A crise econômica provocada pela pandemia do coronavírus vem redesenhando um novo cenário e colocando em evidência a necessidade de defesa do Sistema Nacional de Cultura, como principal política pública da cultura no pais. O Sistema é fruto de um histórico acúmulo de debates e embates para construção de uma arquitetura jurídica capaz de pactuar entre os entes federados, uma teia para possibilitar o repasse de recursos fundo a fundo, garantir mecanismos de participação social e planejamento da política pública no país, a partir da sua dimensão micro e macro. No processo de aprovação da Lei de Emergencial Cultural Aldir Blanc, essa discussão vem sendo retomada.
Aprovado em 2012, a Emenda Constitucional nº 71/2012 que dispõe sobre a criação do Sistema Nacional de Cultura, é algo que precisará de muita mobilização e articulação para que se consolide e entre na trivialidade das políticas públicas da cultura nos estados e munícipios.
Neste processo de acumulação de forças políticas, tecidas por gestores, parlamentares, agentes culturais, coletivos partidários, organizações da sociedade civil, pontos de cultura, conselhos e fóruns de políticas culturais, na formulação e aprovação da Lei Aldir Blanc, com a omissão da Secretaria Especial da Cultura desde o princípio, vem se criando uma espécie de sistema nacional de cultura paralelo e legalmente constituído.
Esse sistema paralelo e legalmente constituído, pelo menos com caráter temporário, gestado neste período da Lei Aldir Blanc, toma uma dimensão política e pedagógica importante, a partir do próprio teor da lei emergencial, caracterizada pela urgência, abrangência, flexibilidade e a sua dimensão de proteção social que aponta um viés transversal e intersetorial da cultura.
Esse aspecto, não é por acaso e nem inovador, mas faz parte da retomada do discurso que começou a ganhar forma em 2003, com o primeiro ano do Governo Lula, onde se começou a construir uma nova perspectiva de política pública para cultura no país, baseada no olhar antropológico e transversal da cultura, na descentralização e desenvolvimento econômico e na democratização da diversidade estética, artística, cultural e tecnológica do povo brasileiro. Dentro desse contexto teve destaque o Cultura Viva que ficou conhecido a partir dos Pontos de Cultura, a maior e mais revolucionária política de estado de base comunitária experienciada no Brasil e que serviu de inspiração para movimentos e políticas públicas para a cultura, em cerca de 17 países da América Latina.
O que representa a aprovação da Lei Aldir Blanc e qual a sua relação com o Sistema Nacional de Cultura? Antes que tudo a Lei de Emergência provoca a funcionalidade do Sistema Nacional de Cultura, com repasse de recursos fundo a fundo. Os 5.570 municípios brasileiros serão beneficiados com recursos federais, ao todo serão três bilhões de reais que circularão nos estados e municípios.
Essa é a primeira vez que acontecerá o repasse de recursos conforme prevê o Sistema Nacional de Cultura. Esse volume de recursos que municípios e estados receberão para serem aplicados neste período pandêmico é superior as dotações orçamentárias de cada município e estado.
É preciso ficar atento a aplicação dos recursos baseado no que prevê a Lei Aldir Blanc. Agilidade, amplitude e legalidade devem caminhar neste momento com simplificação, desburocratização e democratização.
A Lei Aldir Blanc está servindo de antessala para reoxigenar a defesa do Cultura Viva e do Sistema Nacional de Cultura, como instrumentos de desenvolvimento econômico e social de caráter transversal e com musculatura de política de estado.
Por Alexandre Lucas. Pedagogo, integrante do Coletivo Camaradas e presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais do Crato/CE
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri