O isolamento físico como ação necessária e eficaz para a redução dos impactos da pandemia do Coronavírus gera uma nova readequação corpórea e espacial que repercute diretamente em alterações relacionais e emocionais. Sensação de medo, preocupação econômica, ansiedade, tristeza, pânico, depressão e stress tendem a ampliar na atual conjuntura. No campo da cultura, as redes de afetos têm sido medidas paliativas de enfrentamento e de fortalecimento de vínculos importantes para saúde mental e a reinvenção política.
As redes de afetos se caracterizam como espaços de autoproteção de grupos e segmentos com o intuito de fortalecimento emocional, diante de situações de crises e fragilidades, individuais e coletivas.
Nesta nova relação corpórea e espacial, a dimensão da saúde mental e a situação política do país se entrelaçam. Os diversos segmentos da economia são afetados, a cultura não fica de fora, os trabalhadores e trabalhadoras da área artística e cultural sofrem economicamente e emocionalmente com a falta de espaços para circular e comercializar seus trabalhos, o que agrava também, a manutenção de equipamentos culturais independentes e de base comunitária.
Enquanto precisamos nos cuidar individualmente e coletivamente com ações preventivas orientadas por profissionais e órgãos nacionais e internacionais da saúde, o isolamento físico é a principal recomendação para reduzir os impactos do vírus e ao mesmo tempo, isso possibilita uma aproximação afetiva, a partir da realidade virtual.
A virtualidade se tornou ponto de encontro e de reinvenção das artes, dos afetos e da disputa das narrativas políticas, é o principal meio de comunicação, difusão e de diálogo diante da atual circunstância que se encontra o país e o mundo.
Nesse novo contexto, as redes de afetos da cultura vem se fortalecendo, a partir de iniciativas de ocupação dos espaços virtuais com programações, articulação em rede, diálogos (ou tentativas de diálogos) com gestores públicos para atuarem em políticas emergenciais para o setor.
Essa situação redimensiona o poder político e simbólico dos segmentos das artes e das culturas. O simples fato de compartilhamentos de conteúdos dos grupos e dos sujeitos, impulsiona a construção de narrativas, elevação da autoestima, sentimento de acolhimento para caminhar junto, potencialização de poéticas, consolidação de trabalhos e capilaridade política.
Neste momento de conturbação econômica, política, emocional e de crise na saúde, as redes de afeto são imprescindíveis para um cuidado coletivo e de norteamento político. Não podemos descuidar do nosso processo de organização e de diálogos para além do nossos campo de articulação mais imediato, que que são as trabalhadoras e trabalhadores da cultura.
O governo Bolsonaro tem dados demonstrações inequívocas do seu compromisso com as elites econômicas e de seu descaso com a saúde pública, inclusive sendo um potencial disseminador do vírus, ao promover aglomerações e incitar o descumprimento do isolamento físico. Aliado a isso, vem promovendo um sucateamento nas políticas públicas para a cultura no país, que vai desde a extinção do Ministério da Cultura a paralisação do Sistema Nacional de Cultura e do Cultura Viva, principais marcos legais da política pública para a cultura no país na últimas décadas.
Vamos cuidar da nossa saúde emocional e da luta política. Constituir nossas redes de afetos e nossos comitês populares de cultura, são urgentes, para enfrentamento com outros segmentos da sociedade, partidos políticos e movimentos sociais, o obscurantismo liderado pelo bolsonarismo que promove o ódio, a retirada de direitos e desconstrói a democracia.
Por Alexandre Lucas. Pedagogo, integrante do Coletivo Camaradas e presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais do Crato/CE
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri