Em um momento crítico da pandemia e ainda sem vacinação, o Brasil passou a marca de 200 mil mortes por Covid-19 nesta quinta-feira (7), segundo levantamento do consórcio de veículos de imprensa, a partir de dados das secretarias estaduais de Saúde, em um boletim extra. O total de óbitos registrados é de 200.011, com 7.921.803 casos confirmados.
A primeira morte pela doença no país aconteceu em fevereiro do ano passado. Nos meses seguintes, o número de óbitos subiu gradativamente, até que em junho foi atingido um estágio de platô com cerca de 1 mil mortes diárias.
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Em 8 de agosto, 100 mil vidas haviam sido perdidas na pandemia. Mas em meados daquele mês, começou a ser observada uma tendência de queda nos números da tragédia. Cidades e estados flexibilizaram restrições à circulação, e muitos hospitais de campanha foram desmontados.
Em novembro, as mortes voltaram a aumentar e, desde o início deste ano, o Amazonas voltou a reviver momentos difíceis da pandemia, com hospitais e cemitérios lotados. Nos últimos dias, Manaus atingiu recorde de novas internações que superaram números vistos em abril e maio, quando houve colapsos no sistema público de saúde e funerário.
Nesta quarta (6), Manaus registrou 110 enterros nos cemitérios, número que se aproxima do recorde registrado em 26 de abril do ano passado, quando houve 140 sepultamentos.
Em Belém, também há temor de novo caos na saúde: quase 100% dos leitos de UTI já estão ocupados.
Na Grande São Paulo e no Rio de Janeiro, prefeituras fazem contratações emergenciais de leitos de UTI em hospitais particulares.
A pandemia devastou famílias como a do médico Aristides Camargo, 79 anos, e da ex-professora Maria Inês Santos Camargo, 67. O casal de Sorocaba (SP) morreu com três dias de diferença depois de sentir, às vésperas do Natal, os primeiros sintomas de Covid-19.
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“A pandemia foi a época que eles viveram mais juntos, muito juntos, um para o outro. Ele sempre trabalhou muito, e ela chegou a comentar comigo que estava curtindo muito ficar com ele direto”, disse Ana Laura Camargo Marques, filha do casal.
À espera da vacinação
Mais de 40 países já começaram a aplicar vacinas contra a Covid-19. O Reino Unido foi o primeiro país a usar a vacina da Pfizer/BioNTech, seguido de Estados Unidos, Canadá, Arábia Saudita, Israel e os 27 países da União Europeia. Os EUA também estão aplicando a vacina da Moderna. Outros países começaram a usar a Sputnik V e as vacinas da Sinovac e Sinopharm. Em todo o mundo, mais de 15 milhões de doses já foram aplicadas.
Entre os países com maior percentual da população vacinada estão Israel, com 15%, e Emirados Árabes Unidos, com quase 8%.
No Brasil, o Instituto Butantan pediu à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorização para uso emergencial da CoronaVac, a vacina produzida em parceria com o laboratório Sinovac. Mesmo sem ter recebido o aval, o governo de São Paulo prometeu começar a imunização a partir de 25 de janeiro. A taxa de eficácia da vacina foi divulgada nesta quinta-feira (7): é de 78%, sendo 100% para casos moderados e graves.
O Ministério da Saúde anunciou nesta quinta contrato para compra de 100 milhões de doses de vacina do Instituto Butantan. Toda a produção do instituto será incorporada ao Plano Nacional de Imunização, para distribuição em todo o país.
Apesar da pressão de prefeitos e governadores, o Ministério da Saúde ainda não apresentou cronograma para vacinação no Brasil.
“Cobramos uma data e não nos foi fornecida. Quando chegam os insumos? Quando começa a vacinação? O secretário disse que iria levar nossa demanda ao ministro Pazuello”, disse governador do Piauí, Wellington Dias, após reunião com o secretário de vigilância do Ministério da Saúde, Arnaldo Medeiros, na última terça-feira (5).
Em janeiro, devem chegar ao Brasil 2 milhões de doses da AstraZeneca/Oxford produzidas na Índia. Esse imunizante foi testado em voluntários brasileiros e deve ser produzido pela Fiocruz. A importação, por R$ 59,4 milhões, foi autorizada pela Anvisa, mas ainda não há liberação para uso pela população. Quando começar a imunização, os primeiros a tomar as doses devem ser os profissionais de saúde.
