No raiar de um dia comum, onde o sol pintava o céu com tons dourados e uma brisa suave acariciava as folhas das árvores, decidi mergulhar nas reflexões que a vida, tantas vezes, nos impõe. O tema que se destacava como uma sombra sombria era a ingratidão, esse defeito que tece teias escuras nos corações humanos.
É curioso como a ingratidão, tão sutil em seu início, pode se transformar no pior dos defeitos, um câncer silencioso que corrói os alicerces da convivência humana. Em um mundo onde o individualismo muitas vezes supera a empatia, a ingratidão surge como uma epidemia emocional.
Lembro-me de um episódio que presenciei certa vez, numa tarde ensolarada de domingo. Uma senhora idosa, encurvada pelo peso dos anos, dedicou décadas de sua vida a cuidar de um jardim com flores coloridas que alegravam a vizinhança. Um gesto simples, mas cheio de significado. No entanto, ao mudar-se para um lar de idosos, esperava ao menos um agradecimento, uma visita ocasional. No entanto, sua contribuição para a beleza do bairro foi esquecida, como se as flores que ela plantou não passassem de efêmeras sombras no passado.
A ingratidão parece florescer em terrenos férteis de egoísmo e indiferença. Muitas vezes, esquecemos de agradecer não apenas às grandes gestos, mas também aos pequenos atos que tornam a jornada humana menos árida. A gratidão, afinal, é a cola que une os fragmentos da sociedade.
Mas como combater esse mal que se esconde nas entrelinhas da vida cotidiana? Talvez a resposta esteja em cultivar a gratidão como um hábito. Olhar para o mundo ao nosso redor e reconhecer as mãos invisíveis que nos auxiliam a cada passo. Agradecer não apenas pelas vitórias, mas também pelos tropeços que nos ensinam a levantar.
No entanto, é crucial compreender que a ingratidão muitas vezes é um reflexo de feridas profundas que habitam o íntimo humano. É como se o ingrato fosse um jardim ressequido pela falta de amor e compreensão. Assim, a compaixão torna-se a água que pode transformar esse solo árido em um jardim florido.
Num mundo onde a ingratidão parece proliferar, cada ato de reconhecimento, por menor que seja, torna-se uma luz a iluminar o caminho da empatia. Afinal, talvez a cura para o pior defeito do ser humano resida na capacidade de ver a beleza nos gestos simples e, acima de tudo, de agradecer por cada raio de sol que ilumina nosso caminho escuro.
Por Mirta Lourenço. Médica, professora, cronista e poetisa
*Este texto é de inteira responsabilidade da autora, e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri