Não existe inocência ultrajada no momento político brasileiro, de forma nenhuma. A permissividade não anda ao nosso lado, ela é o nosso pertencimento ufanista. Não adianta ficar chocado com a lama escorrendo no canto da boca enquanto as palavras são expelidas em defesa da democracia, sob uma pretensa proteção divina. Isso foi permitido. O nazismo que se revela no clã Bolsonaro foi potencializado e replicado. A seboseira produzida na vida pública brasileira, sempre foi a nossa realidade, nossa especialidade maior. Não existe novidade pesarosa. Mesmo sob a negativa dos inocentes, milhões de brasileiros andam como o presidente, sentam como o presidente, cospem como o presidente, coçam as partes baixas como ele, e acreditam no Triunfo da Vontade.
Bolsonaro nunca enganou ninguém, sempre foi xucro, sempre foi desclassificado, mas sempre foi um trapalhão nazista, não menos do que isso. Muitas famílias brasileiras permitiram que ele sentasse na sala de jantar e pedisse, entre uma garfada e outra, as bênçãos da fé, para poder trucidar brasileiros, exterminar direitos, e jogar o país numa guerra civil, estimulando a violência e o preconceito. Fez da mentira a sua bíblia e milhões de brasileiros recitam seus versículos e cultuam seus profetas sabujos. A sua imunidade sentimental diante da morte de milhares de brasileiros pela Covid-19 é permitida, criminosamente permitida por milhões de brasileiros. Suas bravatas caricaturais sobre cloroquina, sobre salvar a economia, sob o pretexto ignorante de que sempre morreu gente, são permitidas e adocicadas por milhares e milhares de famílias brasileiras tementes a Deus.
Mais do que isso, há uma chancela para ele entregar o país aos predadores internacionais, há uma aquiescência para ele exterminar os recursos naturais da nação e eliminar o povo, uma vez que a boiada está passando e uma granada já foi colocada no bolso do inimigo. A sombra do nazismo é maior do que a meia dúzia de manifestantes dominicais que pedem o fechamento do Congresso, a queima do Supremo Tribunal e rogam pelo AI-5, em defesa da democracia. Ela agora paira sobre as forças armadas brasileiras, que nunca conseguiram se limpar nem da guerra do Paraguai, quanto mais da Ditadura, e agora enfrentam a maior saia justa da história militar brasileira. São quase 3 mil militares das forças armadas ocupando cargos no governo bolsolavista. A pedido do Estadão, o Ministério da Defesa fez um levantamento da atuação da Marinha, da Aeronáutica e do Exército, no governo que agora se revela nazista, pelos simpatizantes, pala prole e por ele mesmo. A Marinha tem 680, a FAB tem 622 e o Exército tem 1.595. Não é um governo, é um imenso e inconcebível quartel.
A permissividade brasileira é também beligerante. Os militares estão assumindo cargos sem competência para isso, mas ajudam a afundar o país cumprindo a missão. Missão dada, parceiro, é missão cumprida. Além de obrigados a mentir em depoimentos e defender o indefensável, os oficiais que ocupam os principais cargos perderam a credibilidade diante da nação quando permitiram os ataques à democracia, à Constituição e ao Povo brasileiro, feitos pelo presidente e seu bando, na histórica reunião do caos. A omissão permissiva durante esse famigerado episódio ministerial revela o apego ao cargo e aos benefícios do poder. Também perderam a credibilidade do mundo quando passaram a permitir a devastação da floresta amazônica, que era a maior bandeira de proteção das forças armadas brasileiras, inclusive por uma questão de segurança nacional. Permitir a venda do orçamento brasileiro em negociatas com o centrão, não é necessariamente a ação mais digna dos militares no poder. Mas, como diz o vice General Mourão, é possível tirar o melhor de bandidos, é só bater continência.
Brava gente brasileira, o lábaro que ostentas estrelado é agora supremacista americana ou ucraniana nazista. As forças armadas brasileiras permitem que o presidente bata continência para ambas. Enquanto a bandeira brasileira é transformada na camisa da seleção, os patriotas permitem que o escroque nazista, destilado no gabinete do ódio e iluminado pelas tochas Ku Klux Klan da milícia palaciana, protagonize livremente a fomentação de uma guerra civil, como a única forma de esconder o fracasso retumbante do governo militarizado bolsolavista.
Apesar da história política brasileira já ser atopetada de fracassos intencionais, com derrotas espetaculares do povo, bem como sua mortandade prematura, é permitido mais um capítulo. A História está escrevendo as narrativas dos eleitores, das forças armadas, do clã Bolsonaro e dos omissos, essencialmente coniventes. O nazismo já entrou para a História de forma muito peculiar: a face mais suja da humanidade.
Por Marcos Leonel – Escritor e cidadão do mundo
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri