O mundo aguarda o desenvolvimento de uma vacina eficaz contra a Covid-19, mas apenas sua criação – e produção em larga escala – não é suficiente. É preciso pensar nos desafios práticos também. Um deles é a logística. A venda de doses da vacina, sua distribuição e aplicação pelo mundo não é algo fácil, e especialistas vêm alertando sobre um possível problema que pode complicar ainda mais o processo: a escassez de seringas.
A preocupação é mais do que legítima: no começo da pandemia, o mundo viu a demanda por equipamentos de proteção como máscaras, álcool em gel e sabonete disparar muito mais rapidamente do que a sua produção, o que levou esses produtos a desaparecer das prateleiras. Agora, países querem evitar que o mesmo se repita com seringas.
Não há dados sobre a oferta global de seringas, já que isso varia de país para país. Mas algumas nações já vem se preparando com antecedência, como é o caso dos Estados Unidos.
No começo de maio, Rick Bright, ex-diretor da agência de saúde Biomedical Advanced Research and Development Authority (Barda), enviou um documento ao governo americano estimando que seriam necessárias 850 milhões de seringas extras em um futuro próximo no país. O cálculo inclui tanto as seringas necessárias para uma possível vacina contra a Covid-19 que necessite de duas doses como também um estoque extra para a imunização contra outras doenças, como gripe e sarampo. Segundo Bright, é comum que após epidemias e pandemias a população procure se vacinar também contra outras doenças, o que leva a um aumento de demanda por esse instrumento.
Na época da liberação do documento, Peter Navarro, um dos conselheiros do presidente Donald Trump, escreveu: “Nosso estoque atual desses suprimentos é limitado e, nas capacidades atuais, levaria até dois anos para produzir essa quantidade de agulhas. Podemos nos deparar com uma situação em que temos doses de vacinas suficientes, mas não teremos como aplicá-las”.
Vale lembrar, porém, que o cálculo considera que todas as pessoas (ou grande parte delas) precisem ser vacinadas. Na prática, é possível que se atinja imunidade de rebanho (situação em que o vírus deixa de circular porque muita gente está imune) com uma porcentagem menor de indivíduos imunizados – embora não se saiba exatamente qual seja esse número.
Mesmo assim, o aviso acendeu uma alerta para o governo agir com antecedência: até julho, os Estados Unidos já havia assinados contratos milionários com quatro fabricantes de vacinas para a produção de pelo menos 820 milhões de seringas, com cerca de metade sendo entregue ainda esse ano e o restante em 2021. Entre as empresas, está a Becton Dickinson, mais conhecida como BD, que é a principal responsável por produzir o produto nos Estados Unidos e também em vários outros países, incluindo o Brasil. A BD também fechou contrato para fornecer 37 milhões de seringas para o Canadá e 65 milhões para para o Reino Unido, números muito próximos do número total de habitantes desses países, o que garantiria ao menos uma dose da imunização para grande parcela da população. Além disso, negociações para possíveis segundas doses estão em andamento.
A preocupação se estende também à União Europeia, bloco que reúne diversos países do continente europeu. Em reunião com representares dos ministérios da saúde dos países-membros, o órgão executivo da UE alertou que “vacinas contra Covid-19, quando forem desenvolvidas, poderão vir sem seringas e outros itens. Poderá haver escassez”. Alguns países do bloco, como Itália e Holanda, sugeriram que negociações com empresas fornecedoras desses itens sejam feitas via União Europeia e não individualmente por cada país, para que se assim consigam melhores preços.
No Brasil, o problema também existe. Segundo informações do jornal O Globo, Ministério da Saúde informou que está estudando a compra de 120 milhões de seringas e agulhas apenas para a vacinação contra a Covid-19, sendo 80 milhões de fabricantes brasileiros e 40 milhões de empresas internacionais. Esse número, porém, seria suficiente para imunizar apenas 57% da população nacional.
A BD também é a maior fornecedora do equipamento no Brasil, e afirmou que é capaz de aumentar sua produção caso haja demanda, desde que o pedido seja feito com antecedência. “Começamos a nos preocupar porque é preciso que o governo faça um estoque estratégico. As empresas podem produzir, mas precisam de planejamento prévio. Não vendemos pizza. Entregamos hoje o que os clientes encomendaram seis meses atrás”, afirmou a’O Globo Walban Souza, diretor de assuntos corporativos da BD.
Fonte: Superinteressante