Na tela, a adolescência pulsa com a força de um coração acelerado. A nova série da Netflix, intitulada com simplicidade e coragem de “Adolescência”, mergulha o espectador em um território ao mesmo tempo familiar e desconhecido: aquele momento da vida em que tudo é urgente, absoluto e muitas vezes, incompreensível. Em vez de oferecer respostas, a série lança perguntas — incômodas, necessárias — como um espelho que insiste em não poupar ninguém.
Jamie, o protagonista, é um garoto de 13 anos envolvido em um crime que muda a trajetória de sua família. Mas mais do que uma trama policial, o que se desenha é um retrato doloroso do que pode acontecer quando o silêncio entre pais e filhos se prolonga por tempo demais. O realismo da série é tão inquietante que, por vezes, esquecemos que se trata de ficção. O olhar da câmera não desvia nem quando seria mais confortável fazê-lo.
Em cada episódio, somos convidados a caminhar pelos corredores da escola, das redes sociais e do próprio quarto de um adolescente. Ali, escondem-se os abismos que os adultos nem sempre percebem. O excesso de estímulos, a solidão camuflada, a carência de escuta — tudo isso fermenta no cotidiano dos jovens com uma força invisível, mas devastadora.
A série não demoniza a tecnologia, mas alerta sobre como ela pode servir de palco para radicalizações, pressões estéticas, isolamento e violência emocional. O que parece apenas um vídeo visto em segundos pode ser, para um adolescente vulnerável, o gatilho de uma transformação silenciosa. E muitas vezes, quando os pais percebem, já é tarde para desfazer o que foi construído no escuro.
É por isso que “Adolescência” deveria ser assistida em família. Não como um manual, mas como um ponto de partida. Em vez de julgar Jamie, talvez valha mais perguntar: “E se fosse meu filho? Eu saberia?”. A resposta pode ser desconfortável, mas é melhor que o silêncio. Afinal, nenhum algoritmo substitui a presença — aquele tipo de presença que escuta sem interromper, observa sem invadir, e acolhe mesmo quando não entende.
A adolescência sempre foi um território misterioso. A diferença é que hoje, esse território está mais exposto, mais acelerado e mais frágil. O que antes se resolvia em páginas de diários trancados agora explode em redes abertas, onde todos opinam, julgam e esquecem no dia seguinte. Só quem não pode esquecer é quem ama de verdade.
No fim, a série é um pedido — talvez um grito — para que os pais deixem de lado a ideia de que “isso é coisa de adolescente” e passem a olhar com mais atenção. Porque a adolescência, ao contrário do que dizem, não é uma fase. É um território. E todo território exige mapa, bússola e cuidado.
Por Mirta Lourenço. Médica, professora, cronista e poetisa
*Este artigo é de inteira responsabilidade da autora, e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri