Uma das maiores preocupações de pais, estudantes, professores e demais atores da comunidade escolar, atualmente, é sobre o retorno às salas de aulas. As atividades presenciais em escolas, cursos, faculdades e universidades públicas e privadas estão suspensas no Ceará desde março, e já tiveram possíveis datas de retorno adiadas pelo poder público. Hoje, instituições privadas defendem uma volta gradual por meio do “ensino híbrido”, em que pais podem optar por deixar os filhos em casa ou voltar às escolas.
O Sindicato de Educação da Livre Iniciativa do Ceará (Sinepe) argumenta que esse retorno ao âmbito presencial ocorra no dia 20 deste mês, data que segue sem confirmação e é desaprovada por parte dos pais e profissionais. Um protocolo com medidas de segurança sanitária para as escolas foi enviado pelo Sinepe ao Governo do Estado. A reportagem contatou a Secretaria da Saúde (Sesa) para saber quais as recomendações para a volta às aulas e se as escolas devem ser mantidas na Fase 4 de retomada das atividades – nenhum retorno foi enviado até o fechamento desta edição.
“As propostas têm duas bases: o cuidado com a higienização pessoal e dos espaços; e o distanciamento físico”, pontua Andréa Nogueira, presidente do Sinepe. “As escolas da rede privada estão preparadas para a retomada das aulas presenciais no dia 20, mas estão enviando questionários para saber a opinião dos pais”, revela.
Além do protocolo sanitário, um plano de retomada foi elaborado pelas instituições. Uma das principais ideias é a do retorno escalonado das turmas ao ambiente físico. “Sugerimos às escolas que retornem com o ensino híbrido, ou seja, deem opção aos pais de escolherem se o filho vai voltar às aulas presenciais ou continuar com as remotas”, afirma Andréa, analisando que “muitos pais precisam voltar ao trabalho e não têm onde deixar os filhos”.
A engenheira civil Clarissa Maciel, 30, se enquadra nesse perfil. Desde que teve de voltar ao trabalho presencial, ela precisa deixar a filha de 6 anos sob os cuidados da madrinha, já que a escola privada onde a menina estuda em tempo integral permanece fechada. Mesmo com dificuldades para dar suporte à pequena nas aulas remotas, a mãe discorda do retorno.
“A escola dela disse que vai voltar no dia 3 de agosto. A diretora me explicou todas as medidas de higiene e cuidados, mas não me sinto segura. Minha filha iria só por dois dias na semana, porque os alunos vão revezar, mas a relação risco-benefício pra mim não está fechando. As crianças vão passar o dia juntas, e não sei como os outros pais estão respeitando as medidas de isolamento”, destaca Clarissa.
Dilema
Para ela, o revezamento entre idas à escola e aulas online torna ineficaz não apenas a prevenção da Covid-19, mas a recuperação do aprendizado. “Com essa ida em apenas dois dias, seriam duas rotinas diferentes pra gente administrar. Não tem garantia de que isso melhore a produtividade das crianças, o aprendizado, porque de qualquer forma passariam um período em casa. Atividades remotas são mais difíceis, complicadas, mas acho que vale o sacrifício, nesse momento”, finaliza.
A opinião é compartilhada por Ranyelle Pereira, 24, que optou por sair do emprego para cuidar do filho, diante da falta escolar. “As aulas online, pra gente, não deram muito certo. Uma criança de 3 anos não vai ficar entretida na frente de um celular, computador, por muito tempo. Na escola dele, a previsão é voltar em agosto, mas não sei se eu vou mandá-lo. Quando tudo isso passar, vou pensar. Até então, tô em casa com ele”, sentencia.
Jakeline Alencar, doutora em Educação e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), reconhece que as famílias vivem, hoje, um dilema: cumprir a obrigatoriedade legal de manter filhos de 4 a 17 anos matriculados na escola ou garantir a segurança deles. Outro ponto é que, segundo a pesquisadora, “muitos pais têm questionado a qualidade e a eficácia das atividades do ensino remoto”, o que requer mais cautela das instituições públicas e privadas no retorno.
“As crianças estarem na escola simboliza, pra toda a sociedade, um aspecto de normalidade. Talvez por isso a insistência de não parar as atividades. Mas para retomarmos o ensino, seja híbrido ou presencial, precisamos considerar o que esperávamos que as crianças aprendessem, repensar as avaliações”, analisa a professora, ponderando, ainda, que a “perda do vínculo das crianças com a comunidade escolar” gera déficits “não só cognitivos, mas afetivos”.
O promotor de Justiça e coordenador do Núcleo de Defesa da Educação do Ministério Público do Estado (MPCE), Elnatan de Oliveira, garante que o órgão vai fiscalizar as escolas públicas e privadas, quando houver retorno, a fim de verificar se as medidas sanitárias estão sendo adequadamente aplicadas. “A perspectiva é que as aulas retornem em algumas escolas privadas e na rede pública no dia 27 deste mês. Mas como houve aumento de casos no interior, estamos reticentes. Vamos acompanhar”, afirma.
Públicas
Na rede pública, o impasse também persiste. Em decreto publicado no dia 14 de junho, a Prefeitura de Fortaleza manteve a suspensão das aulas presenciais em estabelecimentos
De ensino da rede pública municipal até 31 de julho de 2020; e na rede privada, até 19 do mesmo mês. Nenhuma das datas foi confirmada pelo poder público, até agora.
Nas escolas estaduais, de acordo com a Secretaria da Educação (Seduc), “o processo de retomada das aulas presenciais está sendo elaborado” de modo a analisar “todas as possibilidades que se mostrarem viáveis para evitar prejuízos ao processo de aprendizagem dos estudantes”. A Pasta garante que “antes de ser colocado em prática, o Plano de Retomada das Atividades Presenciais será submetido à avaliação da comunidade escolar” e seguirá orientações da Secretaria da Saúde (Sesa).
Em reunião do Comitê Consultivo Estadual no último dia 24 de junho, a Seduc apresentou proposta de retomada das atividades presenciais da rede pública com previsão para agosto.
Fonte: Diário do Nordeste