O ex-capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, morto na Bahia em 9 de fevereiro, já acumulava 29 dias de detenções administrativas pela Polícia Militar em junho de 2005, quando foi homenageado na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) pelo senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) a pedido de seu pai, o presidente Jair Bolsonaro.
A ficha disciplinar do capitão, acusado de integrar uma milícia, contrasta com a declaração do presidente no sábado (15) de que, quando recebeu a Medalha Tiradentes, maior honraria da Assembleia, o ex-PM era “um herói da Polícia Militar”.
O ex-PM, expulso da corporação em 2014 por envolvimento com o jogo do bicho, já havia sofrido três punições administrativas – duas consideradas leves e uma média – quando recebeu a medalha. Nenhuma delas se refere à acusação de homicídio que respondia na Justiça quando foi condecorado por Flávio.
Quando o então deputado estadual propôs a homenagem, Adriano estava preso sob suspeita de matar o guardador de carros Leandro dos Santos Silva, 24, assassinado em novembro de 2003.
O então policial chegou a ser condenado no Tribunal do Júri em outubro de 2005, mas conseguiu recurso para ter um novo julgamento, foi solto em 2006 e absolvido no ano seguinte.
Bolsonaro costuma dizer que Leandro tinha envolvimento com o tráfico, que morrera em confronto com os policiais e minimiza o caso. O jovem, porém, foi morto após denunciar policiais por extorsão.
“Não tem nenhuma sentença transitada em julgado condenando capitão Adriano por nada, sem querer defendê-lo. Naquele ano ele era um herói da Polícia Militar”, afirmou ele no sábado (15).
Histórico de infrações
A detenção é a terceira punição de uma escala de cinco do regimento da PM. Ela prevê o cerceamento da liberdade do punido, que deve permanecer no local que lhe for determinado, normalmente o quartel, sem ficar, no entanto, confinado.
A mais grave punição administrativa lhe rendeu, em dezembro de 2004, 20 dias de detenção. Segundo a ficha disciplinar, Adriano prestou declarações conflitantes num auto de prisão em flagrante e em juízo. De acordo com PM, o fato levou à absolvição dos réus.
Ele também foi punido com cinco dias de detenção por ter se envolvido numa discussão com guardas municipais em Rio das Ostras, em 2003. Sofreu ainda sanção por quatro dias por fazer segurança particular num evento na Fundição Progresso em dezembro de 2000.
O então capitão já não integrava mais o Bope (Batalhão de Operações Especiais) quando recebeu a medalha. A saída da unidade se deu em razão de suspeitas do comando sobre sua conduta em operações, segundo relatos. Ele integrava o GAT (Grupo de Ação Tática) do 16º Batalhão da Polícia Militar desde 2003.
A PM também já tinha conhecimento, em junho de 2005, de suspeitas sobre a atuação de Adriano na favela Parada de Lucas. A Corregedoria da corporação investigava um grupo de PMs por tortura e extorsão de pessoas da favela em locais próximos ao Mercado São Sebastião, na Penha, zona norte do Rio de Janeiro.
A apuração da Corregedoria identificou três supostas vítimas de Adriano e outros PMs, sendo uma delas Leandro. O guardador de carros foi assassinado depois que denunciou a extorsão dos policiais.
O inquérito policial militar foi arquivado após o ex-capitão e seus colegas serem absolvidos na Justiça pela morte de Leandro. Eles nunca foram julgados pelos outros dois casos de extorsão e tortura investigados pela Corregedoria da PM.
Após a homenagem, o PM sofreu outras duas prisões preventivas em outros casos de homicídio e acabou absolvido. Foi expulso da corporação em 2014 sob suspeita de atuar como segurança de um bicheiro.
Investigações apontam que Adriano atuava em diferentes atividades ilegais: milícia, jogo do bicho, máquinas caça-níqueis e homicídios profissionais.
O ex-policial foi citado na investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro que apura se houve “rachadinha” no gabinete de Flávio quando ele era deputado estadual. Segundo o MP-RJ, contas de Adriano foram usadas para transferir dinheiro a Fabrício Queiroz, então assessor de Flávio e suspeito de comandar o esquema de devolução de salários.
Queiroz e Adriano trabalharam juntos no 18º Batalhão da PM. Foi por meio de Queiroz que familiares do ex-PM foram contratadas como assessoras no gabinete de Flávio: sua ex-mulher, Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega, de 2007 até novembro de 2018, e sua mãe, Raimunda Veras Magalhães, de abril de 2016 a novembro de 2018.
Após mais de um ano foragido, o ex-PM foi morto numa operação policial comandada pela Secretaria de Segurança da Bahia. A polícia investiga as circunstâncias da morte. Seu advogado, Paulo Emilio Catta Preta, afirma que ele temia ser alvo de uma “queima de arquivo”.
Fonte: Folhapress