Os movimentos de resistência e revolta populares em evidência nas narrativas atuais de vários países é uma “Crônica de uma morte anunciada”. Como no romance do genial Gabriel Garcia Marques, em que todos sabem que Santiago Nasar vai morrer, também são evidentes os sinais do colapso social das políticas neoliberais, bem como seus consequentes efeitos colaterais de conflitos e violências mutuas entre as populações e seus representantes públicos. Vale ressaltar que entre o ativismo das manifestações públicas e a guerrilha não existe uma ponte longe demais, é tudo muito urgente, é tudo muito necessário.
Chomsky esteve em São Paulo recentemente. A lucidez esteve em São Paulo recentemente. A certeza absoluta de que o crescimento da extrema-direita está diretamente ligado ao neoliberalismo e ao seu capitalismo corporativo, esteve em São Paulo recentemente, da mesma forma que está recentemente evidente a chama da resistência no coquetel molotov que explode em meio às forças repressoras que tentam impedir o barulho saudável da voz do povo. O povo está na rua, protestando com força e coragem, no Chile, no Equador, no Líbano, em Hong Gong, na Espanha, na França, e deveria estar nas ruas do Brasil, recentemente.
O aumento de tarifas, a cobrança de novos impostos, o aniquilamento da seguridade social, a adoção de medidas opressivas, a censura, a corrupção política e social, o discurso do ódio contra minorias, a falência ambiental, bem como o maior abismo de desigualdade da história da humanidade entre pobres e ricos, são pontos em comum, são peças de um quebra-cabeça que se encaixam e revelam o teor das revoltas populares. Esse é o ponto de ruptura do paradigma em que políticos roubam o que é do povo, assumem uma postura totalitária de controle social, e permitem plenamente que os grandes conglomerados financeiros retorçam o povo, como uma rodilha encardida, em busca de lucros estratosféricos anuais.
O Chile ainda é visto como uma referência de um “paraíso” econômico e social, pela mais que equivocada, pela mais que bisonha interpretação política do governo brasileiro. Bolsonaro não se cansa de elogiar o assassino Pinochet, e como ele fora eficiente no extermínio dos vermelhos. Com a privatização da Previdência Social e a redução de valores de pensões e aposentadorias, quem trabalhou a vida inteira é espremido sem piedade até o último suspiro. Isso tem provocado uma onda crescente de suicídios de idosos no país, O Ministério da Saúde, em parceria com o Instituto Nacional de Estatísticas (INE), publicou estudo mostrando que entre 2010 e 2015, 936 adultos maiores de 70 anos tiraram sua própria vida. Entre maiores de 80 anos, em média, 17,7 a cada 100 mil habitantes recorreram ao suicídio. O Fundo Monetário Internacional elogiou a privatização pela meta suprema de canalhice ter sido batida.
No debate, em São Paulo, “O progressismo e o neoliberalismo em um mundo em desenvolvimento”, Chomsky explicou como o neoliberalismo surgiu na década de 70 do Século XX: quando as mentes pensantes do capitalismo central se sentiram ameaçadas pelo crescimento de grupos organizados de minorias, mulheres, negros e LGBT, que buscam reivindicar seus direitos. Ainda evidenciou a necessidade de medidas educacionais, para tornar o ator social mais imbecil, mais dócil e mais obediente, uma verdadeira legião de técnicos. Para justificar o abandono da população pobre, ele citou o exemplo da Amazon a segunda empresa de US$ 1 trilhão de dólares dos EUA, que consome 2% da energia elétrica do país, tem muitos subsídios, enquanto se cortam benefícios sociais.
Enquanto isso, mesmo com o Chile e Equador queimando nas ruas, o modelo neoliberal e o totalitarismo fascista seguem sua saga de extermínio do povo, os legítimos donos desse país: a reforma da previdência, o mesmo modelo do Chile, foi aprovada em segundo turno; a inoperância do governo em desastres ambientais coincide com o apoio total ao agronegócio e à exploração das nossas reservas, inclusive as indígenas, só para citar algumas traições ao povo brasileiro. Entre tantos outros absurdos administrativos está a aprovação do fundo de campanha eleitoral que prevê um orçamento de R$ 2,5 bi para fundo eleitoral em 2020. Para eleger vagabundos como o presidente, assim chamado por um aliado.
Por Marcos Leonel – Escritor e cidadão do mundo
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