Havia mais de três anos que eu e Tatiane Mendes não mantínhamos contato. É natural que as pessoas se reservem um tempo para si, novos ares, velhas lutas que nos tomam a vida, no meu caso, novo casamento, mais um filho, enfim, fatos que vão preenchendo nossa existência e os velhos amigos de outras épocas, estando garantidos em nossa história, vão ficando ali, guardados em lembranças adormecidas de um tempo outro. Mas o telefone tocou, no outro lado, era Tatiane que buscava o contato de um outro amigo em comum.
Conversamos um pouco, indagamos sobre as novidades, tudo muito rápido. Passei o contato e naturalmente não estranhei aquela busca. Só me dei conta de que algo não estava normal quando depois de quinze dias, ela volta a entrar em contato. Perguntou-me se o Leandro não tinha entrado em contato, porque naquele número ninguém havia atendido. Foi aí que comecei a pensar que realmente já havia quatro meses que ele não entrava em contato. O que parecia normal, já que havia acontecido outras vezes. Mas não depois do nascimento de meu filho caçula, o Noah, pelo qual o Leandro e sua esposa Bruna demonstravam muito carinho. Semanalmente eu lhes enviava foto do garoto, ora pedida por ela, ora porque meio que me sentia grato, porque mesmo distantes, acompanhavam o desenvolvimento do menino.
Em julho, estivemos juntos na Expocrato. Eles vieram, segundo Leandro, visitar o Noah e depois conhecer o festival. Encontramo-nos, tomamos umas cervejas, colocamos os papos em dia e ele me falou com tanta satisfação de que haviam comprado o apartamento que tanto sonharam. Fiquei bastante feliz com a notícia e seus olhos brilhavam. Já tarde da noite, despedimo-nos, dissemo-nos até logo. Eu não sabia que não mais o veria. Eu não sabia que seria um adeus.
Pedi a minha esposa para verificar nas redes sociais. O resultado da pesquisa me arrebatou a uma crise de choro, seguido de uma sensação de impotência. A vida é um sopro, um fio frágil que pode se romper a qualquer momento. Leandro havia partido. Não houve tempo para lamentações nem despedidas. Talvez no dia que aconteceu eu estivesse absorto pela vida, envolvido pela vida, o que se seguiu até o dia em que Tatiane ligou pela segunda vez. A notícia da tragédia que acontecera há quatro meses provocou em mim uma espécie de transe, uma busca por entendimento, uma constante reflexão sobre a vida. É complicado aceitar essa sensação de que alguém que o amava precisou de uma palavra que não pudemos dá, simplesmente porque não sabíamos. É estranho essa sensação de luto retardado.
Nesta crônica de hoje, esvaziada de poesia, creio em que me será permitido expressar essa tristeza, e também dizer que guardarei comigo uma lembrança boa; não me proibirei confessar que sentirei saudades; nem me envergonharei de dizer que a separação quando não a sabemos nos traz um inexplicável sentimento de engano, de que a pessoa ainda está lá e isto nos dá sossego; ao mesmo tempo que um inexplicável remorso; e um oculto despeito. E como uma estrela que já sabemos morta mas contínua brilhando, assim carregarei a memória de meu amigo Leandro.
Por Francinaldo Dias. Professor, cronista, contador de “causos” e poeta
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri