Tenho andado por aí, caminhando entre ruas e memórias, perdido num vai e vem de passos e pensamentos. Cada esquina traz um cheiro diferente, uma cor inesperada, um som que me lembra alguém ou algum tempo que já passou. Andar é quase uma viagem no tempo, onde o presente se mistura com fragmentos do que fomos e do que ainda podemos ser.
Às vezes, sinto que ando sem destino, só pelo prazer de deixar o corpo se mover e a mente vagar. Outras vezes, procuro um lugar — uma livraria escondida, um café com aroma de infância, uma praça onde as árvores contam histórias em silêncio. Mas o mais curioso é que, mesmo sem procurar, sempre encontro algo que me toca, um instante que fica guardado e faz sentido.
Andar também me trouxe encontros. Gente que cruza o caminho, troca um olhar ou um sorriso e segue. Pequenos gestos que rompem a rotina e aquecem o peito. Já percebi que esses encontros, mesmo os mais breves, deixam marcas tão fortes quanto as grandes histórias que carregamos na bagagem.
Mas também andei por dentro de mim. Revirei pensamentos antigos, sentimentos esquecidos, dúvidas que às vezes aparecem sem avisar. Andar por aí virou andar por dentro — um movimento interno, silencioso, onde confronto medos e celebro pequenas vitórias. É um exercício de coragem e entrega.
Em meio a esses passos, descobri que andar é resistir. Resistir ao silêncio que tenta calar, ao medo que quer prender, à pressa que rouba o tempo. Andar é um ato de liberdade, mesmo quando a alma parece cansada. É um modo de afirmar que ainda estamos aqui, que ainda queremos sentir, buscar, viver.
Tenho andado por aí, mas também tenho aprendido a parar. Parar para olhar o céu, para ouvir a respiração do mundo, para sentir o vento que atravessa a pele e lembra que estamos vivos. Nesses momentos, a caminhada ganha outra dimensão, mais leve, mais profunda.
E se andar é uma metáfora para a vida, então que eu possa sempre seguir em frente, mesmo que devagar, mesmo que incerto. Que cada passo carregue um pouco de esperança, um pouco de coragem, e a certeza de que o caminho vale mais do que o destino.
Assim, continuo a andar por aí, com os olhos atentos e o coração aberto, disposto a descobrir, a me perder e a me encontrar, numa viagem sem mapas, onde o único guia é o desejo de sentir o mundo pulsando sob meus pés.
Por Mirta Lourenço. Médica, professora, cronista e poetisa
*Este artigo é de inteira responsabilidade da autora, e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri










