Uma portaria da Polícia Civil do Ceará e um boletim interno da Polícia Militar do estado trouxeram determinações e recomendações, respectivamente, de como devem passar a agir os policiais civis e militares no Ceará.
A Polícia Militar afirmou que divulgou o boletim para se adequar à Lei de Abuso de Autoridade, sancionada em setembro de 2019 pelo presidente Jair Bolsonaro. A lei entrou em vigor no dia 3 de janeiro deste ano e prevê multa, perda do cargo público ou até quatro anos de prisão para quem for enquadrado no crime de abuso de autoridade. Já a Polícia Civil afirma que o documento estava sendo trabalhado há 6 meses e que não tem relação com a Lei de Abuso de Autoridade.
Publicada no dia 17 de janeiro no Diário Oficial do Estado do Ceará, a portaria da Polícia Civil determina que os policiais fiquem limitados a falar com a imprensa, dependendo da autorização do delegado-geral e com consentimento do setor da assessoria de comunicação.
Além disso, fica proibida a concessão de entrevistas por presos e os próprios policiais já não podem divulgar situações “que possam sugerir supostas dificuldades, limitações ou deficiências de recursos humanos, técnicos, financeiros e materiais, necessários à execução das operações policiais ou ao desempenho das atividades”. Aqueles que desrespeitarem os artigos podem ser passíveis de Apuração de Transgressões Disciplinares ou à Controladoria Geral de Disciplina.
Para o sociólogo e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC), Luiz Fábio Paiva, “a portaria cria um dispositivo de controle social de servidores públicos, vetando, inclusive, a participação deles em seminários sem autorização prévia do comando. Isso é uma forma de o poder político, o poder de um governo, exercer seu mando, autorizando ou não de acordo com sua visão política e ideológica”.
Recomendações
Nessa quinta-feira (23) foi a vez dos policiais militares do Ceará receberem direcionamentos. Foi publicado no boletim do Comando Geral orientações sobre a lei que trata do Abuso da Autoridade, sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no início deste mês de janeiro. Um dos procedimentos a ser adotado é que o militar se abstenha de exibir o detido à imprensa ou a qualquer outro tipo de público: “Evitar que o preso/detento conceda entrevistas a quaisquer meios de comunicação, mesmo que voluntariamente”.
Ainda conforme a publicação da Polícia Militar do Ceará (PMCE), o militar está proibido de utilizar do cargo ou função que exerce para obter isenções ou descontos em estabelecimentos comerciais, mesmo que isto seja ofertado pelo comerciante e o servidor não esteja em serviço. Outro trecho aborda as regras com relação a condução de detentos, como: menores de 18 anos não podem ser conduzidos no compartimento fechado da viatura, presos de sexos distintos não podem ser confinados no mesmo ambiente, mesmo que temporariamente; e no caso da condução de LGBT, o militar deve respeitar a identidade social e o conduzir em espaço separado dos homens.
Lei de Abuso de Autoridade
A tenente-coronel PM Fátima de Paula, assessora de comunicação da PMCE, afirma que o posicionamento da corporação é seguir o que a Lei de Abuso de Autoridade diz na íntegra. Fátima pontua que o boletim foi publicado com intuito de orientar os PMs e destaca que, segundo a lei, não se deve filmar ou divulgar fotos de nenhum suspeito, enquanto esse suspeito estiver sob a guarda de policiais.
“A partir da terça-feira da semana que vem vamos dar início, gradativamente, a um treinamento presencial, com instruções para aplicar a lei, para nossos policiais terem conhecimento e saberem agir diante destas situações. O curso começará pela capital, Região Metropolitana e depois se estender ao interior. Buscamos orientar todo efetivo para que eles prestem serviço de excelência. Até o momento, desde que entrou em vigor, não houve nenhum descumprimento por parte dos policiais militares do Ceará”, afirmou a tenente-coronel.
A Polícia Civil do Ceará, no entanto, informou, por meio de nota, a edição da portaria não está relacionada à entrada em vigor da Lei de Abuso de Autoridade, e o documento vinha sendo trabalhado há mais de seis meses. De acordo com eles, a portaria objetiva “padronizar e uniformizar os procedimentos de comunicação social”.
Já o sociólogo Luiz Fábio Paiva pondera que “é impossível existir transparência quando as informações estão concentradas nas mãos de pessoas que atuam dentro da mesma corporação. Então, é preciso não apenas disseminar, mas criar instâncias de interlocução com a sociedade civil, expondo dificuldades e criando soluções”.
Fonte: G1 CE