É triste ver, como os países ricos continuam a explorar a África pensando somente em seus próprios interesses… mesmo que isso custe à pobreza e a miséria de um continente todo.
“África, o berço da humanidade”, quem nunca ouviu essa famosa frase? Uma pessoa que não estivesse consciente dos atuais conflitos mundiais ao tal berço deduziria que África seria atualmente um continente de cultura rica, respeitado, desenvolvido, um modelo para os outros continentes do mundo moderno, porém, grande parte dessas predições não ocorre nem nunca ocorreu.
O continente africano desenvolveu-se de maneira muito peculiar, se comparado às outras civilizações, dividido em diversas tribos e etnias, com costumes e culturas muito diferentes das dos outros países, que de um modo ou de outro, acabaram assimilando-se á civilização e cultura ocidental. As principais potências ocidentais, principalmente europeias mantinham relações comerciais com a África de longa data. Até que num ímpeto imperialista e etnocentrista decidiram fazer sua partilha, de modo que lhes fosse conveniente.
A partilha da África não apenas gerou novos conflitos, como também agravou muitos outros pré-existentes, devido ao fato das tribos africanas já sofrerem conflitos e guerras, de modo a partilha que visava divisões geográficas políticas e econômicas, prejudicou os povos e culturas locais, unindo em um único país diversos povos inimigos.
África também tem outras dependências e outros enganos. Por exemplo, é visitada anualmente por mais de 30 milhões de ricos ocidentais. Dir-se-ia que isso é bom para a economia africana. O turismo, dizem ao povo, abrirá as portas ao desenvolvimento… Mas o dinheiro que o turismo deixa na África nem sequer chega para pagar as taxas e os juros da dívida externa. Nem fica na África, para ser reinvestido no desenvolvimento econômico e social. Os hotéis, as agências de viagens, os banco, o grande comércio, os serviços, estão na África, mas não são africanos.
Os lucros são reexportados para os países de origem dos turistas. E no mágico enquadramento da Natureza, a miséria africana continua a crescer. África é um gigante algemado. Na verdade, de pouco serve ao povo africano a riqueza de recursos naturais que o continente encerra: os minérios e os metais, as madeiras raras, os diamantes, a caça, a pesca, o petróleo, o gado, o ouro, a prata, os fosfatos, o lítio, a floresta – tudo África possui em quantidades maciças. No entanto, o povo é pobre. Angola, por exemplo, exportou em 2006 mais de 30.000 milhões de dólares de produtos petrolíferos, mas os rendimentos de 70% dos angolanos permanecem inferiores a dois dólares por dia. O problema central dos africanos continua, pois, é de natureza política. Grandes massas de dinheiro geram a corrupção. E o capitalismo africano comprou e pagou as elites dirigentes e os aparelhos do Estado. A corrupção é ilimitada e tudo se compra e se vende.
“As guerras, o preço das armas e o tráfico de pessoas e de favores, continuam a serem as principais grilhetas usadas pelo grande capital.” O exemplo africano: África é bom exemplo dos grandes contrastes. O Continente africano tem 30 milhões de quilômetros de superfície, 53 Estados independentes e 900 milhões de habitantes, ou seja, 14% da população mundial. 45% dos africanos têm menos de 15 anos de idade, mas só 3% atingirão os 60 anos de vida. África conta com índices de pobreza da ordem dos 60% da população total, 40% da qual é analfabeta. Em cada mil crianças, 175 morrem de fome ou por doença antes de atingirem um ano de idade. Calcula-se que 26 milhões de africanos estejam infectados com sida. A dívida externa dos Estados africanos ultrapassa os 218 milhões de dólares e continua a crescer. As guerras, a fome, as perseguições e o desespero, obrigaram populações inteiras a procurar refúgio, quer nas grandes cidades, quer no estrangeiro. Há 12 milhões de deslocados que vagueiam sem destino certo pelo Continente. 4,2 milhões destes marginalizados procuram fugir, mesmo que ao preço da própria vida, para países mais ricos. Outros milhões escapam à miséria dos campos para ingressarem na miséria urbana. Só numa capital africana, o Cairo, contam-se 15 milhões de refugiados. Mas a fuga à guerra, à fome ou à doença atinge todos os territórios da África Negra. É a mobilidade da miséria. Este é o pesado “negativo” de um realista retrato africano. Uma situação terrível, catastrófica, que os povos da África terão, à enfrentar sozinhos. Um estado de coisas que vem do passado colonial e resulta da fatura do jugo europeu de cinco séculos, saldado pela venda de 15 milhões de escravos e pelo feroz assalto aos bens africanos. É bom que isto se recorde.
No presente, como no passado, a exploração, na África revela-se crescente, constante e metódica. E é pura utopia pensar-se que, um dia, os exploradores descobrirão que têm consciência e se arrependerão dos seus crimes. A metanoia é um jogo de palavras. Por isso, de momento, os africanos quase que estarão sozinhos. Estão cercados. Aqueles que se dizem seus amigos foram e continuarão a ser imperialistas. Para eles apenas conta o arredondar dos lucros. O combate pela verdadeira independência africana tem de continuar. Numa linha de luta de classes, a única que é verdadeiramente libertadora. Voltando então à celebre frase, é possível perceber que a África se encontra numa constante corrida, uma corrida comandada pela África do Sul para deixar seu berço e alcançar seus “filhos” que há muito lhe ultrapassaram.
Por Sandro Leonel. Professor formado em Geografia na Universidade Regional do Cariri (URCA)
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri