Após a escala de novas infecções — iniciada em novembro e cujo pico foi registrado em março deste ano — três das cinco regiões de saúde do Ceará apresentam tendência de queda no índice de transmissão. Fortaleza, Cariri e Sobral estão com taxa de contágio abaixo de 1, o que significa que cada grupo de 100 infectados transmite o novo coronavírus para menos de 100.
Fortaleza e Cariri têm os menores índices, ambos com 0,95. Ou seja, 100 infectados podem transmitir o vírus para outras 95 pessoas. Sobral apresenta índice de 0,97. Já as regiões do Sertão Central (1,07) e Litoral Leste/Jaguaribe (1,11) são as duas únicas que apresentam taxa acima de 1.
Os números foram apresentados pelo Comitê Estadual de Enfrentamento à Pandemia do Coronavírus à Secretaria da Saúde (Sesa) do Estado. O Comitê é composto por quatro cientistas-chefes, sendo 3 professores da UFC e um da Universidade de Fortaleza (Unifor). A análise semanal do grupo baliza as decisões governamentais quanto as medidas sanitárias impostas no decreto.
Tendência de queda
O cientista-chefe do Comitê e professor do departamento de Física da Universidade Federal do Ceará (UFC), José Soares de Andrade Júnior, explica que a modelagem epidemiológica sugere uma tendência de queda em todo o Estado, mesmo nas duas regiões cujo índice está acima de 1.
Segundo o especialista, Sertão Central e Litoral Leste/Jaguaribe estão muito próximos da taxa que sinaliza a estabilização de contágio. “Levando-se em consideração a margem de erro associada, podemos apontar que elas [as regiões] estão bem próximo a 1”, pontua José Soares.
Nas cinco regiões a taxa tem apresentado sucessíveis reduções. Fortaleza, por exemplo, estava com taxa 1,12 entre 6 e 26 de março. No período seguinte caiu para 1,08 e, agora, declinou para 0,95. A região de Sobral obteve a maior queda, saindo de 1,22 para 0,97.
Sertão Central e Litoral Leste/Jaguaribe que estão com taxa acima de 1, também apresentam tendência de queda. “Ainda vamos analisar os números ao longo desta semana, mas a projeção é de manutenção nessa tendência de queda em todo o Ceará”, destacou o cientista.
Importância do lockdown
Na avaliação do professor da UFC, as medidas de isolamento social restritivo — iniciadas em todo o Estado no dia 11 de março, com exceção de Fortaleza que teve o lockdown iniciado no dia 5 daquele mesmo mês — tiveram fundamental importância para redução nos casos.
“Começamos a entrar no ponto de estabilidade e temos tendência de decrescimento. Muito provavelmente, na minha avaliação, esses índices devem-se ao isolamento”.
A análise do cientista é corroborada pelo estudo publicado na revista Science, umas das mais renomadas no mundo. O artigo descreveu o Ceará como um estado ‘resiliente’ na contenção da doença. Segundo o estudo, ‘as ações locais foram bem-sucedidas”.
Média Móvel
Nas cinco regiões de saúde, a média móvel de novos casos apresentou substancial redução neste mês de abril. No Sertão Central, caiu de 186,14 no dia 9 deste mês, para 35,14 (18.04). No Litoral Leste/Jaguaribe, a redução, no mesmo intervalo, foi de 276,14 para 35.
Na região de Sobral, a média móvel que em 10 de abril era de 439,57, regrediu para 88,85, conforme números de ontem (18). Já a média móvel do Cariri, em igual intervalo, passou de 328,71 para 52,85.
A região de saúde de Fortaleza apresentou a maior redução em números absolutos. No dia 9 de abril a média móvel era de 1.939,14. Ontem, a média caiu para 573,71.
Alerta
Mesmo com essa projeção de queda, Soares ressalta que o cenário ainda está próximo da criticidade. O estudo mostra que apesar de existir uma estabilidade no contágio, “essa estabilidade ainda está montada em um número muito alto de casos”.
“Embora tenhamos essa tendência, é preciso manter o estado de alerta. Os números ainda são muito altos. Fortaleza, por exemplo, tinha na semana passada média de mil casos por dia. Com a taxa em 0,95, são 950 pessoas potencialmente infectadas. É um número que ainda preocupa.”
José Soares de Andrade Júnior, Professor da UFC
Diante deste número ainda elevado, Soares externa preocupação com a sobrecarga do sistema de saúde. Apesar do incremento de leitos de UTI e enfermaria, que já somam mais de 5 mil em todo o Estado, a demanda assistencial segue elevada. “Este é o grande gargalo. Manter o sistema de saúde acessível é o grande desafio e preocupação”, pondera.
O cientista reforça ainda que, como agravante a estes números, esta a nova cepa. “As características da variante do vírus desta segunda onda são diferentes. Os pacientes evoluem muito rapidamente e os óbitos não estão mais massificados aos idosos, como era na primeira onda”.
Taxa de ocupação
A preocupação frente a alta demanda por atendimento hospitalar pode ser mensurada através de números. De acordo com o IntegraSus, plataforma oficial da Secretaria da Saúde (Sesa) do Ceará, a taxa de ocupação dos leitos de UTI do Estado atualmente é de 95,65% e, de enfermaria, 80,02%. Os números da UTI Adulto são ainda mais expressivos. A taxa geral está em 97,61%.
Nas duas regiões em que a taxa de contágio está acima de 1, a ocupação dos leitos é preocupante. O Sertão Central tem 100% dos leitos de UTI ocupados. No Litoral Leste/Jaguaribe, não há leitos de UTI e a taxa de ocupação da enfermaria está em 62,5%.
Diante de números tão altos e com muitos hospitais sem leitos disponíveis, quase 900 pessoas aguardam na fila à espera de leitos. Deste total, 520 esperam por UTIs.
Importância do estudo
A capacidade de traçar parâmetros e fazer previsões acerca do comportamento doença possibilita aos cientistas avaliar os planos de isolamento e, assim, subsidiar o governo às decisões tomadas quanto as medidas sanitárias.
Segundo Soares, o Comitê do Ceará emprega nos estudos o modelo SEIIR, um dos mais utilizados para modelar a pandemia da Covid-19.
O modelo considera classes distintas, que englobam os Suscetíveis (S), que são aqueles não infectados, mas suscetíveis a uma possível infecção; os Expostos (E), àqueles que foram expostos à infecção, porém o vírus está em um estado de incubação e a pessoa ainda não transmite; os Infectados (I), que são as pessoas em que o vírus já se manifestou e que podem transmitir a infecção; e os Removidos (R), àqueles que foram infectados e, em seguida, removidos após um período, seja devido à imunização ou devido à morte.
Por André Costa
Fonte: Diário do Nordeste