O setor cultural brasileiro foi perseguido, no último governo, como os cristãos no Coliseu. De repente, a Lei Rouanet, de incentivo à Cultura, viu-se demonizada pela ultradireita brasileira, como se tratasse de um instrumento de corrupção fácil, pior que o orçamento secreto. Os artistas viram-se acusados de malandros, desonestos, maconheiros, desocupados, parasitas das verbas públicas. A razão de tamanha cruzada é fácil de compreender. Os artistas fazem parte da classe pensante do país, aquela que consegue ver adiante da notícia veiculada pela TV, é antifascista por origem, insubmissa e inacorrentável. Num mundo extremamente contábil, ávido do lucro imediato, a Arte surge como um estorvo, uma inutilidade. Para que diabos serve um poema, uma música, uma tela, um filme? Não dá para vender suas ações, fazer escambo com eles na próxima esquina ou na casa de câmbio! Ao status quo nem interessa a outra realidade do deus Mercado: Em 2018, a Cultura no Brasil movimentou 2,64% do PIB, com um crescimento de mais de 70% na última década. Em 2020 o setor cultural empregava, segundo o IBGE, mais de 5,5 milhões de pessoas, quase 6% da população brasileira. O medo do setor cultural é maior que seu potencial econômico. Ele consegue ver o rei nu e, pior, com suas joias das arábias reluzindo ao sol!
Agora, que a roda do tempo deu cavalo de pau, paira uma pergunta. Em quanto o estado deve incentivar a Cultura? Se pouco, pode fazer o segmento morrer por inanição, se muito falam do risco de viciar os artistas e deixá-los preguiçosos e pouco criativos. Interessante é que não existe essa aflição quando se trata da Indústria, do Comércio e do Agronegócio. Aí, quanto mais, melhor! A sociedade cobre-se de pruridos quando se incentivam os mestres da cultura popular, com um mísero salário mínimo. Gritam de lá: – Vai viciar o cidadão! Se der dinheiro para o Reisado, o Coco, o Maneiro Pau, vocês acabam com os brincantes! Já para os cantores de “Forró Isopor” e os “Breganejos”: quanto mais, melhor! É como se as manifestações populares de tradição, como ostras, necessitassem da areia do sofrimento e da fome para produzir suas pérolas. Já para produzir esterco cultural, que sai como uma diarreia, a verba funciona como uma espécie de laxante.
Leis de Incentivo à Cultura são uma necessidade não apenas identitária, mas também econômica. O retorno do investimento vem não só pela educação sensitiva e de pertencimento do povo, mas também regressa com impostos, com emprego, com turismo. É possível lapidar joias aqui, não precisa virem fantasiadas como presentes das arábias.
Por J. Flávio Vieira, médico e escritor. Membro do Instituto Cultural do Cariri (ICC)
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