Na semana passada, fracassou uma licitação do Ministério da Saúde para compra de seringas e agulhas para vacinação. O pregão previa a compra de 331 milhões de seringas, mas as empresas que participaram garantiram entrega de apenas 7,9 milhões. As empresas reclamaram que o edital encomendava seringas e agulhas como um só produto, e que os preços estavam abaixo dos praticados.
Nesta quarta, o presidente Jair Bolsonaro acusou fabricantes de terem aumentado os preços e, por esse motivo, o governo federal suspendeu a compra do material. O epidemiologista Paulo Lotufo, em entrevista à GloboNews na manhã desta quarta, reforçou que se a compra tivesse sido feita com antecedência, o governo pagaria mais barato.
Nova variante do vírus
Em meio ao aumento de casos e mortes, nesta semana o Instituto Adolfo Lutz, referência em São Paulo, confirmou dois casos de uma nova variante do coronavírus no Brasil. Ela surgiu no Reino Unido, onde já representa mais de 50% dos novos casos diagnosticados, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Por enquanto, não há comprovação de que o vírus esteja mais forte ou cause uma versão mais grave da Covid-19. Mas um estudo médico divulgado no final de dezembro aponta que a nova versão é entre 50% a 74% mais contagiosa.
Por enquanto, de acordo com a OMS, ainda não há informação suficiente para determinar se a nova variante afetará a eficácia das vacinas, afirmando que pesquisas estão em andamento.
Famílias afetadas: ‘A gente não se conforma’
George Luis de Camargo, de 39 anos, uma das vítimas da Covid-19, era casado, tinha dois filhos: um adolescente de 15 anos e uma bebê de quatro meses. Trabalhava como socorrista no Samu de Sorocaba (SP).
“Estamos totalmente despedaçados”, disse Kátia Camargo após perder o irmão George e também a mãe pela mesma doença.
A mãe, Dosilia Rosa de Camargo, morreu no início de dezembro. “Logo depois que minha mãe faleceu, meus irmãos começaram a ter sintomas. O André foi entubado no Hospital Samaritano no dia 19 de dezembro. O George foi internado no Hospital Evangélico, mas não resistiu”, conta Kátia. André recebeu alta no mesmo dia que o irmão morreu.
Ex-policial, presidente do clube de coração e pai de 4 filhos e com 4 netos. José Barros perdeu aos 70 anos a batalha para a Covid-19 na madrugada do dia 2 de janeiro em Macapá. Presidente do Ypiranga Clube, atual campeão amapaense de futebol vivia a expectativa de ver o time disputar a Copa do Brasil depois de 2 anos.
“Dos meus 39 anos, vivi todos colados no meu pai. Para onde ele ia, tudo a gente ia fazer juntos. Éramos unha e carne. Falo sobre ele naturalmente, porque a ficha ainda não caiu. Acho que ele ainda está no hospital, internado e que ele vai aparecer em casa”, contou o filho dele, Junior Barros.
A última lembrança ao lado do pai, ficou eternizada numa foto marcante, mas dolorida para Júnior. Ele, usando uma camisa do Ypiranga com o nome de Barros ao lado do caixão antes do sepultamento.
Com 200 mil óbitos e casos frequentes de aglomerações, quem perdeu parentes para a Covid-19 se choca com imagens de festas e desrespeito a regras, como uso de máscaras.
“É irresponsabilidade, atitude desumana. É egoísmo dessas pessoas que só estão pensando em si”, diz Francisco Ducivaldo Azevedo. Em 17 de junho, ele perdeu a mãe, Dulçanira Azevedo, de 69 anos. “Entendo que as pessoas precisam desopilar na pandemia, mas o momento requer paciência e prudência”, afirma.
A cantora e viúva do compositor Evaldo Gouveia, Liduína Lessa, também percebe os flagrantes de aglomeração como um desrespeito às vidas tomadas pela doença. Seu marido, referência da música popular brasileira, faleceu com a Covid-19 aos 91 anos, em 29 de maio, em Fortaleza.
“É muita irresponsabilidade. Acho muita falta de consciência do povo que se aglomera. É uma tristeza muito grande ver que meu esposo teve esse problema, porque muita gente pensa que é brincadeira, não se cuida.”
Evaldo Gouveia se despediu deixando a mulher e dois filhos, Marcio e Marcelo Gouveia. “O Brasil teve uma perda muito grande na cultura, até hoje a gente não se conforma não”, diz.
Fonte: G1