Ninguém, em sã consciência, nem os mais emperdernidos radicais, seria capaz de defenestrar escritores como Dostoievsky e Tolstoi dos mais altos pedestais da literatura universal. E somam-se outros russos de envergadura inigualável com Gogol, Tchecov, Maiakovsky que, de há muito, estenderam suas fronteiras e já não carregam consigo a pecha de russos: sua obra é um tributo à Arte universal. Nas artes plásticas temos toda uma vanguarda russa, dentre eles Chagall que criou uma obra onírica e desbravadora e já não cabe em meras fronteiras geográficas. A Tabela Periódica, desenvolvida pelo russo Mendeleev mudou, completamente, os rumos da Química mundial e passou a fazer parte, imediatamente, do acervo de conquistas da Ciência. E são incontáveis cientistas daquelas terras que enriqueceram a história da humanidade: Pavlov na Psicologia; Zworykin, criador da televisão moderna; Prokhorov, inventor do Raio Laser; Shakarov, que desenvolveu a Bomba H; Tupolev que desenvolveu o primeiro avião supersônico; só para lembrar alguns. Todas essas importantes descobertas passaram a fazer parte, imediatamente, do acervo tecnológico da humanidade. A rigor, se na mente tacanha de alguns governantes mundiais, o preconceito e o racismo vivem uma nova onda, a Arte e a Ciência sempre entenderam que as conquistas são coletivas e servem para beneficiar pessoas e países independentemente de suas cores políticas, sociais, econômicas.
Nestes dias , o governo brasileiro estabeleceu uma polêmica das tantas em que se tem metido na atual gestão. Pôs-se contrário à compra da Vacina contra a Covid-19, chamada de Coronavac que vem sendo desenvolvida pelo Instituto Butantã em parceria com laboratórios chineses. Segundo o nosso mandatário maior, a Vacina seria comunista. Para complicar tudo, em Santa Catarina vem sendo desenvolvida uma outra de um laboratório russo e que, certamente, deve ser alijada já que corre o risco de inocular o perigoso germe do comunismo em brasileiros desatentos. Essa loucura acontece quando a Europa convive já com uma segunda onda e o Brasil, que foi um dos piores exemplos mundiais no combate à pandemia, já conta com mais de um milhão de infectados e quase 160.000 mortes. Não bastasse isso, embora o próprio governo tenha assinado anteriormente, uma lei que torna a vacinação obrigatória, o presidente, desdizendo como sempre o que tinha dito, informou em alto e bom tom que só vai se vacinar quem quiser.
O governo governa para seus terraplanistas . Em verdade, ninguém pode ser obrigado a tomar a vacina se não quiser. É preciso, no entanto, lembrar que essa decisão não é apenas pessoal, ela vai impactar a vida de muitas outras pessoas que podem ser contaminadas por conta do seu gesto. É justo, pois, que paguem civil e penalmente por sua decisão. O presidente, pessoalmente, pode pensar e agir como melhor lhe aprouver. A posição, no entanto, do chefe da nação, é importantíssima como exemplo e ele tem que entender que quando se posiciona o faz sempre como chefe do executivo. E o que o governo tem feito, sem usar máscara, sem manter distanciamento, prescrevendo cloroquina, se pondo contra a vacinação e negando a compra de uma medicação salvadora por simples infuca política, a meu ver, é uma questão que, em um país minimamente sério, levaria os loucos à camisa de força. A China é o maior parceiro comercial do Brasil, vamos deixar de comprar tudo que de lá importamos, pela simples razão de ser um país comunista? Há poucos beijávamos seu pés em busca de respiradores. E se eles entenderem que não mais interessa comprar ao Brasil por ser capitalista? Tá valendo?
Temos um canastrão na mesa do poker, sem fichas na mesa e imaginando que ganhará todas as partidas no blefe. Não faltam perus a lhe incentivar, também descapitalizados e certos que no grito vencerão o Royal Straight Flush dos adversários. O diabo é que com fichas alheias, a conta virá para todos nós. É só esperar!
Por J. Flávio Vieira, médico e escritor
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