Essa é a história de um menino. Não é igual à história daquele menino que aos quatro anos de idade foi morar com o avô porque seu pai dera fim a vida da mãe. Embora ele também sofrera dor análoga. Também não é a história de um certo menino que tinha o poder de mudar as coisas tornando-as vegetais com um simples tocar de dedo, era. Mas o garoto desta história que lhes conto, também tinha um poder. Não era um simples toque de dedo, era um toque do olhar.
Ainda em tenra idade, já olhava as coisas com seu olhar do bem. Onde sua mãe, que ainda era viva, via trombadinhas, ele via crianças e queria brincar com elas. Essas chamavam-no Pequeno, e embora a realidade distinta, a sua bem abastada e a delas necessitada, entendiam-se nos brinquedos, e pequeno não era mais o menino rico, mas um deles, a infância os envolvia. Foi quando da tragédia que Pequeno entendeu tudo. foi em meio ao choro e a perda que o menino desta história potencializou seu dom, foram eles, “os trombadinhas” que o acolheram em sua dor e o ajudaram a entende-la. Eles eram mestres nisso.
Quando pequeno foi levado à casa de seu avô, no interior, deparou-se lá com os cabinhas. Eles o seguiriam até o infinito se pudessem. Mesmo sendo neto do patrão, do homem mais rico daquela cidade, não foi com os filhos dos bajuladores que pequeno se enturmou, ao contrário, os filhos dos operários, das empregadas da grande casa, as crianças do bairro alto, eram elas a quem Pequeno se apegava em amizade.
Pequeno tinha propensão aos excluídos. Se andava na rua, comovia-se com os mendigos. Sabia o nome dos flanelinhas e a turma que vendia picolés ou engraxavam nas praças o cumprimentavam como a um deles. No colégio ele não se sentia bem com os de sua classe. Sua amizade se restringia a um casal de irmãos gêmeos, bolsistas, filhos do porteiro. Era com eles que Pequeno passava a maior parte do tempo.
Pequeno contava apenas 7 anos quando desapareceu. Não se sabe o que houve. Ninguém sabe. Mas de vez em quando ele ressurge, normalmente nas crianças que descorrompidas deste mundo. Às vezes em um sorriso da menina branca dentro do carro para o menininho negro que atravessa a rua puxado pela mãe. Outras vezes naquele bando de cabinhos grudados jogando futebol de poeira no arrebol. Pequeno está por toda parte, sempre infante. Sempre criança. Mas é preciso ter o poder do olhar do bem para enxergar. É preciso saber olhar.
Por Francinaldo Dias. Professor, cronista, flamenguista, contador de “causos” e poeta
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri










