Se não tratada, a Leishmaniose Visceral (LV), conhecida popularmente como calazar, pode levar ao óbito em 90% dos casos, segundo o Ministério da Saúde. No Ceará, a doença teve redução de 23,75% no número de registros de 2018 (383, com 25 mortes) para 2019 (292, com 19 mortes), conforme dados da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa). Apesar disso, o Estado apresentou avanço geográfico da zoonose no mesmo período. Dos 80 municípios que não haviam registrado pelo menos um caso de LV em 2018, 34 voltaram a notificar a doença em 2019.
Segundo a Sesa, a LV tem maior incidência nas regiões sul e noroeste. Por conta da alta mortalidade, responsável por mais de 210 óbitos nos últimos cinco anos no Ceará, o órgão definiu um novo parâmetro de risco nos municípios com base no triênio 2016-2018. Neste cenário, 29 municípios são considerados prioritários e 114 apresentam situação com baixa transmissão. Destacam-se Fortaleza, com “transmissão muito intensa”; e Barbalha, Caucaia, Itapipoca e Juazeiro do Norte (“transmissão alta”). Outras 24 cidades possuem “transmissão média”.
Dos 41 municípios “sem transmissão”, (nenhuma notificação entre 2016 e 2018), nove voltaram a ter, pelo menos, 1 caso em 2019. Para reduzir o quadro, em outubro do ano passado, a Sesa lançou o Plano de Ação para Intensificação da Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral no Ceará. O instrumento objetiva “fortalecer a vigilância e o controle das leishmanioses nos municípios e reduzir a morbimortalidade no Estado até 2022”. O órgão pretende fortalecer o “diagnóstico, tratamento, reabilitação e prevenção”.
Redução de mortes
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a LV é uma das cinco doenças negligenciadas prioritárias à eliminação, e sua presença está relacionada a fatores sociais e ambientais, o que pode influenciar de forma direta na epidemiologia da doença. Neste sentido, o Estado desenvolve ações de redução e, desde 2017, vem diminuindo o número de mortes. Em 2016, foram contabilizados 25 óbitos. Já no ano seguinte, houve redução (38 mortes). Número que permanece em queda: 25, em 2018; e 19 no ano passado.
“A redução deve-se às ações de vigilância e controle realizadas em parceria com as Coordenadorias Regionais de Saúde (Cres)”, informou a Sesa, em nota. A Pasta destaca, também, o “apoio técnico aos municípios para o monitoramento da proporção de casos humanos confirmados” e a “distribuição e controle dos medicamentos específicos, como Glucantime e Anfotericina B Lipossomal; além da distribuição e controle dos Testes Rápidos Imunocromatográficos”, reforça a Sesa.
Também foram feitas ações permanentes de educação em saúde e planejamento de controle da doença. Neste cenário, no ano passado foram elaborados os Planos Municipais de Ação nos cinco municípios prioritários de transmissão muito intensa e alta.
Ipaporanga
Em 2019, Ipaporanga, na região noroeste do Estado, foi a cidade do interior cearense com maior número de registros. Foram notificados 24 casos de LV, sem nenhum óbito. Mesmo com pouco mais de 11,5 mil habitantes (IBGE), a cidade ficou atrás, apenas, de Fortaleza (2,6 milhões de habitantes), que somou 46 casos, também sem óbitos. Segundo o secretário de Saúde de Ipaporanga, Rodrigo Batista, todos os casos ocorreram na mesma localidade (Buriti dos Brasis), na região serrana, o que facilitou o bloqueio da transmissão da doença.
“A Secretaria tomou conhecimento do primeiro caso confirmado em setembro de 2019. Foi realizado um levantamento da área onde residia a pessoa e ficou diagnosticado que o mesmo tinha chegado recentemente de uma viagem ao norte do País, onde possivelmente contraiu a doença e depois transmitiu ao vetor (mosquito-palha)”, informou o secretário. Ele ressalta que, para o bloqueio da transmissão, foram realizados testes rápidos em toda a população canina da localidade. “Além dos exames para descarte ou confirmação das suspeitas, assim como todo o tratamento dos casos confirmados”, garante. “Ainda estamos realizando o monitoramento para evitar o surgimento de novos casos”, acrescenta.
Transmissão
Para o médico e infectologista da Universidade Federal do Ceará (UFC), Anastácio Queiroz, é possível que o homem transmita a doença ao mosquito (vetor) e este infecte outras pessoas. “Leva mais tempo, mas é possível. É interessante ter um estudo para avaliar as causas dessa incidência grande nessa localidade (em Ipaporanga), que é pequena”, avalia o especialista, ressaltando que, provavelmente, “essa pessoa passou muito tempo sem receber o tratamento”.
O infectologista explica, ainda, que apenas 15% dos infectados pelo mosquito desenvolvem a doença. “A maioria das pessoas não adoece. Geralmente, elas têm um parasitismo baixo. De qualquer forma, de 100 pessoas, 85 não infectadas podem, no futuro, desenvolver algum problema”, explica. A Secretaria Municipal de Ipaporanga afirma que irá continuar com as intervenções na comunidade serrana atingida, e que vai também realizar testes para a LV em humanos e animais em outras localidades do Município.
Fonte: Diário do Nordeste