Em verdade Trump nunca levou a sério essa história de governar dois países. Ele, sendo Donald, tinha uma vaga noção da multiplicação dos Patetas. Vez por outra sentia um incômodo úmido por via de narrativas bizarras em sua enrugada zona escrotal. Mas nada que pudesse fundar implicações burocráticas por dois espólios nazistas. A duplicação da governança ficou restrita ao fato, nunca se consolidou ao direito.
No entanto, o seu espírito de porco se espalhou pelas duas repúblicas em largas fatias de bacon, escorrendo em babas decadentes no canto das bocas dos proto-humanos que se empanturram de negacionismo, mentiras escatológicas, desonestidade, racismo, ódio, terraplanismo e uma mistura altamente tóxica de conservadorismo religioso miliciano com o oportunismo criminoso ultraliberal.
Nem Borges e nem Saramago imaginariam que a complexidade da duplicação tivesse o lastro existencial da ficção e da realidade ao mesmo tempo. Muito menos que essa duplicidade fosse pautada no maucaratismo desavergonhado do coletivo de duas nações. Enquanto Trump sobe em sua prepotência bandida de se apoderar do Estado como se ele fosse o seu vaso sanitário, sob seus pés está Bolsonaro: o capacho deitado na subserviência e no entreguismo, que delira em ter como amigo imaginário, um dos maiores criminosos da história americana.
Chomsky, para o gado que tem leitura parca e enxerga pouco além da gordura fixada na tela, não só tem documentado como tem explicado fartamente como funciona os bastidores dessa trajetória facínora e espalhafatosamente canalha. A denúncia de Chomsky recai sobre os vampiros ultraliberais, como também sobre a venalidade social dos figurões da justiça, das forças armadas, dos grandes conglomerados financeiros da imprensa, das autoridades religiosas e da disposição arcaica do americano comum: idiota branco e ignorante, que nunca pensou em se livrar da carga de preconceitos letais deixada pelo colonizador europeu.
Trump foi eleito pela não democracia americana, a maioria do povo não queria. Em sua campanha Trump usou os Think Tanks como usina de fake News, fazendo com que a mentira fosse a envergadura moral do patriotismo americano. Inventou verdades e subverteu os direitos humanos sem nenhum escrúpulo. Para dar sustentabilidade ao seu nazifascismo ele deu carta branca aos grupos racistas armados e às gangues do conservadorismo evangélico, garantindo o direito de explorar o fiel até o último centavo, sem a intervenção da justiça ou do fisco.
Sua postura sem postura estimulou cegamente toda sorte de violência, ódio e perseguições. Sofreram em suas torturas ideológicas e físicas: imigrantes, pretos, pardos, mulheres, pobres, cientistas, intelectuais, jornalistas, progressistas, ambientalistas, professores, estudantes, homossexuais e qualquer um que tenha certeza que a terra é redonda e que a educação é a fórmula para entender o mecanismo que transforma o ser humano em gado. Uma manobra que garante o testemunho e a defesa de idiotas influentes, bem como de imbecis que são apenas idiotas.
A invenção delirante da ameaça comunista serve como cortina de fumaça para desviar a atenção do compromisso com os donos do capital, inclusive ele, em permitir toda ação predadora do meio ambiente, sem responsabilizações. Por trás dessa nuvem cinza está a precarização do trabalho, a perca dos direitos trabalhistas, o desmonte da seguridade social e a extinção total da assistência médica, sucateando o plano de saúde implementado por Barack Obama. Esse acordo ultraliberal também inclui a continuidade do terrorismo americano com outras economias e Estados. O Brasil aparece aí como o serviçal que apanha depois de alguma ousadia.
O presidente brasileiro bateu continência para a bandeira americana com a veemência submissa de um vira-lata que abana a cauda na esperança de uma migalha afetiva. Mas não há inocência nesse complexo de inferioridade. Ele copiou todas as categorias de patifarias do meliante americano e colocou em prática. Além disso, houve aqui uma isquemia cerebral adicionada à raquítica democracia brasileira: esse é o único país do mundo em que o presidente é governado por um outro presidente estrangeiro, sendo que as questões domésticas ficam ao encargo dos filhos. A governança brazuca é tão doméstica que o presidente dorme nas dependências da empregada.
A denúncia do Ministério Público do Rio de Janeiro contra Flávio Bolsonaro por organização criminosa, peculato e lavagem de dinheiro, foi aditivada pela derrota de Trump. Isso tem abalado profundamente o bolsonarismo patético. Os candidatos apoiados por Bolsonaro estão derretendo feito gelo no deserto. Os bolsonaristas estão negando o bolsonarismo, mas o fascismo não deixa apagar as evidências. Atônito com a derrocada ele volta a exercer o seu papel de paspalho e novamente, de forma criminosa, minimiza a pandemia e agride o povo brasileiro com ataque homofóbico: “Tem que deixar de ser um país de maricas”. Em seu delirium tremens causado pela abstinência perene de neurônios, ele respondeu a Biden sobre a destruição da Amazônia, prometendo guerra aos Estados Unidos: “Quando acabar a saliva tem pólvora”. Imagine o estado psicológico desse elemento quando ele tiver que comunicar finalmente a Trump, que ele também perdeu as eleições aqui.
Por Marcos Leonel – Escritor e cidadão do mundo
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri