entre a UPA do Cristo Redentor e o hospital do PV, onde chegou a ficar na UTI com 90% dos pulmões comprometidos, em maio. “Me colocaram na máscara e acho que passei duas semanas? Perdi noção do tempo, não tinha força pra nada, igual a um bebê. Tinha um medo grande de dormir e não acordar mais”, relembra a aflição passada.
Melhoria
Aos poucos, o quadro clínico foi melhorando até a alta, em junho, mas Célia revela que só recentemente se livrou da tosse seca e do cansaço. “Eu vi a morte na minha frente”, sentencia ela, que crê ter recebido uma segunda chance de vida por intervenção “de Deus e dos médicos”.
Segundo a plataforma IntegraSUS, o hospital de campanha Dr. Francisco Alves, em Sobral, tinha, nesta quarta, 66% de leitos de UTI ocupados – 10 dos 15 – e 34% dos de enfermaria – 12 dos 35. A Prefeitura informou que mais de 400 pacientes já foram acolhidos no espaço, dos quais 320 evoluíram para recuperação e 56 faleceram. Embora tenha confirmado a diminuição da demanda, “o Hospital não tem previsão para desativar”, declara à reportagem.
Na última semana, o hospital de campanha de Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza, passou a reduzir ainda mais os leitos para Covid-19: hoje, são apenas dois de UTI e três de enfermaria. No início de agosto, eram 18, metade de cada tipo. A Prefeitura informou que há previsão de desativação “ainda neste mês de setembro” por causa da queda nos registros. Desde a abertura do equipamento até a última terça-feira (1º), o local registrou 21 óbitos, 44 altas e 13 transferências.
O médico Ítalo Ramon de Araújo, diretor técnico do Hospital, percebe uma “acentuada redução” na demanda assistencial nos últimos 40 dias. “Isso tem nos levado a reavaliar nossas estratégias de combate do ponto de vista hospitalar porque temos outras demandas além da Covid, e aos poucos tentamos retomar essas atividades”, disse em entrevista ao Sistema Verdes Mares.
Planejamento
Fernanda Colares, professora do Curso de Medicina da Universidade de Fortaleza e diretora geral do Hospital Regional Unimed, lembra que tais estruturas são ligadas à imagem de guerras e grandes catástrofes e que, antes da pandemia, “era muito difícil precisar recorrer” a elas. “Remetiam muito a situações provisórias e emergenciais”, pontua a especialista.
No cenário extraordinário da Covid-19, com as projeções epidemiológicas indicando grande necessidade de leitos desde o início da transmissão, a médica garante que o planejamento foi fundamental.
“Não daria tempo de fazer uma estrutura de alvenaria ou achar um grande espaço para isso. Ao mesmo tempo, precisamos dar o mínimo de conforto ao paciente. A diferença foi que desmistificamos aquela coisa mal-ajambrada, feita de qualquer jeito”, explica.
O hospital de campanha da Unimed, um dos primeiros a começar a operar no Ceará, no fim de março, teve seus 44 leitos desmontados na transição do mês de junho para julho, após três semanas sem novos pacientes.
No Hospital São José (HSJ), referência estadual em doenças infecciosas, a unidade de campanha com 25 leitos também já foi desativada. Ao todo, ela registrou 140 internamentos, com 118 altas e 22 transferências internas para a sede do Hospital. Não houve óbitos. Hoje, o HSJ – que chegou a 100% da ocupação nos meses de abril e maio – ainda mantém uma unidade de 20 leitos só para Covid-19, atualmente com 60% de ocupação.
Para a médica Fernanda Colares, sem o isolamento social e sem os hospitais de campanha, o Ceará não teria tido tanto êxito na desaceleração de casos vivenciada atualmente. Ao mesmo tempo, destaca que as estruturas não devem ser utilizadas de forma permanente. “Se for a longo prazo, tem que construir unidades dentro das normas e regras de segurança. A pandemia é uma exceção pela calamidade pública, mas um hospital de campanha não deve ser usado para sanar problemas rotineiros. Para isso, tem que ter planejamento”, indica.
Sem pacientes
Outras duas estruturas de hospitais de campanha foram montadas no Ceará, mas não chegaram a receber pacientes. A Sesa informou que, em Maracanaú, o local levantado entre maio e junho está sendo utilizado como Centro de Testagem para a Covid-19, com capacidade para 500 exames por semana.
Já o espaço anexo ao Hospital Infantil Albert Sabin (Hias) foi montado em abril, prevendo a sobreposição da Covid-19 aos casos sazonais de gripe. Contudo, a análise dos casos pediátricos da doença levaram à conclusão de “não haver necessidade da estrutura temporária”. A desativação ocorreu em maio.
Por Nícolas Paulino
Fonte: Diário do Nordeste