Imagine tomar um galão de cinco litros de veneno a cada ano. É o que os brasileiros consomem de agrotóxico anualmente, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA). “Os dados sobre o consumo dessas substâncias no Brasil são alarmantes”, afirma em artigo cientifico de Karen Friedrich, da ABRASCO e da FIOCRUZ. A certa de um mês atrás nos deparamos com mais um sintoma da gravidade do uso indiscriminado do uso de agrotóxicos, na região do médio São Francisco foi detectada uma mortandade alarmante de abelhas o que vai com certeza prejudicar a polinização.
As publicações produzidas no período de 2011 a 2017 sobre o impacto dos agrotóxicos no meio ambiente, evidenciam o prejuízo causado sobre os insetos, a água, o solo e os peixes pelo uso dessas substâncias, muitas vezes, por alterarem seu habitat natural. Um estudo identificou a presença de Dicloro-Difenil-Tricloroetano (DDT) em solo, e outros abordaram que a rápida dissipação dos agrotóxicos nos solos e nas águas e o seu poder de escoamento também devem ser levados em consideração para a discussão do impacto desses venenos sobre o meio ambiente, podendo contaminar águas de rios e mares. Outras substâncias, como o benalaxil, podem se dissipar com a ajuda da degradação da própria microbiota aquática. O número e o tamanho de estômatos em plantas podem ser influenciados pela presença de agrotóxicos na área de plantio. Agrotóxicos podem contaminar reservatórios de água, rios, recursos hídricos e bacias fluviais, podendo interferir nos organismos vivos aquáticos. Algumas substâncias já proibidas há décadas no País, como é o caso do Hexaclorociclohexano (HCH), ainda estão sendo detectadas em amostras de águas, poços e mananciais. Lagos urbanos, como um localizado na cidade de Cascavel, no Paraná, com intensa atividade agrícola, apresentaram contaminação recente por organofosforados. Situação semelhante foi encontrada em Fortaleza, onde foram detectadas as substâncias cipermetrina e malationa em dois rios da região metropolitana. Até mesmo na água da chuva, em regiões de produção de soja, foi detectada a presença de diferentes agrotóxicos. Os cientistas, em sua revisão de literatura, identificaram que os herbicidas foram os agrotóxicos mais encontrados em águas doces brasileiras.
Além dos impactos já demonstrados no meio ambiente, são diversos os casos de intoxicações e outros agravos à saúde humana demonstrados em estudos científicos. Um estudo realizado pela cientistas independentes com compromisso social, constatou que, no período de 1999 a 2009, foram registrados quase 10 mil casos de intoxicação por agrotóxicos no Nordeste do Brasil, e que o estado de Pernambuco foi o mais acometido. Nesse estado, entre os anos de 2007 a 2010, foram identificados 549 casos de intoxicações. São 2.052 óbitos por intoxicação por agrotóxicos no período de 2000 a 2009, e, somente no ano de 2005, foram mais de 1.200 casos de intoxicações no Nordeste brasileiro. Sabe-se, também, que a exposição aos agrotóxicos pode causar alterações celulares e, consequentemente, pode estar associada a alguns tipos de câncer, como neoplasia no cérebro, melanoma cutâneo, câncer no sistema digestivo, sistemas genitais masculino e feminino, sistema urinário, sistema respiratório, câncer de mama e câncer de esôfago. Cientistas estudaram a relação entre a exposição aos agrotóxicos e a mortalidade por Linfoma Não-Hodgkin (NHL) e encontraram relações positivas entre a mortalidade por NHL de agricultores quando comparados ao grupo não exposto.
Em 2010, o mercado brasileiro de agrotóxicos movimentou U$ 7,3 bilhões de dólares e representou 19% do mercado global. Soja, milho, algodão e cana-de-açúcar representam 80% do total de vendas nesse setor. Segundo a Associação Brasileira de saúde Coletiva (ABRASCO), essa seria a lista da agricultura que mais consome agrotóxicos: Soja 40%, Milho 15%, cana-de-açúcar 10%, Cítricos 7%, Café, Trigo e Arroz 3% cada cultura, Feijão 2%, Batata 1%, Tomate 1%, Maçã 0,5% e Banana 0,2%. As demais culturas 3,3% do total de 852,8 milhões de litros de agrotóxicos pulverizados nas lavouras brasileiras em 2011. Vale salientar que esses números são passados. Hoje estamos com uma lista bem maior de venenos liberados e que vai promover danos bem maiores a sociedade.
A literatura traz importantes contribuições da produção científica sobre os impactos deletérios do uso de agrotóxicos sobre o ambiente e a saúde humana e acerca do precário monitoramento da exposição aos agrotóxicos, visando ao cuidado com a saúde. Vivemos tempos obscuros, pois grupos sociais cegos, movidos pelo ódio ou com atitudes espúrias não se importam com essa grande tragédia anunciada. Onde vamos parar com tanta estupidez e ignorância promovidas por essa condição material de acúmulo degradante ao ser?
Por Sandro Leonel. Um kaririense inquieto
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri